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Israel e palestinos: outro guia contra mais mentiras deslavadas

Como a guerra, o conflito no Oriente Médio é um assunto sério demais para ser deixado nas mãos dos desinformadores profissionais

Por Vilma Gryzinski
16 Maio 2018, 08h41
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  • Uma bebezinha de apenas oito meses apareceu em imagens do mundo todo. Os olhos azuis brilhando no rostinho redondo já estavam apagados, a face sem cor, o corpinho alquebrado. Mesmo assim continuava sendo exibido pela família, em imagens de cortar o coração.

    A tragédia da breve vida interrompida de Layla Gadhour é um exemplo terrível das mentiras propagadas sobre o conflito entre árabes e judeus naquela que para os cristãos é a Terra Santa (santa, não sagrada, como a tradução torta).

    A família da pequenina Layla disse que ela foi morta com gás lacrimogêneo jogado pelo Exército israelense contra as pessoas que há várias semanas tentam derrubar a cerca  entre Gaza e Israel.

    Como uma bebezinha foi parar num dos lugares mais violentos da face da Terra no momento? Uma “confusão” com ambulância, diz a família.

    Como uma ambulância foi parar na zona de perigo? “Fui procurar minha filha e disseram que ela tinha sido levada para o hospital”, disse a mãe, Seham Gandhour.

    Como uma mãe não sabe onde está filhinha de oito meses e ponto de precisar “procurar” por ela?

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    Um site israelense disse que a menininha morreu de uma doença preexistente, atribuindo a informação a um “médico de Gaza”. Pode ser mentira, pois a desinformação deliberada costuma ser alta.

    Mas qual a única alternativa a essa explicação? Uma ambulância maluca que ruma com uma bebê exatamente para a área aberta e conhecida onde estão sendo disparados tiros?

    O uso da pequena Layla como arma de propaganda ilustra um dos aspectos do conflito atual: coordenar atos violentos junto à cerca e incentivar tentativas de derrubá-la, sabendo que o Exército de Israel não vai permitir isso, é uma política deliberada para produzir vítimas.

    Em vários sentidos, essa política funciona. A agitação em torno da cerca, seguida da inevitável repressão, ofuscou a inauguração da nova embaixada americana em Jerusalém (na verdade, uma nova placa, no consulado que já existia, embora o significado político não mude em nada com isso).

    O número de mortos – mais de  60 – e feridos, atingidos principalmente por tiros nas pernas, causa consternação e protestos de vários governos.

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    Levantam também  questões sobre as regras de engajamento para uso de força letal por parte das Forças de Defesa de Israel.

    Até os grandes ajuntamentos de segunda-feira, o dia mais mortífero, havia uma sequência: palestinos de Gaza, incluindo mulheres e jovens, começavam a se aproximar da cerca; a certa altura, uma parte deles começava a queimar pneus, jogar coquetéis molotov e até empinar pipas com produtos inflamáveis para provocar incêndios no lado israelense.

    Alguns apareciam com armas, sinal de que são militantes do Hamas, a organização político-militar que controla Gaza.

    Outros, com alicates para tentar cortar a cerca. Os soldados israelenses tinham uma visão razoável dos que representavam uma ameaça iminente de perigo. Houve casos aparentes de uso excessivo da força.

    Os israelenses receberam ordens de moderar o uso de munição letal e praticamente não houve mais mortos. A Suprema Corte de Israel ainda está para anunciar uma decisão sobre este tipo de engajamento.

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    Com os grandes movimentos que coincidiram com a inauguração da embaixada americana, a situação piorou bastante.

    É exatamente esta a política do Hamas: quanto pior, pior para os israelenses. As vidas sacrificadas evidentemente não contam. São denominados como mártires e juntam mais alguns litros no caldeirão de ódio.

    Por que tantas pessoas estão dispostas a ir desarmadas a um lugar onde sabem que, dependendo do nível de agressão, podem perder a vida (mas, se ganharem alguma brecha na cerca, podem “matar judeus”, como muitos dizem)?

    Gaza, com certeza, é um lugar horroroso. É muito importante saber por que se tornou assim. Um dos principais motivos dessa importância: muitos israelenses judeus vêem em Gaza o exemplo acabado do que acontece quando devolvem territórios esperando uma acomodação com a população palestina.

    A Faixa de Gaza foi conquistada ao Egito, juntamente com o Sinai, em 1967, quando exércitos árabes tentaram invadir e eliminar Israel do mapa. O Egito abriu mão do território quando fez um acordo de paz com Israel, em 1979.

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    Com outro acordo, o de 1994, a liderança palestina no exílio voltou a territórios com diferentes graus de autonomia. Estas regiões ficaram sob o controle da Autoridade Palestina. Gaza só acabou desocupada, na marra, por decisão de Ariel Sharon, em 2005.

    As instalações deixadas pelos israelenses obrigados a sair de Gaza, onde desenvolviam principalmente a agricultura de deserto, foram completamente destruídas. Um importante sinal da cultura de  ódio ao ponto da autodestruição do que ainda estaria por vir.

    A liderança palestina, desde o início nas mãos da Organização para a Libertação da Palestina, montada segundo o modelo esquerdista em vigor na década de 60, começou a enfrentar a concorrência do movimento político-religioso de matriz fundamentalista.

    O Hamas, que segue o molde da Irmandade Muçulmana, tornou-se forte especialmente em Gaza, devido à conexão com o Egito, o lugar onde nasceu esse movimento.

    Em 2007, o Hamas deu um golpe na Fatah, o grupo tradicional da OLP. Massacrou o adversário (120 combatentes mortos no total, mais 39 civis). Quem não fugiu, morreu.

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    O bloqueio de Gaza, decretado por Israel e pelo Egito, surgiu aí. O Hamas era uma força hostil, sem nenhum compromisso com acordos anteriores e com o objetivo declarado de eliminar Israel do mapa.

    O bloqueio, terrestre e naval, um instrumento legítimo de autodefesa, não significa que Gaza tenha virado “uma prisão a céu aberto”. Exceto em momentos de conflagração geral, cerca de 800 caminhões entram por dia em Gaza, levando suprimentos bancados pelo Catar, o grande sustentáculo do Hamas.

    Todas as tentativas de “reconciliação” entre Hamas e Fatah são isso: tentativas. A principal passagem dos comboios de caminhões, por exemplo, foi totalmente destruída na atual onda de protestos e agressões junto à cerca. Motivo? É controlada pela Fatah.

    Novos conflitos estão sendo desenhados para o período que se seguirá ao fim de Mahmoud Abbas no controle da Autoridade Palestina. Abbas está com 81 anos, embora continue a falar coisa com coisa.

    Recentemente, disse que o genocídio dos judeus na Europa foi consequência do próprio comportamento deles, que “emprestavam dinheiro” e outras coisas que, pela lógica dos imorais, só podia acabar na eliminação em massa.

    Quando morava na União Soviética e se aperfeiçoava como informante da KGB, entre estudos universitários, Abbas escreveu uma tese com “a verdade sobre o Holocausto”.  Não é difícil imaginar o conteúdo.

    Abbas teve a honradez de pedir desculpas pela recente barbaridade, o que deve ser reconhecido e elogiado.

    Muitas vezes, ele e outros líderes palestinos usam o duplo discurso, para o público interno e o externo. Também fazem declarações inúteis, só para constar.

    O exemplo mais repetido recentemente por Abbas: os Estados Unidos se “desclassificaram” como mediadores ao transferir a embaixada para Jerusalém.

    Faz parte do show, apesar do ridículo inerente. O importante é entender como se desenvolvem as disputas internas entre palestinos, um fator determinante no presente e no futuro, e como as diferentes tendências políticas em Israel vêem a possibilidade de entendimentos.

    Dá para imaginar um governo israelense, nem que fosse de esquerda – possibilidade inexistente no momento -, que levantasse o bloqueio a Gaza e abrisse a cerca para que seus cidadãos fossem eviscerados pelos vizinhos?

    Evidentemente, não.

    Dá para imaginar um governo israelense que aceite um acordo com a Autoridade Palestina, evidentemente proposto pelos Estados Unidos, implicando não só Fatah e correlatos como a maioria dos países árabes nas garantias de não-agressão em troca da criação de um estado palestino viável?

    É difícil, mas é a única esperança. Nesse caso, o único com cacife para bancar algo no gênero, no momento, seria Benjamin Netanyahu. Será que Donald Trump levantou a bola dele para depois mandar a conta?

    Trump também já disse que Gaza poderia ser a Singapura do Oriente Médio, tamanha a quantidade de ajuda receberia no caso de um acordo de paz.

    Um grupo político como o Hamas, que escolhe deliberadamente prejudicar seu povo ao máximo, inclusive queimando vidas descartáveis, e que tem apoio popular justamente por representar a rejeicionismo, pode ser sensível a esse argumento?

    A paz só pode ser feita com inimigos. Nesse jogo, uma grande parte será feita pelos países que sustentam o Hamas.

    Sustentar a propaganda do grupo,  inclusive “comprando” mentiras e versões absurdas, contribui para mantê-lo no caminho errado.

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