Para uma geração ligada em tecnologia em fins do século XIX, com a industrialização a toda, a torre que brotou no cenário parisiense era um símbolo da engenhosidade humana. Em 1889, um século depois da Revolução Francesa não deixar tijolo sobre tijolo, as treliças da construção posta de pé para celebrar a efeméride tinha o propósito de mostrar ao mundo como o país detinha riqueza, conhecimento e l’esprit du temps para erguer a estrutura mais alta do planeta.
Era puro exibicionismo de uma superpotência, um monumento que desagradou muita gente. Achavam que aquilo era tudo, menos Paris. Entrou para o folclore local, inclusive, o caso do escritor Guy de Maupassant (1850-1893), que dizia almoçar num restaurante bem ali ao lado só para não correr o risco de esbarrar os olhos na “monstruosidade”, que assim sumiria de sua vista.
Era para ser estrutura provisória, porta de entrada da Exposição Universal em que compareceram dezenas de países, mas acabou vingando porque os parisienses aceitaram aquilo, e até gostaram depois. Agora, na Olimpíada, a estrutura de 324 metros de altura (equivalente a um edifício de 101 andares, ainda o maior de Paris) serve de moldura à quadra onde é disputado o vôlei de praia, modalidade em que o Brasil pode se sair bem.
A dupla Ana Patrícia e Duda (número 1 no ranking mundial) segue entre as favoritas ao ouro, e Carol Solberg e Bárbara Seixas também duelam pelo pódio, assim como André e George (número 2 na ala masculina) e Arthur e Leandro. Próximo dali, outra arena abriga judô, luta livre e luta greco-romana. Tudo no Champs de Mars, de onde se avista o Palais des Invalides, onde repousa o túmulo de Napoleão.
Pirâmide do Egito, que nada
Conhecido construtor de pontes, Gustave Eiffel (1832-1923) enfrentou uma concorrência que envolveu uma centena de projetos. Ganhou por apresentar um desenho acrescido de uma profusão de cálculos e detalhes, em contraste com umas ideias mais vagas, e pela ambição de ultrapassar em altura as pirâmides do Egito.
Eiffel não foi só o autor do esboço, mas supervisionou tudo – até os momentos mais sombrios em que as estacas da fundação ameaçavam afundar no solo úmido. Segundo contam, tirou dinheiro do próprio bolso para a obra. Em dois anos e dois meses, dentro do prazo, a torre estava entregue. Foi quando Eiffel escalou seu 1710 degraus e fincou a bandeira da França no topo.
Mesmo digerida por muito francês que antes lhe torcia o nariz, a Torre Eiffel seguia sem uso e, onerosa para ser mantida de pé, pensaram em demoli-la. Era o começo do século XX e, em 1901, Santos Dumont pilotaria o dirigível que a circundou. Eis que as autoridades perceberam nela uma utilidade: com aquela altura toda, poderia receber antenas para a transmissão de rádio – as mesmas que, na Primeira Guerra, interceptaram a comunicação dos inimigos.
Acabou se convertendo no cartão-postal mais visitado do mundo, de onde se vislumbram tantos outros. O segundo andar é o que proporciona maior visibilidade e até alcança uma curiosidade – mais ao longe, no Sena, vê-se plantada, sobre uma ilha, uma pequena Estátua da Liberdade, miniatura daquela que a França presenteou a Nova York. Detalhe: o intrincado design dos suportes internos é do mesmo Eiffel.
Tinta que não acaba mais
Para os Jogos, a pintura, refeita a cada sete anos e que já teve variadas colorações, está tinindo. Ganhou o dourado de que Eiffel tanto gostava ao custo de 320 milhões de reais, obra que começou em 2019 e envolveu 60 toneladas de tinta para cobrir as 18 000 treliças que formam o conjunto.
A organização garante, aliás, que todas as 5 084 medalhas distribuídas nesses dias contêm um pedaço do ferro original da torre, removidos em reformas ao longo do século XX. Os aneis olímpicos agora dominam a fachada. Mesmo que Maupassant não quisesse vê-los, não teria muita escapatória.