Entre o agradecimento a Deus pela “segunda vida” e o levantar do coro do “imbrochável”, Jair Bolsonaro executou o crime que ele preparou para os 200 anos da Independência brasileira.
Sequestrou o maior ato cívico da República nos últimos duzentos anos em um “tudo ou nada” de sua campanha à reeleição, que tem – até agora – patinado completamente por conta de seu pouco crescimento nas pesquisas de intenção de voto.
Agora, a palavra está com o Tribunal Superior Eleitoral.
O líder da extrema-direita brasileira pode planejar em praça pública um ato, excluindo parte da população? Exilando milhares dentro da Terra natal transformando-o em ato de campanha, sem ser punido por crime eleitoral?
Vários jornalistas, escritores e intelectuais têm escrito sobre o sequestro do 7 de Setembro, mas a historiadora Lilia Schwarcz, que deu uma entrevista para a coluna neste feriado, foi a primeira.
Essa é a questão agora: a execução do crime.
Em Brasília, Bolsonaro pediu votos e ameaçou as instituições democráticas dizendo que, se for reeleito, “[trará] para dentro das quatro linhas da Constituição todos aqueles que ousam ficar fora delas”.
Mais uma vez maculou a imagem do Supremo Tribunal Federal e encucou em seus milhares de seguidores o radicalismo de que a mais alta corte do país joga contra a constituição, enquanto ele, o mandatário, que trai a pátria.
No Rio de Janeiro, mais ataques ao Supremo, à democracia e à Justiça – em um tom abaixo do ano passado e com o discurso ensaiado – para poder se defender de eventuais acusações.
O presidente dizia na cidade maravilhosa: “agora vocês sabem o que é o STF”, seus seguidores vaiavam a corte e ele sentenciava: “a voz do povo é a voz de Deus”.
Afora esses movimentos, fez um discurso político radical, chamando Lula, o líder das pesquisas até agora, de “quadrilheiro”, e pedindo para extirpar “esse tipo de gente” da vida política.
Não se trata mais de um presidente que não tem a compreensão da liturgia do cargo. Ou é exagero dizer isso com o mandatário gritando repetidamente “imbrochável” no aniversário de dois séculos da independência?
Não se trata mais de um presidente machista, grosseiro – capaz das maiores indelicadezas. Ou é exagero dizer isso com Bolsonaro “comparando as primeiras-damas”, afirmando que a dele é “de Deus, família e ativa”?
Trata-se de finalmente a Justiça eleitoral dizer se o presidente comete crime ou não com a bandeira do Brasil. Ou não há consenso no país sobre a importância dos dois séculos de um grito de liberdade?