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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
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Omitir informações sobre epidemia é estratégia forjada na ditadura

A falta de dados pode levar a tragédias familiares. Conheça uma história nascida na censura que os militares impuseram ao surto de meningite nos anos 70

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 jun 2020, 13h18 - Publicado em 9 jun 2020, 07h36

A estratégia de omitir dados de epidemias da população não foi forjada na democracia. São as ditaduras que gostam de esconder notícias ruins e calar quem busca divulgá-las. Na década de 1970, quando o país vivia o regime militar (1964-1985), milhares de famílias foram afetadas pela decisão do governo de não informar a sociedade que um surto de meningite crescia assustadoramente no interior do Brasil.

Diante do descalabro, a imprensa – censurada pelas armas – nada podia fazer. Ou quase nada. Enquanto as autoridades negavam a existência de uma epidemia, a revista VEJA fez uma corajosa capa. Em outubro de 1972, no auge da repressão da ditadura, publicou uma edição com uma imagem de uma pessoa de perfil na capa, permitindo se ver o cérebro: “Meningite: a epidemia da desinformação”.

capa veja 1972
Capa de VEJA de 4 de outubro de 1972 (Arte/VEJA)

Naquele momento da história, a imprensa oficial, que nada informava, chegava à maior parcela da população brasileira. E qual foi o resultado mais cruel dessa estratégia negacionista da ditadura? A epidemia demorou quase uma década para ser controlada.

De 1970 a 1972, as mortes estouraram, atingindo 14% das contaminações em diversos estados do país. Entre 1973 e 1974, caiu para aproximadamente 7%, naquilo que parecia ser o controle da doença. Em 1975, contudo, voltou a estourar, e as mortes atingiram assombrosos 30% dos casos de contaminação. 

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Até 1977, quase uma década após o início da epidemia, ainda eram registrados óbitos acima do esperado. Naquele ano, a meningite pegou mais uma mãe desprevenida: Maria Lazara de Souza, moradora de Pires do Rio, no interior de Goiás. Sem ter informações sobre como enfrentar a doença, desamparada pelo sistema público de saúde, tratou o filho Juliano Mariano com remédios caseiros.

Quando a febre da criança chegou aos 42 graus, Maria Lazara encheu um tanque com água fria para dar um banho em Juliano, segundo relato dela em entrevista que me deu anos depois. A dona de casa queria baixar a alta temperatura que tomava o menino. O corpo dele não aguentou – enrijeceu inteiramente ao entrar na água. Em seguida, veio uma forte convulsão. 

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Deste dia em diante, Juliano Mariano apresentou distúrbios mentais, que pioraram ao longo dos anos. À medida que foi chegando à vida adulta, o rapaz começou a ficar violento, assustando a família e os vizinhos. Alguns episódios de agressões se sucederam. No Brasil sem a presença do estado, a prefeitura de Pires do Rio resolveu “ajudar”. Construiu uma cela nos fundos da casa, com barras e tudo. Lá, Juliano Mariano viveu trancado.

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É essa ditadura que o presidente Jair Bolsonaro defende com unhas e dentes e que o alto escalão do governo também o faz. A estratégia de omitir os dados da meningite ajudou a manter a popularidade alta do regime, mas gerou tragédias das mais variadas ao redor do Brasil. 

Não é a primeira vez que Bolsonaro tenta usar métodos daquele tempo sombrio. A tentativa do Ministério da Saúde de ocultar dados da Covid-19, em 2020, pela omissão ou pela recontagem, começou sorrateira, ganhou repercussão internacional e o governo teve que recuar. 

Ainda não estava claro – até a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, pela retomada da divulgação dos dados acumulados do coronavírus – se o novo modelo proposto seria realmente descartado. Mas se provou o que o atual governo insiste em negar: o tempo passou e a democracia, com a imprensa livre e o judiciário independente, chegou. Ela resistirá.

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