Tragédia no RS: deputados querem punir ‘obstrução’ de auxílio a vítimas
Projeto de lei encabeçado por parlamentares bolsonaristas usa como justificativa episódios cuja veracidade não foi comprovada
Chegou nesta segunda-feira, 13, à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados um projeto de lei proposto por parlamentares bolsonaristas que quer tranformar em crime a criação de óbices a ajuda humanitária em situações de calamidade pública. A justificativa do projeto menciona situações que teriam acontecido nas enchentes do Rio Grande do Sul — mas que não foram comprovadas e são, em sua maioria, fake news.
O texto do projeto cria um novo artigo no Código Penal, que pune com quatro a oito anos de prisão quem “criar óbice ou embaraço fiscal, sanitário, ambiental ou administrativo, impedir ou dificultar serviço de combate ao perigo, de socorro ou salvamento, ou a entrega de donativos ou o resgate às vítimas, durante a vigência de estado de calamidade pública”.
Na justificativa, os deputados falam que existem “relatos” de caminhões com doações que teriam sido parados nas estradas por falta de nota fiscal ou com excesso de peso na caçamba. A Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul disse, em nota divulgada no dia 7 de maio, que a informação é falsa. Ela foi divulgada pelo coach Pablo Marçal, que é alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) por disseminar fake news sobre a tragédia no Rio Grande do Sul.
Outro episódio mencionado pelos parlamentares para sustentar a importância do projeto de lei é uma suposta proibição que proprietários de jet skis estariam enfrentando para trafegar nas áreas alagadas socorrendo vítimas. Circulou nas redes sociais um vídeo que mostra membros do Exército organizando as embarcações, mas não há qualquer prova de multa imposta aos condutores. O governo gaúcho divulgou, no dia 5, que não está exigindo habilitação de condução para quem está prestando resgate às pessoas ilhadas.
O autor principal da proposta nº 1.633/2024 é o deputado federal Coronel Meira (PL-PE), mas o rol de endosso tem outros parlamentares que são representantes mais panfletários do bolsonarismo, como Carla Zambelli (PL-SP), Zé Trovão (PL-SC), Júlia Zanatta (PL-SC) e Marco Feliciano (PL-SP).
Na mira do STF
Além do influenciador Pablo Marçal, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) é outro alvo da investigação do Supremo, que está aos cuidados da ministra Cármen Lúcia. O filho do ex-presidente disse que o governo Lula demorou quatro dias para liberar auxílio financeiro para o Rio Grande do Sul. O inquérito foi aberto a partir de um ofício elaborado pela Secom (Secretaria de Comunicação do Governo Federal) que elencou doze notícias falsas espalhadas por políticos, sites, influenciadores e blogueiros, envolvendo o assunto das enchentes no RS.
O boletim mais recente da tragédia, divulgado ao meio-dia desta segunda pela Defesa Civil do Rio Grande do Sul, afirma que 147 pessoas já morreram desde o começo das enchentes. Devido ao retorno das chuvas no final de semana, o nível do lago do Guaíba voltou a subir e já está próximo dos cinco metros novamente.