Nos últimos dias, o Judiciário mostrou tendências diferentes em casos de grande repercussão política no país. A decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de anular a quebra de sigilo bancário do senador Flávio Bolsonaro no caso das “rachadinhas’’, invalidou provas de movimentação bancária porque, na visão da maioria de uma turma da corte, a fundamentação do pedido do juiz de primeira instância estava falha.
Ou seja, o juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça (TJ) do Rio de Janeiro, não teria feito uma fundamentação adequada. Enquanto isso, a instância superior ao STJ, o Supremo Tribunal Federal (STF), liberou para a defesa do ex-presidente Lula o acesso às mensagens obtidas através de hackeamento dos celulares do ex-juiz Sergio Moro e dos procuradores que atuaram na Lava Jato.
As conversas hackeadas ainda não foram aceitas como provas – isso será julgado pelo Supremo-, mas, com base nelas, os advogados de Lula tentarão colocar a atuação de Moro sob suspeição. O objetivo é anular as condenações contra o petista, mostrando que sua prisão resultou de combinações estabelecidas previamente entre os procuradores e o ex-magistrado.
Mesmo que a legalidade das provas não tenha sido ainda julgada pelo STF no caso das mensagens obtidas ilegalmente, juristas acreditam que há dois pesos e duas medidas nas decisões das cortes nesses dois casos extremamente polêmicos.
“Se você comparar as duas decisões, o STF aceita que um hacker ‘hackeie’ um juiz e autoriza a utilização disso como meio de prova para anular um processo. Ainda não decidiu se vai anular, mas praticamente já aceitou como meio de prova. E agora, na decisão do Flávio, como aconteceu? [O STJ diz]: ‘por falta de uma fundamentação eu não posso usar como meio de prova. É uma prova obtida de forma ilícita porque o juiz determinou sem fundamentação correta’. São dois pesos e duas medidas, só que uma foi tomada pelo STJ e outra pelo STF”, analisou um jurista em conversa com a coluna.
Caso o Supremo reafirme a autorização do uso das mensagens hackeadas, ele estará dizendo: “pode-se usar a prova obtida de forma ilícita, desde que ela seja uma prova cabal, uma prova que resolva o problema do crime”. Ou seja, se a teoria do caso de Lula for usada no processo de Flávio Bolsonaro, pode haver uma reviravolta – não importa a forma da fundamentação, mas sim que um crime foi descoberto.
Portanto, na visão de alguns juristas, se o STF entende que uma prova obtida por um hacker pode ser liberada para que a defesa de Lula tente anular suas condenações, as transações bancárias de Flávio Bolsonaro também poderiam valer, mesmo que a fundamentação do juiz não tenha sido tão bem elaborada, como prevê a lei. No caso de Flávio Bolsonaro ainda há o agravante de que o magistrado refez a sua fundamentação, corrigindo o eventual erro de origem.