Quem é o bonitão? Trump deixa jornalistas loucas; de raiva
Depois de derrubar a internet com penteado novo, presidente aciona gatilho da Síndrome de Distúrbio Trumpiano com tuíte sobre prefeito de Londres
É divertido assistir a equipe da BBC, majoritariamente feminina, surtar com Donald Trump.
Mestre supremo do controle da narrativa, o presidente americano deixou as jornalistas da célebre televisão pública, apelidada de BBZeera (uma brincadeira com Al Jazeera), espumando de raiva.
Fora toda a longa lista dos motivos de sempre, o gatilho que acionou o surto de Síndrome de Distúrbio Trumpiano (agora com uma variação nacional, o Distúrbio Bolsonariano) com um tuíte, em pleno voo, sobre o prefeito de Londres, Sadiq Khan, filho de paquistaneses que se tornou o primeiro muçulmano a ocupar o cargo.
O prefeito, entre outras autoridades, como os líderes do Partido Trabalhista e do Liberal Democratas, além do presidente da Câmara dos Comuns, estão boicotando o banquete de hoje à noite oferecido pela rainha
“@SadiqKhan, que por todos os critérios fez um trabalho terrível como prefeito de Londres, foi terrivelmente ‘maldoso” com o presidente dos Estados Unidos, de longe o aliado mais importante do Reino Unido. É um total perdedor que deveria se concentrar na criminalidade em Londres, não em mim.”
Por que não acertar dois coelhos com uma cajadada só? Certamente não é Trump quem desprezaria uma oportunidade dessas.
“Kahn me lembra muito o nosso próprio cretino, o prefeito de Nova York, de Blasio, que também fez um trabalho péssimo – mas com a metade do tamanho dele.”
Do alto de seu 1,62 metro de altura, o prefeito reagiu com superioridade fingida. Antes da visita de Trump, ele havia comparado as palavras do presidente americano à dos “fascistas do século XX”.
O que é pior: ser chamado de incompetente (e baixinho) ou de fascista?
Khan certamente conhece o histórico ensaio de George Orwell O que é o fascismo.
Com lucidez e ironia incomparáveis, Orwell lista todo mundo que é chamado de fascista pelos oponentes: conservadores, socialistas, comunistas, trotsquistas, católicos, opositores da guerra, defensores da guerra, nacionalistas (mas só os nacionalismos que o orador desaprove, como o árabe, o polonês, o finlandês, o indiano hinduísta, o indiano muçulmano, o sionista e o do IRA irlandês).
Só para lembrar, Orwell escreveu o ensaio em 1944, quando a Segunda Guerra estava perto do fim e as explosões anticolonialistas entravam em ebulição.
De novo, só para lembrar: os Estados Unidos salvaram o Reino Unido, que bravamente, numa histórica resistência coletiva, exauria suas capacidades de reagir à Alemanha nazista.
É aceitável que um político britânico, seja qual for sua origem, chame um presidente americano de fascista?
Ainda mais se este político tenha, no passado, dividido palanque com defensores de terroristas islâmicos?
Aos olhos das multidões que vão às ruas hoje, sem falar nas jornalistas da BBC que chegavam a perder o fôlego na ânsia de criticar Trump, Khan faturou mais uma simplesmente ao ser colocado na posição de vítima pelo presidente tuitador.
Mas, para uma parcela considerável de americanos, Trump sai ganhando por não levar desaforo para casa. Bateu, levou é um estilo que tem muitos admiradores.
De novo, é a estratégia de dominar a narrativa, seja deliberadamente ou sem querer, como aconteceu no fim de semana, quando Trump tirou o boné de golfe ao comparecer a um culto e mostrou um penteado muito mais aceitável do que a emaranhada franja em dois movimentos de ondas – talvez um recurso para esconder cicatrizes de implante de cabelos.
Habitualmente, são os cabelos femininos que despertam curiosidade. Agora, até nisso Trump mudou o rumo do discurso. Está todo mundo de olho nele ao longo do dia de hoje. Principalmente no banquete da rainha e na reação do príncipe Harry.
Depois de dizer que não sabia do desapreço que Meghan Markle, a mulher duquesa do príncipe, tinha por ele, chegando a chamá-la de “maldosa”, Trump desmentiu. É claro que o tabloide The Sun tinha o audio e pôs no ar.
É claro que agora todo mundo está falando de Sadiq Khan.
Em tempo: a Síndrome de Distúrbio Trumpiano abrange reações excessivas, descontroladas e irracionais ao estilo anárquico do presidente. Distinguem-se das críticas normais e necessárias justamente por acabar sendo parecidas, em seu exagero, ao próprio discurso de Trump.
O pano de fundo é sempre o mesmo: a inconformidade em aceitar que ele tenha sido eleito presidente.