Hoje, ao contrário de 2018, há uma narrativa antipolarização que está se esvaindo por falta de voz. Ou seja, existe agora um eleitorado que, mesmo fragmentado e sem um nome que o represente, acredita haver uma opção além do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do ex-presidente Lula (PT), pré-candidatos que lideram a polarização. Ao mesmo tempo, porém, a terceira via ainda não conseguiu se materializar em um candidato ou em uma agenda propositiva. Um aspecto que atrapalha essa construção é a ausência de um entendimento interno entre os partidos que se propõem a construir essa via alternativa.
Como consequência, o candidato da terceira via, que poderia surgir da aliança entre PSDB, MDB e União Brasil, entre outros, precisará gerenciar várias divisões internas. O PSDB, independentemente de quem vença a batalha no ninho tucano — João Doria ou Eduardo Leite —, sairá dividido do processo. O MDB, por ser historicamente uma legenda mais regional do que nacional, já estará naturalmente fragmentado, enquanto o União Brasil terá dificuldades para conciliar os interesses das alas do ex-PSL e do ex-DEM.
A pergunta essencial é a seguinte: se a terceira via tem um eleitorado em potencial, por que ele não se manifesta em favor de um candidato que, digamos, poderia ter nos dias de hoje uns 15% da preferência? Tal porcentagem seria resultado da soma dos que escolhem outros candidatos, fora da polarização, ou que não têm candidatos. A pergunta fica sem resposta, visto que, no limite, existe o eleitorado e existem vários candidatos disponíveis. Mas nada acontece. Por que não deu “match”? Duas direções se apresentam para a terceira via, ambas difíceis.
“O processo eleitoral tem sido dirigido pela rejeição, mas a partir de maio o debate será mais consequente”
A primeira seria um arranjo top down das legendas em torno de um candidato. Há quem queira um arranjo desse tipo tendo Eduardo Leite como líder da coligação PSDB-União Brasil-MDB. Resta saber como colocar de pé tal arranjo deixando João Doria pelo meio do caminho. A outra direção implicaria que algum dos candidatos da terceira via — hoje limitados a três nomes: João Doria, Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) — começasse a se descolar nas pesquisas de intenção de voto e a empolgar o eleitorado.
Existem movimentações sub-reptícias e discretas a partir da crença de que será competitivo qualquer nome que obtenha o apoio de três ou quatro dos partidos de centro — a saber: PSDB, União, MDB e PSD. Desde que, evidentemente, o seu nome não tenha sido manchado pela Lava-Jato. E desde que se trate de uma candidatura ágil e agressiva o suficiente para desconstruir os pontos fracos dos demais candidatos.
Em 2018, a essa altura dos acontecimentos, a polarização estava praticamente dada. Hoje, temos parcela do antibolsonarismo abrigada no lulismo, mas sem a convicção de que ele seja a opção adequada. Outros vão para o bolsonarismo por convicção. Alguns vão por horror ao petismo. Até agora o processo tem sido dirigido pela rejeição. Porém a eleição será em dois turnos e, a partir de maio, o debate passa a ser mais consequente. Os resultados das pesquisas de hoje podem não ser os que vão prevalecer adiante.
Publicado em VEJA de 13 de abril de 2022, edição nº 2784