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Reinaldo Azevedo

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Beltrame ficou na hora errada e pede para sair na hora errada. Ou: Crônica de um desastre anunciado

Ninguém inventou remédio melhor para conter o crime do que meter bandido na cadeia; no Rio, viveu-se o sonho da integração com criminosos

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 30 jul 2020, 21h36 - Publicado em 11 out 2016, 17h32
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    José Mariano Beltrame, secretário de Segurança Pública do Rio, pediu demissão no dia seguinte a um tiroteio entre traficantes dos morros Pavão-Pavãozinho e Cantagalo, o que levou o pânico a parte de Ipanema e Copacabana. Secretário há dez anos, eu diria que ele escolheu ficar na hora errada e decide sair numa hora mais errada ainda. Com todas as vênias ao ainda secretário, deixar o posto agora chega a ser covardia. Como disse a Capitania dos Portos ao comandante do navio Costa Concordia, digo a Beltrame: “Vada a bordo, cazzo!”.

    Poucas posturas que assumi na vida profissional me renderam tantos ataques como as críticas que eu fazia, de maneira sistemática, à política de segurança do Rio. Esta me parecia, e eu estava certo, essencialmente errada. Aquilo a que se chamava “política de pacificação” — o que foi parar no nome das unidades de segurança instaladas nos morros: UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) — trazia já um erro de concepção, que, no entanto, faz um sucesso danado com as esquerdas da Zona Sul: a ideia de que se pode estabelecer uma pax, um pacto, com os bandidos.

    Pode? Enquanto se faz o jogo deles, é bem possível. Alguns nomes coroados do crime foram presos ou mortos na gestão de Beltrame, mas é sabido que uma das características da tal “política de pacificação” parte do princípio de que prender bandidos corresponde a aumentar o problema. Eles teriam de ser absorvidos pela sociedade como um dado da paisagem. Daí que as unidades pacificadoras fossem sendo instaladas para, atenção!, conviver com o tráfico e o crime organizado, não para combatê-lo. Desde que a ação fosse moderada, e os bandidos, discretos. Era proibido posar de arma na mão para sair no Jornal Nacional.

    A cada pouco, como num seriado do Netflix, a gente via a UPP chegar, com data, hora marcada e ampla cobertura da imprensa. O grande orgulho: não era preciso dar um tiro. Até o símbolo de um desastre virou emblema de um suposto sucesso: a fuga em massa de traficantes da Vila Cruzeiro. Razão do aplauso: eles estavam deixando a região. Os entusiastas só se esqueceram de lembrar que estavam indo para outro lugar.

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    A taxa de homicídios por 100 mil habitantes caiu, sim, na gestão Beltrame. É preciso verificar até onde isso decorre de uma espécie de pacto informal com a bandidagem, que acabou sendo, obviamente, rompido. Em 2006, houve 41,3 mortos por 100 mil habitantes no Estado; em 2015, 25,4. Os dados são do Instituto de Segurança Pública. Para comparar: a taxa de São Paulo é inferior à metade.

    De todo modo, a “paz” com a bandidagem viveu o seu período de relativa lua de mel. Mas o capeta sempre cobra um preço, não é? Aos poucos, os bandidos que haviam se acomodado com a presença da polícia começaram a se incomodar. As escaramuças foram crescendo. E se instaurou de novo a guerra. A razão é simples: os soldados do crime estavam soltos. Não há mágica nessas coisas: lugar de bandido é na cadeia.

    O modelo está em crise faz tempo. O Rio não tinha quebrado ainda em 2014, e o ano terminou com 101 policiais feridos e 8 mortos nas áreas das UPPs, informa https://gutenberg.veja.abril.com.br/brasil/secretario-de-seguranca-do-rio-entrega-carta-de-demissao/ VEJA.com. Só neste ano, já são 131, com 11 mortes.

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    Pra começo de conversa, a polícia do Rio precisa prender mais. Não quero chocar almas sensíveis, mas lugar de bandido é na cadeia e não estrelando filme de subintelectual da Zona Sul ou dando lição de moral em entrevista, com o rosto coberto, como se fosse um herói dos oprimidos.

    Com esse parágrafo-cajadada, acerto dois coelhos: a polícia do Rio, em razão de sua política de segurança, prende pouco. A relação é direta: mais bandido solto, mais crime. E o clima de tolerância, vamos dizer, cultural com a marginalidade que se experimenta em certas áreas da cidade, especialmente aquelas que têm o bolso no asfalto, mas “a alma” no morro. Essa turma imagina que tudo termina num “esquenta”.

    Até na linguagem, convenham, há um esforço de não se reconhecer a fealdade das coisas. Já repararam que, no Rio, não existe “favela”? Isso é coisa de São Paulo. Por lá, fala-se em “comunidade” — uma comunidade onde os comuns se matam e morrem sem muita solenidade.

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    Beltrame teria de ficar até passar o pior da crise. Depois, tem de sair. E o governo do Rio precisa decidir qual é a tarefa do novo secretário: garantir a segurança dos cidadãos, combatendo o crime, ou selar a paz com os bandidos.

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