Boulos: o maior fenômeno eleitoral de 2020?
Como entender a trajetória do candidato do PSOL, da lanterninha para a terceira posição, na maior cidade do país
O descolamento de Guilherme Boulos (PSOL) do pelotão de trás e a aproximação dos líderes Celso Russomanno (Republicanos) e Bruno Covas (PSDB), em São Paulo, tem potencial para se transformar no mais marcante fato político das eleições municipais de 2020 e a novidade mais expressiva das urnas desde a vitória de Jair Bolsonaro em 2018.
Ainda é cedo para tirar conclusões, já que o horário eleitoral de TV começa agora, mas o candidato do PSOL à prefeitura paulistana cresceu três pontos em 10 dias, está isolado em terceiro lugar com 12% (a 9% de Covas e a 15% de Russomanno) e já começa a ganhar terreno no histórico eleitorado paulistano do PT.
Fato é que a base petista, que já conseguiu eleger Luiza Erundina, Marta Suplicy e Fernando Haddad, pode entender que Boulos é o único candidato da esquerda viável em São Paulo, e despejar, ainda no primeiro turno, seus votos no PSOL, num movimento inédito na capital paulista.
Nunca um partido tão à esquerda governou São Paulo. Tirando os três petistas que administraram a cidade, uma delas Erundina, vice de Boulos na atual chapa, a esquerda viu a direita comandar a capital paulista por muitas vezes, passando pelo PSD de Paulo Maluf, o DEM de Gilberto Kassab, ou até mesmo por partidos de centro-direita, como o PSDB de José Serra
Sim, ainda é cedo, mas a cidade de São Paulo, dizem os cientistas políticos, é o laboratório eleitoral do Brasil miscigenado e migrante. Se Russomanno, que é ruim de chegada, ficar de novo pelo caminho, a capital paulista poderá ver uma disputa entre o PSDB e a esquerda, mas sem o PT. Se Boulos crescer e passar Covas, a cidade pode testemunhar a disputa entre Russomanno, candidato neobolsonarista, contra a extrema-esquerda.
Ou seja, uma polarização com Covas recupera o eixo central de uma disputa na capital, que era o mesmo da nacional, PSDB versus esquerda, porém mostrando que há alternativas ao PT. Se for com Russomano, repete, nessas condições renovadas, a polarização nacional de 2018 da extrema-direita contra a esquerda.
Como lembrou a coluna Maquiavel, o desempenho do candidato do PSOL surpreende porque na única eleição que disputou até agora, para presidente da República em 2018, ele chegou em 10º lugar entre 13 candidatos, com 0,58% dos votos, menos da metade do excêntrico Cabo Daciolo.
Boulos já é um dos fenômenos dessa eleição pela capacidade de comunicação. Sua fala é fácil e carismática. Ele vence assim o grande preconceito que é jogado contra ele por ter vindo de um movimento que usa a técnica da ocupação de imóveis públicos vazios para a residência.
A tática sempre foi considerada controversa, mas ele chama a atenção para o problema do enorme déficit de moradia para os pobres nas grandes cidades brasileiras. Por isso, Boulos concentrou a campanha pré-horário eleitoral na periferia, onde Russomano tem sua base principal.
O candidato do PSOL fez seu movimento de base com o MTST, construindo habitações em bairros populares de melhor qualidade do que as do programa Minha Casa Minha Vida. Ele tem raiz e base. Por isso, o potencial para crescer.
De qualquer forma, mesmo que fique apenas na posição de terceira via, Boulos pode colocar uma nova equação nas eleições presidenciais de 2022, desde que Jilmar Tatto, candidato do PT, permaneça com seus pífios 1% ou não surja como opção real em nenhum momento da campanha.
Já se sabe que a polarização PT-Bolsonaro não deve se repetir em 2020, como mostrou a coluna nesta semana. Mas será que uma nova cara da esquerda está nascendo como opção ao bolsonarismo de extrema-direita? Os próximos 37 dias, até o primeiro turno das eleições, começarão a responder essa pergunta.