Se as opiniões sobre a cantora Lana Del Rey estão longe de ser uma unanimidade, entre os jovens talentos da Geração Z, que tomaram as paradas e premiações nos últimos anos, a americana de 37 anos reina de forma absoluta. Billie Eilish afirmou que Lana “pavimentou o caminho para todos, mudou o jeito que a indústria musical escuta e enxerga música e transformou a maneira com que as pessoas cantam”. Ano passado, Olivia Rodrigo entregou à cantora o prêmio de “visionária” da Billboard e não poupou láureas: “Ela criou uma geração inteira de aficionados por música e compositores como eu”. As razões que fazem da cantora de semblante triste e voz profunda uma sensação entre os jovens se conecta com angústias típicas da faixa etária — e das peculiaridades de ser um jovem abarrotado de informações e referências na era das redes sociais.
Em seu nono disco, lançado na sexta-feira, 24, Did You Know That There’s a Tunnel Under Ocean Blvd, Lana se aventura em mais uma epopeia por símbolos e contradições americanas, um marca de sua carreira desde o clipe Video Games e a bandeira dos Estados Unidos em relevo. Na contramão das tendências juvenis do mercado fonográfico atual, Lana gosta de explorar a estética do país para criar a persona da vez: uma heroína por vezes trágica, por vezes esperançosa, ancorada em símbolos de outrora, adornada por cigarros e flores, ambígua e, portanto, arriscada. Mesmo com referências tão locais, suas críticas e nostalgia triste de um tempo que a própria nem viveu, fazem sucesso pelo mundo, inclusive no Brasil: ela retorna ao país para shows nos dias 27 de maio, no Rio de Janeiro, e 3 de junho em São Paulo.
Por que alguém tão aparentemente saudosista reverberaria com uma nova geração? Das muitas respostas, uma: a juventude de Lana é carregada não de frescor alegre, mas do tabu de sua efemeridade — e da velha melancolia que os adolescentes adoram. Seja na alegoria literária da morte ou na decadência de culturas e seus ícones, ela cria um funeral particular do passado e de sonhos que se revelaram ilusões.
A prosa de Del Rey, contudo, não é reacionária, e (em seus bons momentos) nem literal. Posicionada no limiar que divide passado e presente, em algum plano entre Woodstock e Coachella, ela reconhece e pensa a atualidade, escrevendo sobre florestas em chamas, discussões fervorosas da internet, músicos de hoje em dia e seu próprio lugar na sociedade. No álbum Blue Banisters, esse equilíbrio é ilustrado pelo interlúdio The Trio, uma espécie de remix que utiliza a música Il Triello, de Ennio Morricone (para a trilha do clássico faroeste Três Homens em Conflito) como base para uma batida hip hop. Já no segundo single de Did You Know…, a faixa A&W, a espirituosidade é replicada em sete minutos sísmicos que começam com a jornada de uma prostituta americana e deságuam em cantiga popular.
Esse pé no passado e no presente faz dela ainda referência para a velha guarda. Courtney Love, por exemplo, afirmou que Lana seria o “único gênio musical” que conheceu além de Kurt Cobain. Outra admiradora famosa, a cantora alemã Kim Petras, foi mais simples e direta ao conhecer a artista: “Todas as pessoas descoladas só escutam a sua música, qualquer artista descolado também. Você é a rainha deles.” A magia de Lana pode ser inexplicável para muita gente: e talvez por essa razão ela triunfe entre os descolados — e deslocados.