Os principais candidatos na corrida presidencial, exceto Jair Bolsonaro, prometeram considerar a lista tríplice na escolha do próximo procurador-geral da República. Trata-se de uma vitória da corporação do Ministério Público (MP), que difundiu a ideia de que a indicação para o exercício do cargo seja feita por votação de seus membros. O procedimento não é previsto em lei. O presidente da República pode, assim, não considerar o primeiro da lista ou propor ao Senado um nome fora dela. Quando isso acontece, a decisão costuma ser recebida com indignação.
A lista tríplice dificilmente existe em países avançados, nos quais cabe ao chefe do governo o poder exclusivo de escolher nomes para cargos da cúpula do serviço público. No Reino Unido, a decisão se baseia em seleção realizada por consultorias da área de recursos humanos (head hunters). Para nomeações nos níveis hierarquicamente inferiores, recorre-se a uma comissão integrada por especialistas independentes. Aqui, a corporação do MP vem pouco a pouco transformando a lista tríplice em tradição.
Gente preparada apoia a ideia da lista. Aceita-se limitar o poder do presidente da República, talvez sob a convicção, nem sempre correta, de que é melhor assim do que submeter a decisão à influência do jogo do poder. Ao aceitar-se tal tradição, admite-se que ela adquiriu foros de lei.
“Anacrônica, essa não é a melhor forma de indicar candidatos para exercer cargos de confiança”
Outra corporação, a das universidades federais, foi mais eficiente nesse campo. Provavelmente influenciou a aprovação da lei 9 192, de 1995, pela qual o presidente da República escolherá como reitor e vice-reitor nomes de uma lista tríplice elaborada pelo “respectivo colegiado máximo”. A OAB saiu em defesa, perante o STF, de que o escolhido fosse o primeiro da lista, o que foi negado. Se a tese fizesse sentido, a lista tríplice seria desnecessária. Bastaria indicar um nome.
Nenhuma decisão administrativa é imune a erros. Há exemplos de escolhas polêmicas de procuradores-gerais da República tanto pela lista tríplice quanto pela nomeação de pessoa não eleita pela corporação. A rigor, a lista não é a melhor forma de indicar candidatos para exercer cargos de confiança, pois reforça o caráter corporativista presente na sociedade. É anacrônica e, as mais das vezes, compromete a meritocracia. A reforma administrativa, que pode vir a ser examinada pelo Congresso no próximo quadriênio, poderia servir para discutir a ideia. Seria a oportunidade para avaliar e adotar experiências bem-sucedidas e para estabelecer uma regra legal sobre a matéria.
Se a decisão vier a ser pela confirmação desse método, a tendência seria aplicá-lo em todos os órgãos e entidades do setor público. Dessa forma, o diretor-geral da Polícia Federal (PF) seria nomeado com base em lista tríplice eleita por delegados. Os presidentes do Banco Central e dos bancos estatais da União seriam escolhidos pelos funcionários das respectivas instituições financeiras, caso que seria bizarro e verdadeiramente inédito.
Publicado em VEJA de 28 de setembro de 2022, edição nº 2808