Vestida como um palhaço, Allana Grolli, de 37 anos, protestava contra o governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori (PMDB) na manhã desta terça, em frente ao Palácio Piratini. Usando peruca colorida, fantasia e rosto pintado, a servidora estadual reclamava dos sucessivos parcelamentos de salários dos funcionários do Executivo – trabalhadores do Judiciário e Legislativo recebem normalmente. “A situação que o governo impôs nos faz de palhaços”, justificou a servidora, que viajou 389 km durante a madrugada, de Três Passos até Porto Alegre, para reivindicar seu pagamento.
Este é o vigésimo mês de parcelamentos de salários em 31 meses da gestão Sartori. A primeira parcela referente a julho foi depositada no último dia 31, no valor de 650 reais. A quantia é inferior até mesmo ao salário mínimo, que hoje vale 937 reais.
Por isso, aos gritos de “Fora, Sartori”, Grolli acompanhava os milhares de professores que decidiram nesta terça que a categoria entrará em greve. A assembleia extraordinária do Cpers (Sindicato dos Professores do RS) para decidir sobre a paralisação ganhou ares de protesto contra o governador. Professores viajaram de cidades como Bagé, São Gabriel, Carazinho, São José do Norte e Caxias do Sul para aderir ao ato.
Os professores farão nova assembleia na sexta-feira para decidirem se a greve será continuada. O Rio Grande do Sul possui cerca de 72.000 professores na rede estadual, distribuídos em 2.500 escolas.
Calote na dívida
Para se antecipar aos protestos dos servidores, o governo gaúcho anunciou na segunda-feira que vai dar calote na dívida com a União neste mês para pagar os salários. O estado deixará de pagar a parcela de cerca de 140 milhões de reais ao governo federal. Esse valor será usado para quitar mais uma parcela salarial para os servidores, no valor de 450 reais, depositada nesta terça.
Para evitar que as contas estaduais sejam bloqueadas como punição, o estado protocolou uma medida cautelar junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que as prestações não sejam cobradas, que as contas não sejam bloqueadas e que o estado não seja inscrito nos cadastros de inadimplentes.
O Rio Grande do Sul deve R$ 55 bilhões, mas já pagou mais de 25 bilhões de reais de uma dívida inicial de 9 bilhões de reais. O débito surgiu em 1998, firmada pelo ex-governador Antônio Britto (PMDB). Assim como Britto, Sartori também pretende pedir empréstimo federal para tirar o estado do sufoco. Seus opositores, entretanto, discordam da medida por temerem que uma nova dívida impagável seja criada. A Fundação de Economia e Estatística (FEE) concluiu que a dívida atual poderia diminuir em 21 bilhões de reais se o índice de correção fosse revisto.
Crise nas finanças
Prestes a entrar no último ano de governo, Sartori enfrenta uma grave crise financeira. A Secretaria da Fazenda calcula um rombo de 3 bilhões de reais nas suas contas em 2017. Até o próximo ano, a pasta estima que faltarão 8,5 bilhões de reais em caixa. Em 2016, o governo calculava um déficit de 2 bilhões de reais, mas o resultado negativo foi bem menor, de 143,1 milhões de reais.
Deputados da oposição alegam que as isenções fiscais dadas pelo governo às empresas, no valor de 9 bilhões de reais, cobririam o rombo. A Justiça determinou que o estado divulgue as empresas beneficiadas e a respectiva quantia, mas a gestão Sartori descumpre a decisão, alegando sigilo fiscal das partes.
Para recuperar 250 milhões de reais em ICMS sonegado, o secretário da Fazenda, Giovani Feltes, apresentou ao Ministério Público (MP) representação contra 120 empresas devedoras, no final de junho. Deputados da oposição também apontam que se o governo federal pagasse os 40 bilhões de reais devidos pela Lei Kandir (que isenta a tributação da exportação de produtos primários), o déficit gaúcho estaria resolvido.