O período de Carnaval dificilmente deixará de trazer más lembranças às populações mais pobres do Litoral Norte de São Paulo. Durante as festas do ano passado, os temporais deixaram 64 pessoas mortas e milhares de vítimas sem-teto na região. Autoridades dos mais diferentes níveis, incluindo o presidente Lula, visitaram o local na época. Choveram promessas de auxílio, sendo a principal delas a da construção de moradias num prazo recorde de seis meses, obra sob responsabilidade do governo estadual. Passado quase um ano da tragédia, essas obras ainda não foram entregues.
Em julho, às vésperas do prazo para conclusão, o governo paulista revisou a previsão – na ocasião, o secretário estadual de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Marcelo Cardinale Branco, estimou que as entregas começariam em outubro do ano passado e seriam finalizadas em janeiro de 2024 – agora, no último mês para cumprimento da promessa, a projeção da secretaria é que todos os moradores devam chegar nos próximos dias. De acordo com o governo estadual, os prédios já estão concluídos há meses, mas o atraso na entrega ocorreu em razão de novas chuvas, que prejudicam a finalização dos trabalhos de pintura e paisagismo.
A demora também se deu na retirada da população das áreas de risco, já que alguns moradores se recusaram a deixar suas casas e o governo estadual teve que acionar a Justiça para removê-los do local em setembro. No mesmo mês, teve início a demolição dos imóveis condenados, que também teria sido adiada por entraves judiciais, já que os proprietários exigiram garantias de indenizações antes de perderem suas propriedades.
No total, 704 unidades habitacionais foram construídas pelo governo paulista para abrigar as famílias que tiveram de deixar suas casas em meio às inundações e deslizamentos de terra. Destas, 518 estão localizadas na Vila Sahy, área mais afetada pelas chuvas, e outras 186 ficam na região de Maresias, que fica nas proximidades. Atualmente, as vítimas estão alocadas em uma vila temporária no bairro Topolândia e no município próximo de Bertioga.
Tragédia anunciada
Em fevereiro de 2022, a pedido do Ministério Público de São Paulo, a Justiça havia determinado que a Prefeitura de São Sebastião regularizasse a situação fundiária da Vila Sahy, com realização de levantamento dos imóveis irregulares no bairro e implementação de obras para impedir desabamentos. Na época, o Executivo municipal alegou que não havia novas construções nas encostas e não realizou intervenções para mitigar os riscos.
No último mês de dezembro, o MP e a Defensoria Pública do estado acionaram novamente a Justiça para cobrar uma indenização de mais de 73 milhões de reais da prefeitura por omissão na prevenção das mortes e destruição. Segundo o documento, além de não realizar a regularização da Vila Sahy, a gestão do município falhou em alertar aos moradores da região sobre a previsão de fortes chuvas e risco de desabamento.