Uma das mais graves ameaças à sobrevivência humana, o fenômeno das mudanças climáticas produz efeitos que já são observáveis ao redor do mundo — ondas de calor extremo, secas severas, chuvas torrenciais fora de época e morte de animais em massa são apenas algumas das consequências catastróficas da grave crise ambiental que assola o planeta.
Neste ano, o Brasil foi palco de várias ocorrências graves relacionadas ao clima, como as enchentes no Sul e a estiagem na Amazônia, conforme mostrou reportagem de VEJA. À medida que o problema se agrava, o país caminha para encerrar o ano com uma preocupante lista de marcas históricas negativas — conheça algumas.
Baixa do Rio Negro. Em outubro, as águas do principal afluente do Rio Amazonas atingiram o nível de 12,7 metros, o volume mais baixo em 121 anos — foi a primeira vez que o indicador caiu abaixo de 13 metros. De acordo com o Porto de Manaus, que realiza medições diárias, o Rio Negro começou a apresentar baixa em 17 de junho na capital amazonense e caiu continuamente por 171 dias até se estabilizar em 27 de outubro.
Seca do Rio Solimões. Também em outubro, outro afluente do Amazonas e um dos maiores rios da região registrou a segunda maior vazante de sua história. A régua de medição do Serviço Geológico do Brasil (SGB) caiu à marca de -75 centímetros, ficando a apenas 11 centímetros da pior marca, em outubro de 2010, quando desceu a -86 centímetros de volume. A seca transformou a fértil região em um cenário desértico, prejudicando o bioma local e as populações que dependem do transporte fluvial diariamente.
Paralisação da Hidrelétrica Santo Antônio. Localizada em Porto Velho (RO), a quarta maior usina hidrelétrica do Brasil suspendeu suas atividades pela primeira vez desde o início da operação, em 2012, por falta de água no Rio Madeira. A paralisação ocorreu em 2 de outubro e durou quatorze dias até que a vazão voltasse a ser suficiente para funcionar — na data da interrupção, o nível do rio estava aproximadamente 50% abaixo da média histórica, segundo a concessionária responsável pela usina.
Seca recorde no Norte e Nordeste. A estiagem que atinge as regiões mais tropicais do Brasil vem se tornando mais severa e, em 2023, pelo menos oito estados já registram a pior seca desde 1980 — Amazonas, Acre, Pará, Amapá, Maranhão, Piauí, Bahia e Sergipe, segundo dados do Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), do governo federal. A situação é agravada pelo fenômeno cíclico El Niño, que pode prolongar o período de seca que acaba em novembro, normalmente, e manter as chuvas escassas nestas regiões até janeiro de 2024.
Chuvas recordes. Enquanto algumas regiões sofrem com falta de água, o litoral paulista foi atingido pelo maior volume de chuvas já registrado na história do país. No município de Bertioga, entre 18 e 19 de fevereiro, a quantidade de 683 milímetros de chuva representou o recorde de precipitação em 24 horas, de acordo com o Cemaden e o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Pelas medições anteriores, o volume mais intenso era de 534,4 milímetros registrados em março de 2022, em Petrópolis (RJ).
Ventos devastadores em São Paulo. Na última sexta-feira, 3, a capital paulista sofreu rajadas de vento de até 104 quilômetros por hora, algo que não acontecia desde 2018, segundo o Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas (CGE-SP), ligado à Prefeitura de São Paulo. A cidade ainda sofreu o outubro mais chuvoso em oitenta anos — foram 356 milímetros de água, 180% a mais do que a média climatológica, de acordo com o Inmet.
Alta vazão nas Cataratas do Iguaçu. As famosas quedas d’água na fronteira entre Brasil e Argentina registraram um volume assombroso de água na última segunda-feira, 30 — a vazão chegou a 24,2 milhões de litros d’água por segundo, maior medição desde 2014 e terceiro valor mais alto em quarenta anos. O estado do Paraná, onde fica o lado brasileiro das cataratas, sofre com temporais constantes há quase duas semanas e já contabiliza 110 mil pessoas afetadas por inundações e desabamentos.
Morte de animais. Em menos de uma semana, mais de 1.500 cabeças de gado morreram no Mato Grosso do Sul em razão do frio extremo. A chegada de uma frente fria em meados de junho derrubou temperaturas no Centro-Oeste do país, levando os termômetros de regiões historicamente quentes, como Campo Grande, a passar um dia inteiro abaixo de 9 ºC. Já na Amazônia, a estiagem tem sido letal para os animais aquáticos e causou a morte de, pelo menos, 141 botos das espécies cor-de-rosa e tucuxi. A data de 28 de setembro foi a mais mortífera — noventa carcaças foram encontradas em um dia no Lago Tefé, no interior do Amazonas, quando a temperatura da água chegou a 40 ºC.
Transbordamento em Porto Alegre. O Rio Guaíba, na capital gaúcha, subiu ao nível de 3,17 metros e transbordou em setembro, deixando a orla completamente alagada. A cheia foi provocada por um ciclone extratropical que elevou as águas ao maior registro desde 1941, quando atingiu 4,75 metros em razão de uma enchente na cidade. Marcado por tempestades intensas, o inverno gaúcho de 2023 foi o terceiro mais chuvoso das últimas seis décadas — entre julho e setembro, o estado registrou 652,2 milímetros de precipitações, atrás dos 677,9 milímetros marcados em 2020 e da medição de 694,7 milímetros em 1972.
Ar irrespirável. Durante vários dias de outubro, uma forte névoa cobriu Manaus, em grande parte em razão do número recorde de focos de incêndio provocados pelas altas temperaturas, pela seca e, claro, pela ação humana. Nesse período, a quantidade de poluentes em suspensão chegou a 225 microgramas por metro cúbico, dez vezes a concentração considerada tolerável pela Organização Mundial da Saúde (OMS).