Dia desses, um cientista político estrangeiro me escreveu perguntando: “Afinal, o que acontece no Brasil que não se conseguem eleger mulheres governadoras?” Ele pesquisa política peruana, mas o desvio de rota é tamanho que acabou impressionando até mesmo quem não acompanha o dia a dia da política brasileira.
Esta semana, pensando sobre esta pergunta feita há alguns meses, minha vontade era de enviar a ele todas as reportagens que mencionavam a decisão do PDT do Ceará de não permitir que a atual governadora, Izolda Cela, fosse a candidata ao governo do estado.
Para lembrar, em 2018, no Brasil, apenas um estado, o Rio Grande do Norte, elegeu uma mulher; Fátima Bezerra, pelo PT. Em 2014, também fora somente uma: Suely Campos, em Roraima, pelo PP. Em 2020, nas eleições locais, só uma capital, Palmas (TO) elegeu uma mulher: Cinthia Ribeiro, do PSDB, engravidou durante o mandato e descobriu que não tinha direito a algum tipo de licença-maternidade, teve que fazer um quarto para o filho na prefeitura e seguiu trabalhando.
Izolda Cela é uma mulher com ampla experiência em políticas de educação, agenda pela qual o Ceará é conhecido internacionalmente, dada a experiência da cidade de Sobral, de que ela foi uma das peças-chave. De fato, Izolda, nas pesquisas, não estava à frente do candidato bolsonarista, Capitão Wagner, no entanto, quando eleitoras e eleitores eram informados de que ela tinha o apoio do presidente Lula, esta dinâmica se transformava totalmente, com a candidata liderando.
Sempre que pesquisamos sobre a baixa representação feminina, sabemos que uma parte da explicação está no fato de que é difícil eleger quem ainda não tem uma trajetória política (e, de fato, muitas mulheres ainda a estão construindo); ou seja, é mais fácil que sejam eleitos aqueles que já tem cargos e um histórico no partido.
O caso de Izolda Cela é justamente o oposto: há, pelo menos, 20 anos, ela vem traçando seu papel dedicado à política, no mesmo partido. Fica evidente que ela seguiu a trajetória esperada para uma candidatura de sucesso, além de estar no cargo. A decisão do PDT, que começou a ser forjada numa sala cheia de homens, como mostraram as imagens, interrompe o natural percurso político de uma mulher com capacidade de se eleger.
Podem-se buscar outros motivos para a decisão do PDT – e, certamente, há. Porém, neste pacote, o viés de gênero, ou mais popularmente, o machismo desempenha um papel eloquente. São os caciques dos partidos mostrando sua pior faceta, para a qual estamos alertando nos últimos anos, que impede que mais mulheres tenham, realmente, chances nos cargos mais altos da política.
* Débora Thomé, cientista política, colabora com a coluna ocasionalmente