Na política, a oposição se manifesta em quatro dimensões, pelo menos. A primeira — e mais séria de todas — é a incompetência, que labora contra o individuo e repercute em toda a sociedade. Um governo que não se organiza, obviamente, trabalha contra si mesmo e facilita a vida da oposição vinda dos adversários.
A segunda oposição decorre das circunstâncias. O ambiente pode ser desfavorável por causa de fatores internos e externos. As circunstâncias podem ajudar ou atrapalhar. Temos um cardápio de questões fiscais, econômicas, internacionais, sociais e ambientais que já seriam muito difíceis para governos organizados.
Prosseguindo, temos a oposição dos adversários, que é mais do que fundamental para o bom funcionamento da democracia. Sem uma oposição vibrante, o processo não funciona bem. Historicamente, o Brasil tem uma relação ambígua com ser oposição. Pelo fato de que a política federal é contaminada por agendas estaduais que colocam, por exemplo, aliados no campo federal em situação de oposição no nível estadual. Outro fator é que as agendas de interesses se sobrepõem à filiação partidária, gerando bancadas divididas.
“A arte de fazer oposição parece perdida na política e florescendo nas redes sociais, o que é bom e ruim”
Nos tempos atuais, a arte de fazer oposição parece perdida na política e florescendo nas redes sociais. O que tem um lado bom e outro ruim. O lado bom é que há crítica ao oficialismo e o exercício da liberdade de expressão. O lado ruim é que se desenvolve em um ambiente pobre de reflexões e pleno de agressões — e afetado também pela crescente radicalização da polarização existente.
Falamos agora da quarta dimensão do fenômeno: a oposição dos aliados que se materializa no chamado “fogo amigo”. Revelando que a disputa interna por poder e projetos é mais importante do que o sucesso do governo como um todo. A situação é comprovada pelo desencontro de narrativas e conflitos entre dogmáticos e pragmáticos do governo. E termina sendo o mais sério desafio para o presidente Lula.
A política exige uma boa e autêntica oposição. Tal qual a concorrência no setor privado, a oposição estimula e evita o monopólio de propostas e ideias. Churchill dizia que as pipas voam contra o vento e não a favor dele. A imagem propõe a necessidade de que uma boa oposição faz bem. Tanto ao governo quanto — e sobretudo — ao povo. Mas, quando a auto-oposição e a desorganização predominam, o custo do apoio político aumenta. Assim como aumentam as dificuldades para a obtenção de consensos em questões como o Marco Fiscal, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Reforma Tributária, entre outras.
Os ventos contrários podem até mesmo ajudar o bom navegador. Para tal, a leitura adequada do momento é crítica. Não é o que ocorre nos dias de hoje. Vemos idas e vindas nas narrativas e nas atitudes, projetando uma imagem confusa. Existe uma clara incompatibilidade entre o hardware político do governo e o software do exercício cotidiano do poder na política atual. Para o governo Lula ter sucesso, será essencial organizar suas narrativas e sua ação política. Contendo radicais e, sobretudo, fazendo a leitura adequada do momento político.
Publicado em VEJA de 3 de maio de 2023, edição nº 2839