A poucos dias da abertura dos portões do The Town, em São Paulo, que acontece entre os dias 2 e 10 de setembro, VEJA conversou com o criador do evento, o empresário Roberto Medina, também “pai” do Rock in Rio, que extrapolou as fronteiras do Rio de Janeiro para ganhar edições em Portugal e nos Estados Unidos. No bate-papo, Medina revelou as diferenças entre fazer um grande evento no Rio e em São Paulo, falou sobre os investimentos milionários feitos no autódromo, e também do Lollapalooza, festival que a partir do ano que vem será tocado pela Rock World — empresa da qual Medina é presidente. Confira a seguir os principais trechos:
Quais são as diferenças entre fazer o Rock in Rio e o The Town, em São Paulo? Acho que não tem grandes diferenças. Algumas coisas em São Paulo são diferentes. É uma cidade com prestação de serviço muito mais sofisticada, fruto de ser uma capital de negócios latino-americanos. É também uma potência financeira que o Rio não é. Em São Paulo, nós tínhamos um problema de transporte que o The Town trará como benefício para todos os outros eventos. Vai ter trem 24 horas que barateia o preço para chegar e sair. Convencemos a prefeitura de que era importante dotar o autódromo de toda sofisticação de projeto de primeira linha. Falo de esgoto com banheiro de verdade. Antes, eram banheiros químicos. Nem no primeiro Rock in Rio eu fiz com banheiro químico. Vai ter grama artificial com drenagem do terreno e nenhuma tubulação ou fiação exposta. Tem uma complexidade não só estética na Cidade da Música [maneira como o Autódromo está sendo chamado pelo The Town], mas também na operação. É uma coisa que beneficiará profundamente os eventos que virão pela frente, que a gente fará ou que outros vão fazer. Vejo tudo isso com muita humildade, logo na primeira edição deixar um legado para outros eventos. O sarrafo está mais alto.
The Town terá um line-up de ritmos musicais muito diverso, com artistas de trap, por exemplo. Para além da popularidade do trap, que critérios são usados para a escolha dos artistas? A diversidade do Rock in Rio, e agora do The Town, é uma coisa interessante. Tem uma lenda lá atrás que era muito comum ouvir: “Ah, mas o Rock in Rio era mais rock quando começou. Agora é pop. É isso, é aquilo”. Nunca foi mais rock. Rock in Rio nasce com um espírito transversal porque já nasce pensando em se viabilizar para 1,5 milhão de pessoas. Eu não poderia falar com nicho nenhum. Tinha que ser transversal do ponto de vista de idade e faixa etária. Eu tinha que ser transversal também na entrega da música. As tribos tinham que estar ali naquele evento. O Rock in Rio começou com jazz, com Al Jarreau e George Benson, com country music, com James Taylor, com forró, axé, new-wave, heavy metal, pop e rock. Essa era a proposta. O rock era uma bandeira que acolhia os diversos estilos musicais. Sempre foi assim e continua sendo.
The Town investiu 300 milhões de reais em infraestrutura no Autódromo de Interlagos. Até então, nenhum outro evento havia investido tanto. Qual foi a razão desse investimento? São Paulo é o maior mercado da América Latina. Durante muitos anos, os governos de São Paulo, prefeitura, e tal, me chamavam para fazer um Rock in Rio em São Paulo e eu não achava que estava preparado para isso. Eu queria levar a nossa bandeira para fora do Brasil. E levei. Cerca de 50% da minha comunicação em Portugal, Espanha e Estados Unidos era para vender o Brasil e o Rio de Janeiro. Não quero mais fazer eventos fora do Brasil. Quero me concentrar no Brasil. Disse para Bruno Covas que se, São Paulo pudesse fazer a infraestrutura do Autódromo, eu viria. Era um desafio. O Bruno, agora com o prefeito Ricardo Nunes, compraram a ideia. Estou entregando mais do que prometi a eles. Isso aqui não tem nada a ver só com festival de música. No Rock in Rio, 60% das pessoas que vão ao evento são de fora do Rio. São Paulo tem uma participação de 20% lá. Mas, aqui no The Town, 80% são de São Paulo, da cidade ou do interior, então, essas pessoas vão viver uma coisa nova porque a referência deles é outra.
O senhor é presidente da Rock World, empresa que assumiu o Lollapalooza a partir do próximo ano, que também ocorrerá no Autódromo. De que maneira o Lollapalooza e o The Town se beneficiarão mutuamente a partir de agora? Sim, a nossa empresa assumirá a produção e a entrega do Lollapalooza, que se beneficiará da infraestrutura do The Town. O festival usufruirá do transporte, da entrada diferente que agora está mais perto da estação de trem, da grama sintética, dos cabos enterrados, das torres de som. No mais, eles têm uma experiência em São Paulo e no mundo exitosa. Vamos tentar do ponto de vista de produção dar ainda mais brilho ao que já é feito.
The Town começou a vender ingressos antes mesmo de anunciar as atrações, tal como já ocorre no Rock in Rio. Na sua opinião, o interesse do público no festival vai além das atrações musicais? A primeira vez que fiz essa experiência de vender antes, não sabia se iria dar certo. E deu certo. Realmente, no Rock in Rio, cerca de 210.000 pessoas retornam todos os anos. Então, você tem um total de 750.000 pessoas nos sete dias de evento, mas já sabe que 210.000 vão comprar independentemente de quem está cantando. O Rio de Janeiro compreendeu essa coisa. Agora, eu achava que em São Paulo não iria acontecer essa pré-venda que a gente faz. E aconteceu também. Superou as minhas expectativas. Meu sonho é fazer um The Town com sete dias, como é o Rock in Rio. Talvez no próximo ano, já façamos seis dias. Isso não depende só de uma decisão minha, é preciso analisar, mas eu acho que no próximo vai faltar espaço para a gente receber os visitantes.
O senhor já disse que trazer o Bruno Mars, que fará shows em dois dias do The Town, sempre foi um sonho. Por quê? Quando fiz o show dele em Las Vegas, eu achei impressionante o que ele faz ao vivo. Para mim, hoje, é o melhor show do mundo. Tentei trazer para o último Rock in Rio e não consegui. Eu tinha essa meta. Pela qualidade e capacidade que ele tem, se tivesse quatro ou cinco dias, ele venderia tudo também. Eu achava que, para o primeiro evento, eu precisava de um grande nome. Ele é um deles. Para mim, é o maior e o melhor show que eu já vi.
Trazer Roberto Carlos para o The Town ou Rock in Rio ainda é um sonho que planeja realizar? É uma coisa antiga. Gosto muito dele, mas não consegui convencê-lo. Já consegui convencer o Frank Sinatra a vir aqui para o Brasil e não o Roberto. Acho que o Roberto não se sente confortável nem seguro. Mas eu vou perseguir ele sempre.
O senhor diz acreditar no Brasil. O que nos difere dos outros países onde já atuou? Eu poderia viver em qualquer lugar do mundo. Vivi onze anos em outros países e isso só aumentou a minha convicção de que meu lugar é aqui, com todas as dificuldades que temos. Por causa dessas dificuldades, vimos surgir um grupo de elite empresarial e profissional extremamente superior aos dos mercados mais desenvolvidos, tanto europeu quanto americano. O Brasil pode se orgulhar de dizer que produzimos os melhores eventos de entretenimento do mundo. Essa cultura foi feita aqui, por brasileiros, e exportamos. Sou muito agradecido a Deus por ter sido generoso na minha caminhada.