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Al-Zawahari: um míssil ninja acabou com uma caçada de vinte anos

E mostrou ao mundo que o Afeganistão voltou a ser oficialmente um ninho de terroristas ao acolher o líder da Al Qaeda em plena capital

Por Vilma Gryzinski 2 ago 2022, 07h54

Ele não era carismático nem tinha o porte imponente de Osama Bin Laden. Mas Ayman Al-Zawahari costumava ser chamado de o “verdadeiro cérebro” da Al Qaeda: dele partiam as instruções detalhadas para atentados terroristas dos quais o mais infame da história, os do Onze de Setembro.

O médico egípcio também conseguiu sobreviver doze anos a mais do que Bin Laden, usando a mesma rede de apoio entre o Paquistão e o Afeganistão que vai de militantes que abraçaram a ideologia fundamentalista da Al Qaeda a funcionários devidamente corrompidos.

No fim, provavelmente se sentia mais seguro. As forças americanas haviam batido em retirada, caoticamente, do Afeganistão e seus aliados do Talibã estavam de volta ao poder. Tinha voltado à capital, Cabul, numa prova de que a proteção oficial ao terrorismo estava restaurada. Morava desde o ano passado numa casa pertencente a Sirajjudin Haqqani, um chefe de facção que ocupava o posto de vice-ministro do Interior.

Até que dois “mísseis ninja” – nome oficial R9X Hellfire – apareceram na sacada da casa. O míssil disparado por drones não explode, como os foguetes convencionais, mas solta seis lâminas que esmagam e cortam o alvo. Foi especialmente desenvolvido para evitar os “danos colaterais”, geralmente mulheres e crianças dos quais os terroristas se cercam, sabendo o efeito negativo que a morte de inocentes tem sobre a opinião pública nos países ocidentais.

É uma arma que já foi descrita como uma combinação de “brutalidade medieval com alta tecnologia”.

O problema, obviamente, é ter certeza de que vai atingir o alvo desejado. Mesmo o sofisticado sistema americano de vigilância pode provocar erros como o que aconteceu durante os dias caóticos da retirada do Afeganistão: um drone do Exército acompanhou o trajeto de um carro suspeito de transportar um terrorista suicida.

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Temendo uma repetição do atentado que havia matado treze americanos no aeroporto de Cabul, os responsáveis pela inteligência do Exército autorizaram um ataque contra o carro. O míssil matou dez pessoas de uma família, incluindo sete crianças e o motorista suspeito, na verdade funcionário de uma ONG americana.

Zawahari já era um fundamentalista quando conheceu Bin Laden, num Afeganistão ainda ocupado por forças soviéticas, com um histórico que remetia ao assassinato de Anuar Sadat, o presidente egípcio metralhado durante um desfile militar por ter  cometido a ousadia de ir a Israel e abrir caminho a um tratado de paz que mudou o Oriente Médio.

Juntos, Bin Laden e Zawahari alimentaram-se mutuamente, desenvolvendo as teorias fundamentalistas que embasaram a sua jihad, a guerra santa à qual todos os muçulmanos tinham a obrigação de abraçar para expulsar os infiéis das terras islâmicas. O time foi reforçado com uma espécie de diretor operacional, o paquistanês Khalid Sheikh Mohammed, preso desde 2003 na base americana em Guantânamo – que nunca poderá ser fechada: se levado a território americano continental, ele desafiaria todo o sistema de justiça, que não pode aceitar provas tiradas sob tortura.

Segundo especialistas em religião muçulmana, Zawahari tinha um embasamento teológico mais sólido do que Bin Laden. Foi no Egito moderno que nasceu a Irmandade Muçulmana, a organização mãe de todos os fundamentalismos Exibia também na testa a “zabiba”, literalmente, uva passa, a mancha causada pela hiperpigmentação de tanto bater a cabeça no chão, numa das quatro posições das preces islâmicas. 

A marca é considerada uma prova de grande devoção e não há dúvida de que o cirurgião egípcio abraçou uma forma extremada – e monstruosa – de prática religiosa, responsável por muitos milhares de mortes, não apenas dos “infiéis” americanos dizimados sob os escombros do World Trade Center, mas de muçulmanos que não obedecessem ao mesmo radicalismo ou simplesmente estivessem no caminho dos guerreiros de Alá.

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A guerra ao terror decretada pelos Estados Unidos depois do Onze de Setembro produziu resultados complexos, que não podem ser resumidos em deu certo ou errado. A Al Qaeda foi dizimada, mas a ideologia que a alimenta não desapareceu. Ao contrário, a invasão do Afeganistão e, depois, do Iraque alimentou as próprias pulsões que pretendia erradicar.

No Oriente Médio, acabou dando origem ao Estado Islâmico, um movimento fundamentalista mais radical ainda do que os “tradicionalistas” da Al Qaeda. O próprio Talibã não só sobreviveu como retomou o poder, com a anuência de um governo americano interessado a acabar com um capítulo infeliz mesmo que ao preço de uma retirada humilhante.

Ninguém, obviamente, acreditou quando líderes do Talibã assumiram o compromisso de não se tornar, de novo, um foco de terrorismo. Mas ouvir que a morte do mestre terrorista foi uma transgressão das normas do direito internacional introduziu uma dose quase inacreditável de ironia nessa história.

O formidável aparato de inteligência dos Estados Unidos conseguiu acuar os fundamentalistas, evitar um novo Onze de Setembro, matar Bin Laden em seu “aparelho” no Paquistão e, agora vinte anos depois, fatiar Zawahari em Cabul. 

A ideia espetacularmente irrealista dos neoconservadores do governo Bush, de que as intervenções americanas desencadeariam sistemas democráticos que seriam a melhor defesa contra o terrorismo, deu errado e o fundamentalismo continua muito vivo.

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Mas Zawahari deixou o século XXI bem menor do que entrou nele.

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