A região conhecida como Cracolândia é alvo de uma operação na manhã desta terça-feira, 6, para desarticular as ações do Primeiro Comando da Capital (PCC) no controle não só do tráfico de drogas e da concentração de dependentes químicos no chamado “fluxo”, mas de um complexo “ecossistema criminoso” que, segundo o Ministério Público, se aproveita do ambiente de desordem na região central de São Paulo para empreender uma ampla rede de atividades ilícitas que utilizam como fachada estabelecimentos comerciais como lojas, hotéis e casas de hospedagem, estacionamentos e ferros-velhos.
Entre os crimes investigados estão o comércio ilegal de armas de fogo e peças de veículos, motocicletas e telefones celulares; receptação de material roubado; corrupção passiva e ativa de agentes públicos que “vendem” proteção aos comerciantes da região, com atuação de milícia; extorsão; submissão de pessoas a trabalho análogo à escravidão; e outras violações graves aos direitos humanos, entre outros.
A operação Salus et Dignitas é sustentada em investigação feita pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de São Paulo e tem a participação de Receita Federal, Polícia Militar (PM), Polícia Civil, Polícia Federal (PF) e Ministério Público do Trabalho (MPT).
Ao todo estão sendo cumpridos sete mandados de prisão preventiva e 117 de busca e apreensão, além de 46 de sequestro e bloqueio de bens e suspensão de atividade econômica de 44 prédios comerciais. Há também previsão de perda da licença e lacração de imóveis para garantir que a atividade ilícita não volte a acontecer no local.
Os mandados foram expedidos pela 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital.
Em nota, o governo do estado informou que o governador Tarcísio de Freitas e o secretário de segurança Pública, Guilherme Derrite, sobrevoaram a região central da capital para acompanhar o trabalho das forças de segurança. Uma equipe multidisciplinar também está oferecendo auxílio social aos desalojados.
Léo do Moinho
O principal alvo é Leonardo Monteiro Moja, apontado como líder do tráfico na favela do Moinho e responsável pelo fornecimento de drogas na região central da capital paulista. Seria dele, segundo os investigadores, o controle territorial da atividade criminosa e a palavra final nos “tribunais do crime” da região da Cracolândia.
Léo do Moinho, como é conhecido, já foi preso ao menos duas vezes e está em liberdade condicional. Segundo o Ministério Público, ele continua gerindo as atividades ilícitas em estabelecimentos comerciais na região por meio de laranjas. Com ajuda do Coaf, investigadores identificaram intensa movimentação financeira de auxiliares de Léo do Moinho e em favor dele.
Além de Léo do Moinho, também são alvos de mandados de prisão preventiva Valdeci Mecias de Jesus, apontado como o responsável pela rede de comunicação da quadrilha, que tinha acesso às transmissões codificadas da polícia; Rubens Alexandre Bezerra, ex-guarda civil metropolitano que seria fornecedor de armas de fogo de grosso calibre, como fuzis, e equipamentos de bloqueio de sistemas de segurança usados pela criminalidade de rua; e Janaína da Conceição Cerqueira Xavier, apontada como gerente do tráfico.
O Gaeco também pediu a prisão preventiva de três guardas civis metropolitanos: Elisson de Assis, Renata Oliva de Freitas Scorsafava e Antonio Carlos Amorim Oliveira. Segundo os investigadores, eles atuavam como milícia, extorquindo comerciantes em troca de proteção contra delitos patrimoniais cometidos pelos adictos, além do comércio ilegal de armas.
Em representação à Justiça, o Ministério Público descreve a atuação da organização criminosa em cinco núcleos: o de controle territorial e centralização das atividades criminosas na Favela do Moinho; o de comércio de armas e milícia; o de receptação de celulares e peças roubadas, hotéis e hospedarias e o de ferro-velho.
“Segundo os elementos de informação colhidos no curso da investigação, a região constitui um ecossistema de atividades economicamente ilícitas, não somente pelo tráfico de drogas e concentração de dependentes químicos, cujas ocorrências são notoriamente conhecidas, mas principalmente o comércio ilegal de peças de veículos, motocicletas e telefones celulares sem origem comprovada ou de origem ilícita; casas de prostituição, mantidas clandestinamente nas dependências de hotéis, em desacordo com as posturas municipais; funcionamento de ‘ferros-velhos’ sem qualquer controle e tratamento dos resíduos sólidos, bem como corrupção passiva e ativa de agentes públicos que ‘vendem’ proteção aos comerciantes da região”, diz a representação assinada por cinco promotores do Gaeco, entre eles o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, especializado no combate às ações criminosas do PCC.
Eles apontam ainda “fortes indícios da existência de uma estruturada rede de receptadores, instalados comercialmente na região, os quais absorvem os produtos oriundos de furto e roubo que lhes são ofertados, armazenando-os e comercializando-os nas dependências de seus estabelecimentos”.