Em 1985, Ney Matogrosso fez história na primeira edição do Rock in Rio, sendo o primeiro artista a se apresentar no festival. Quase quatro décadas mais tarde, o artista também marcou o line-up do primeiro fim de semana do paulistano The Town, com duas apresentações — e mostrando que, aos 82 anos, ainda tem o mesmo vigor para dominar os palcos. No domingo, 3, após seu show na nova Cidade da Música (maneira como o Autódromo de Interlagos está sendo chamado durante o festival), Ney Matogrosso falou a VEJA sobre 1985, a apresentação na chuva e os jovens artistas brasileiros:
O senhor foi o primeiro artista a se apresentar no Rock in Rio em 1985. Que recordações guarda daquele momento? No Rock in Rio eram mais de 100.000 pessoas. Foi a primeira vez que encarei uma multidão daquela proporção. Eu nunca havia visto aquilo no Brasil. Inaugurou um tempo diferente, que hoje é comum. Depois que acabou a pandemia, já fiz vários festivais, e todos com muita gente.
O senhor chegou a sofrer um ataque no show de 1985. Como encarou aquela situação? Sim. Foi porque me escalaram em um dia um pouco errado: era a noite dos metaleiros. Claro que eles estranharam. Eu vestindo só uma tanguinha de onça e cantando MPB. Mas o alvoroço não foi na plateia inteira, deve ter sido na primeira fileira. Alguns metaleiros tinham levado ovos cozidos para comer e jogaram em mim. Mas eu só chutava de volta neles e pronto. Não teve trauma. Vou esquentar? Sofrer por causa disso? Não.
Sua primeira apresentação no The Town, no sábado, 2, foi após uma forte chuva. Todo o equipamento foi trazido para trás porque estava molhando tudo. Então, fiz um show muito mais distante do público do que no domingo. Antes disso, caiu uma tempestade muito forte, mas quem pegou isso foram o Criolo e o Marcelo D2. Quando entrei, já era um chuvisco. Tinha poça d’água para todo lado do palco, então andei cautelosamente porque já tinham me avisado que estava escorregando muito. Mas não me afetou em nada.
Há muitos artistas jovens marcando o line-up do festival. Na sua visão, o que eles trazem para a música brasileira atual? Acho que a gente tem de ser receptivo às pessoas que chegam. Conheci o MC Cabelinho e o Matuê, achei os dois uma gracinha, simpatizei de cara. Eles me trataram muito bem, e eu tratei eles muito bem também. Não tenho esse tipo de pensamento como “ah, o antigo é que era bom”. Essa história de tocar em rádio, por exemplo, eu já desisti. Nem penso mais nisso.
Por quê? Antigamente eu aparecia muito no rádio, agora bem menos. Houve um momento em que fiquei pensativo com relação a isso, mas hoje em dia não sou mais. Está tudo certo. Continuo trabalhando, tenho minha vida. Se eu fosse achar que dependia de alguém ou de alguma coisa, não tocaria meu barco. Sou Independente Futebol Clube em todos os sentidos.
O documentário Primavera nos Dentes, que narra a história dos Secos & Molhados, enfrentou uma batalha judicial para a liberação de músicas do grupo e venceu. Como avaliou essa disputa? As canções são essenciais, sim. Agora a lei já determinou que vai ter as músicas. Não pode ser vetado. Assim como não pode ser proibido que falem da sua vida, por exemplo. Sobre mim, já fizeram uma peça de teatro, três livros, estão fazendo um filme… E eu não posso dizer não. E agora existe uma lei que, se você é uma pessoa pública, digamos, você não pode impedir.