O barulho causado pela aprovação quase unânime da chamada PEC Kamikaze, que dá cheque em branco ao governo para ampliar despesas a menos de 100 dias das eleições, escondeu um fator importante da votação: apenas o senador José Serra se posicionou contra a aprovação da proposta.
Depois de passar um tempo afastado por motivos de saúde e reassumir seu mandato de Senador no fim de janeiro deste ano, José Serra deu uma aula de responsabilidade à frente do cargo que ocupa.
A votação da proposta, que aconteceu nesta quinta, 30, teve placar de 72 votos a 1 no primeiro turno e de 67 votos a 1 no segundo turno. Nas duas situações, esse único voto contrário foi de Serra.
“Fui o único senador a votar contra a [Proposta de Emenda à Constituição] PEC 16, aprovada em conjunto com a PEC 1/22, apelidada de PEC Kamikaze. Por esse nome já sabemos que se trata de uma bomba fiscal. Essa PEC viola a Lei de Responsabilidade Fiscal e fura o teto de gastos. O pretexto foi defender quem mais precisa, mas isso deveria ser feito de outra forma — o governo enviaria projeto de lei e créditos extraordinários, sinalizando controle e governança”, escreveu o senador em seu Twitter.
O raciocínio faz todo sentido. Em meio a uma crise econômica que só chegou a esse ponto por ineficiência do governo, o presidente Jair Bolsonaro tenta desesperadamente melhorar seus índices de popularidade entre os eleitores enquanto as pesquisas de intenção de voto mostram que suas chances de reeleição são pequenas.
José Serra tem uma carreira política respeitável. Em um de seus projetos mais importantes, implantou o inquestionável programa de combate à Aids quando ocupou a cadeira de Ministro da Saúde no governo de Fernando Henrique Cardoso.
O tucano, que viu ainda a investigação contra ele aberta pela Lava Jato ser suspensa, sabe que a aprovação da PEC não é a solução. A questão não é deixar os mais necessitados sem assistência, mas fazer isso da forma correta. Esse tipo de atalho só piora as contas públicas e o Brasil vai pagar um preço alto no futuro.
Furar o teto de gastos é uma irresponsabilidade. Bolsonaro faz isso porque está pensando apenas no curto prazo e em conseguir mais votos em outubro. Depois que as eleições passarem, o ocupante da cadeira de Presidente da República terá um rombo para resolver. José Serra sabe disso. E merece os parabéns por ter se colocado contra esse absurdo.