Sartori (MDB): ‘Mesmo com essa situação, não desamparamos ninguém’
Governador gaúcho que tenta a reeleição é o último entrevistado nesta série de VEJA com os candidatos ao Piratini
Atual governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori (MDB) tentará a reeleição em outubro. Sartori foi prefeito de Caxias do Sul em duas gestões (2005-2013), cidade onde foi eleito pela primeira vez em 1977, para o cargo de vereador. Depois foi deputado estadual e federal. Agora, o emedebista deseja mais um mandato para realizar a sua prioridade: assinar o regime de recuperação fiscal com a União. O regime prevê três anos sem pagar a dívida e exige, como contrapartida, privatização ou federalização de estatais gaúchas.
“Para nós, este é o plano. Se os outros tiverem algum plano melhor que este, eu serei o primeiro a apoiar”, disse o governador sobre o regime. Sobre a política nacional e o envolvimento do MDB, seu partido, e o PT, legendas do atual e dos ex-presidentes, em escândalos de corrupção, Sartori disse que “os partidos ficaram todos iguais”. “Em um passado não muito distante, todo mundo dizia que era honesto, sério, responsável e, de repente, praticaram atos piores do que aqueles que condenavam nos outros”, falou.
Sartori é o último entrevistado nesta série de VEJA com os candidatos ao Piratini. Foram entrevistados também, em ordem alfabética, Eduardo Leite (PSDB), Jairo Jorge (PDT), Julio Flores (PSTU), Mateus Bandeira (Novo), Miguel Rossetto (PT) e Roberto Robaina (Psol). Paulo Medeiros (PCO) ainda não havia divulgado candidatura quando as entrevistas foram realizadas. Abaixo, a entrevista de Sartori e fotos de arquivo pessoal selecionadas por sua equipe a pedido de VEJA.
Data de nascimento: 25/02/1948
Naturalidade: Farroupilha
Estado civil: casado
Filhos: dois
Formação: Filosofia pela Universidade de Caxias do Sul (UCS)
Profissão: professor
Histórico de filiação partidária: MDB, desde 1974
Por que o senhor quer ser governador mais uma vez?
Na verdade, todo mundo sabe que eu resisti para ser candidato. Em todos momentos, tanto eu como o Cairoli [Paulo Cairoli, vice-governador] tínhamos uma inspiração de achar que, diante das dificuldades financeiras do Rio Grande do Sul, deveria ter um norte de aproximação de todas as tendências ou de todas as organizações do estado. Porque todo mundo já foi governo e todos poderão, no tempo e curso da história, ter essa oportunidade de novo. Tanto é verdade que fomos os últimos a aparecer nesse cenário eleitoral gaúcho. Mesmo que não fosse um desejo, é uma missão. Aquilo que nós começamos a plantar desde janeiro de 2015, arrumando a casa, tomando atitudes e fazendo aquilo que se podia fazer, vamos dar continuidade investindo na mudança da estrutura do estado e criar as condições de superação dessas dificuldades.
O senhor chegou a pensar em não tentar a reeleição?
Como eu disse antes, no começo, nós não achávamos que desejávamos isso. Mas a insistência foi tanta, o controle, a vida foi no sentido de viabilizar isso. Em nenhum momento a gente desiste de luta. Quem me conhece já sabe como eu sou, tenho 42 anos de vida pública. Fiz as coisas que achei que tinha que fazer dentro da hombridade, da honestidade, da seriedade, mantendo aquilo que sempre aprendi: ser igual em todos os momentos, com simplicidade, com humildade. É aquilo que eu disse na campanha de 2014: continuar fazendo o que precisa ser feito.
Caso o senhor vença, seria o primeiro governador reeleito no Rio Grande do Sul no período democrático.
Isso não está na nossa cabeça. Nossa cabeça está em defender o nosso projeto, aquilo que fizemos até aqui. A gente não olha para essas coisas porque seria uma coisa de vaidade ou de qualquer outra questão. Acima de tudo, é cumprir nosso papel de cidadão e de olhar para frente e ver que tem muita coisa para fazer ainda. Para que o estado olhe para a sociedade, perceba o que a sociedade precisa. Mesmo com todas as dificuldades nacionais do cenário econômico degradado, com recessão econômica que bate em todos os lugares e tem gente que desconhece, que não soube, na hora oportuna, combater o processo inflacionário e nem ter estabilidade econômica, que gerou todo esse desconforto nacional.
Qual é o balanço que o senhor faz desses quatro anos de governo?
Nós assumimos um estado que tinha perspectiva e projeção de ter 25,5 bilhões de reais de déficit no final de 2018. Nós vamos chegar a ter um déficit em torno de 8 bilhões ou 9 bilhões de reais. O que significa, a grosso modo, que quase dois terços desse déficit foi superado com medidas amargas, com controle, com eficiência, fazendo o processo de gestão com um bom planejamento. É um caminho que vai pertencer a todos. Tivemos algumas conquistas, conseguimos renegociar, inclusive com quem nós disputamos em 2014, republicanamente. Renegociamos a dívida, agora os juros da dívida com a União são menores, com alongamento de 20 anos. Criamos condições também para que, em 2028, a dívida com a União tenha um rebaixamento de 22 bilhões de reais. Fizemos medidas para preparar o terreno para o futuro. A lei de previdência complementar, a lei de responsabilidade fiscal estadual, a única do país, que diz que eu não posso deixar para o próximo governante nenhum reajuste. Fizemos três orçamentos realistas e criamos as condições para que a única prioridade fosse a segurança, com 19% do orçamento em 2017 e, em 2018, mais 16%. Na área de segurança chamamos todos os concursados e abrimos um novo concurso para 6.100 vagas. Cumprimos todos os reajustes que foram estabelecidos em 2014.
Para um próximo governo, qual é a prioridade do senhor?
Dar continuidade a esse processo. Agora tem a discussão do plano de regime de recuperação fiscal [oferecido pela União mediante contrapartidas]. Estamos brigando para ter, pelo menos, um pré-acordo para que se tenha as possibilidades de avançar nessa direção. O regime de recuperação fiscal representa permanecer no Rio Grande do Sul, em três anos, 11,3 bilhões de reais que não irão para os cofres do governo federal. Além disso, federalizar ou privatizar aquilo que já encaminhamos para a Assembleia ainda em 2016: CEEE [companha de energia elétrica], CRM [mineração] e Sulgás [gás natural]. Estamos trabalhando para que o estado se torne cada vez mais eficiente, mais sustentável e com condições de atender as áreas que a população mais precisa, que são a educação, a saúde, a segurança, a infraestrutura e as políticas sociais, que atendem a maioria das pessoas que têm mais necessidade.
O senhor é bastante criticado pro causa do parcelamento dos salários servidores do Executivo [Legislativo e Judiciário recebem normalmente]. Se o senhor for eleito, vai ser um compromisso pagar em dia?
Sei que é triste demais. Sei o quanto é difícil para um pai de família, para uma mãe de família, não receber em dia. Mas, mesmo assim, nós nunca deixamos de pagar dentro do mês. No máximo, pagamos no quinto dia útil. Embora toda a iniciativa privada pague até o quinto dia útil, às vezes a iniciativa privada também atrasa, pela realidade econômica nacional em defasagem há três, quatro anos. Além da crise de 2008, que muitos achavam que não tinha problema nenhum, que era só na Europa, só nos Estados Unidos. A gente conhecia a Grécia, mas a Grécia bateu no Brasil como um todo. No começo, com todas as ações judiciais [para pagamento em dia], elas obrigavam que o estado pagasse aquilo que tivesse de recurso para todos ao mesmo tempo, independentemente do ganho de cada um. Nós, com segurança jurídica, começamos a tomar outra atitude posteriormente. Sempre fui preocupado com isso. Até o dia que passei a ter razão e colocamos em vigor o pagamento primeiro a quem ganha menos. É muito mais justo socialmente e muito mais correto. Também decidimos que os últimos a receber seriam o governador, os secretários e os maiores salários. Mesmo que não tenhamos os maiores salários. Tem fake news por aí, que dizem que aumentei meu salário. Na verdade, eu reduzi meu salário. É igual ao que tinha o antigo governador. Acho muita maldade as pessoas dizerem uma coisa que não é real. Tenho certeza que boa parte dos servidores, quero agradecer a eles, nunca deixaram de cumprir seu papel, de atender bem a sociedade e cuidar bem das pessoas. Com certeza também foram, forçosamente, fazer um aprendizado de se organizar para não ter problema com o atraso dos recursos. Mas sempre pagamos dentro do mês, quero deixar bem claro.
Além da adesão ao regime de recuperação fiscal, quais são as outras medidas que o senhor planeja para tirar o Rio Grande do Sul da crise?
Para nós, este é o plano. Se os outros tiverem algum plano melhor que este, eu serei o primeiro a apoiar. Não tenho problema de apoiar. Precisa ter muita união e solidariedade. É uma crise que eu não criei. Não fui o criador dessa crise, nem nacionalmente nem estadualmente. Se ela existe, ela precisa ser vencida. Para nós, perseguir a adesão ao regime de recuperação fiscal é o mais viável neste momento. Isso vai ter consequências futuras. Até porque, ele vale por três anos e pode ser prorrogável por mais três anos. As outras [prioridades] são continuar arrumando a casa, fazendo o possível para investir em todas as áreas. Mesmo com as dificuldades conseguimos arrumar, manter, recuperar, 3.000 km de rodovias. Não admitimos mais que o poder público não precise fazer gestão. Tem que ter planejamento. De todo o acordo de resultados e estabelecimentos de metas, conseguimos duas coisas importantes. A primeira é que hoje não temos nenhuma consultoria. A gente não paga nada, tudo é feito pelos próprios servidores. Esse é um legado. A segunda questão é que, na última avaliação, a política que mais cumpriu e teve resultados foi a área social. Mesmo com toda essa situação, não desamparamos ninguém. O estado não pode trabalhar para si mesmo, tem que olhar para fora.
Para aderir ao regime de recuperação fiscal, o estado precisa federalizar ou privatizar a CEEE, CRM e Sulgás. No estado, a privatização precisa ser aprovada em plebiscito. Em um primeiro momento, o senhor tentou retirar a obrigatoriedade do plebiscito. Depois, tentou que ele fosse realizado juntamente com a eleição. Como o senhor pensa em fazer isso?
Colocamos essa questão em discussão em 2016. Temos que reconhecer que um plebiscito foi retirado da constituição [estadual], que foi da Companhia Estadual de Silos e Armazéns. Os outros permaneceram, depois separamos para facilitar as votações [individuais para extinguir o plebiscito para empresas específicas]. Não obtivemos êxito, mas respeito o Legislativo. Mas se o plebiscito não foi retirado da constituição, então por que não fazer o plebiscito e ouvir a população sobre o tipo de estado que ela quer? Seria durante a eleição, era só dizer sim ou não. Infelizmente, não aconteceu. Vamos encontrar maneiras. Isso poderia ter sido feito e poderíamos praticamente ter assinado o regime de recuperação fiscal. Agora, fora da eleição, o plebiscito vai custar perto de 30 milhões de reais. Se fosse feito agora, não teria esse custo.
O senhor citou as metas das áreas sociais, onde sua esposa, Maria Helena Sartori, atua como secretária de Desenvolvimento Social, Trabalho, Justiça e Direitos Humanos. O senhor convidaria Maria Helena para o próximo governo, se eleito?
É mais fácil falar com ela [risos]. A Maria Helena tem uma experiência muito grande na área, ajudou muito na prefeitura de Caxias do Sul na criação de programas e tem interlocução forte com a sociedade. A experiência dela vem junto do nosso tempo de universidade. Naquele tempo, nossa geração tinha sonhos, tinha ideal, sabia o que buscar na vida. No fundo, era melhorar a vida das pessoas. Isso é o que faz a diferença, cumprir um papel. Aquilo que a gente sonhava, lá atrás, na juventude, é o que se procura praticar nos dias de hoje.
O senhor fala em ideais. Vivemos um momento em que a política está muito desacreditada por sucessivos escândalos que atingiram praticamente todos os partidos. Como o senhor avalia o papel do MDB nesse sentido, que também tem participação nesses escândalos? O cenário é o de um ex-presidente preso, Luiz Inácio lula da Silva (PT), uma ex-presidente que sofreu impeachment, Dilma Rousseff (PT), e o presidente Michel Temer (MDB) é investigado. Qual é a avaliação do senhor?
Os partidos ficaram todos iguais. Em um passado não muito distante, todo mundo dizia que era honesto, sério, responsável e, de repente, praticaram atos piores do que aqueles que condenavam nos outros. A solidez partidária e ideológica brasileira não comporta mais termos tantos partidos. Os partidos ficaram muito iguais e, o que é pior, nas piores coisas. Mas não dá para deixar de trabalhar e construir uma nova realidade. A ausência de participação é uma maneira de cada vez mais aprofundar as dificuldades. Se o desalento existe, a desconfiança está aí, a incredulidade existe, temos que superar isso. Para que os atos de corrupção não sejam coletivos ou partidários, temos que fazer vingar uma postura de responsabilidade, da seriedade e da honestidade. Um partido tem que ter objetivos programáticos. Nós precisamos construir uma grande mudança na estrutura política, que o sistema como um todo abranja a vontade nacional.
Esse momento de descrédito político abre espaço para outsiders e figuras como o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ). Qual sua opinião política sobre ele?
Se você tem 13 candidatos a presidente, não vou entrar em consideração de uma figura ou outra. Nós também temos oito candidatos a governador. Sou daqueles que tiveram esperança de que pudéssemos trabalhar mais aproximados. Mudança e transformação não se faz sem aglutinação. Sempre dou o exemplo do Rio Grande do Sul. Mesmo no momento mais difícil da história democrática, com a existência da Arena e do MDB, eles souberam trabalhar juntos, um de oposição e outro governo, para constituir o Polo Petroquímico. As forças convergiram e hoje está o Polo, indo bem. Se não tivesse havido isso, o que seria do estado sem o Polo Petroquímico? Esses exemplos podem servir para hoje, para pensar diferente o futuro e o amanhã.
Com o ex-presidente Lula na prisão, Bolsonaro é o favorito nas pesquisas. Então, ele pode ser o presidente e o senhor, também favorito nas pesquisas, pode ser o governador. As negociações da dívida e da recuperação fiscal poderiam ser feitas com o governo de Bolsonaro. Por isso, qual sua opinião política sobre ele?
Na eleição passada, apoiamos o Eduardo Campos (PSB). Não apoiei a Dilma (PT) e o Michel Temer (MDB). Mas não me impediu de ter uma atuação republicana com o governo Dilma, ao iniciar o processo de negociação da dívida. Independentemente, as relações federativas têm que permanecer. Espero que alguém, algum dia, consiga construir um novo pacto federativo em que a federação seja de verdade.
A segurança pública é uma das áreas que mais preocupam os gaúchos. Os índices apresentaram melhoras neste ano, mas ainda assim as pessoas estão preocupadas, tanto que é um tema discutido também na eleição nacional. Qual será o plano do senhor para um possível segundo governo?
Preciso primeiro dizer o que nós fizemos. Avançamos bastante na área do orçamento, com 19% para a segurança em 2017 e 16% neste ano. Chamamos todos os concursados existentes da área de segurança, em torno de 4.300. Abrimos um concurso novo para mais 6.100 servidores na área. Criamos o Sistema Integrado dos Municípios (SIM) para videomonitoramento e para começar o cercamento eletrônico, não apenas nos municípios, mas nas rodovias. Criamos legislação que permite investimento da área privada na área de segurança com equipamento, veículos e tecnologia. Avançamos na inteligência policial. Mas não ficamos só nisso. Uma coisa é a repressão e outra é a prevenção. O melhor caminho que a gente estabeleceu é que todos programas de prevenção estão interligados, seja aquele que tem na Brigada Militar, o Proerd, seja o que tem na educação, que é o Cipave, seja o que tem lá na Secretaria de Trabalho, Justiça e Direitos Humanos, que é o Pode, de oportunidades. Na Fase e na Case, com todas as ações, colocamos nove escolas dentro da Fase. Também fizemos um acordo com o CIEE para que aqueles jovens sob o abrigo da Justiça tenham preparo para o trabalho. A gente percebeu que, de 100 que estão sendo acompanhados, 92 não retornam ao crime. A participação do secretário Cezar Schirmer no Conselho de Segurança [federal] tem levantado a questão da necessidade de ter um olhar profundo para a prevenção. Criamos também condições de mudar os presídios, com a troca de imóveis do estado [para a iniciativa privada] por novas unidades prisionais. Mas tem que ter política penitenciária. O país também precisa de uma política penitenciária que se desdobre para os estados. Tomamos uma atitude forte de transferir líderes de facções, mas estão nos mandando de volta.
Recentemente, a primeira pesquisa Ibope no estado para a eleição de outubro mostra o senhor como preferido, indo para o segundo turno, com 19% das intenções de voto, mas também mostra o senhor com a maior rejeição, 44%. Por que o senhor acha que há essa rejeição?
Porque tomamos atitudes. As palavras, os desejos, muitas vezes o vento leva. As atitudes permanecem. Tivemos coragem, atitude e enfrentamos privilégios de toda a ordem, enfrentamos aquelas coisas particularizadas e buscamos uma maneira de fazer aquilo que não tinha sido feito até hoje. Porque a única promessa que fiz foi fazer o que precisa ser feito. Com certeza, se não foi feito antes, foi feito no nosso governo. Por isso, a gente sofre um processo de rejeição ou de contrariedade. Mas enfrentamos de cabeça erguida, olhando para frente e tenho certeza que vai ser um marco positivo.
Candidatos
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