‘Army of the Dead’ revela opiniões políticas de Zack Snyder – e com zumbis
Em novo filme, diretor isentão usa elementos como crise de refugiados e um muro que isola Las Vegas e, assim, se afasta das acusações de ser “trumpista”
Militares escoltam na estrada um caminhão com uma carga misteriosa, originada da tal Área 51 – a base secreta da Força Aérea americana que movimenta teorias da conspiração das mais bizarras. Um acidente faz com que o caminhão libere sua carga: um musculoso zumbi de força descomunal e com postura que mais lembra o Exterminador do Futuro do que os monstrengos de The Walking Dead. Começa então Army of the Dead: Invasão em Las Vegas, nova extravagância do diretor Zack Snyder, que acaba de chegar à Netflix.
Tratando-se de Snyder, cineasta que transformou seu nome em grife de filmes que exalam testosterona – como 300 e vários da DC Comics, caso de O Homem de Aço e Batman vs Superman – o novo longa da plataforma de streaming é uma sanguinolenta aventura com altas doses de ironia e pontos dramáticos que exploram os altos e baixos da natureza humana.
Para além da fórmula comum ao selo Snyder, o novo filme traz referências a crises políticas e humanitárias da vida real – que, para bom entendedor, são alfinetadas satíricas do diretor a governos como o do republicano Donald Trump. Do tipo isentão – mesmo conduzindo filmes de alto teor político, como Watchmen –, Snyder chegou a ser associado ao ex-presidente americano por críticos que enxergam em sua obra um pé na extrema direita. Sobre isso, o diretor falou recentemente ao The Guardian: “Eu sou democrata. Apoio a luta das mulheres por igualdade e pelo direito de escolha. Claro, também apoio os direitos de todas as minorias. Me considero um cara bem progressista”, disse.
A declaração reforça as metáforas envoltas na trama de Army of the Dead. Quando o zumbi escapa do poder dos militares, ele sacia sua sede de sangue na cidade mais próxima: a iluminada Las Vegas. A escolha de localidade dá uma pitada de humor às cenas, com zumbis vestidos de Elvis e noivas, por exemplo. O governo então constrói muros ao redor da cidade, mantendo presos ali os mortos-vivos e, do lado de fora, cria um campo de refugiados onde estão os mais recentes desabrigados – que causam temor no restante da população pela possibilidade de estarem contaminados. Qualquer semelhança com a crise migratória atual e a divisão Estados Unidos e México não é mera coincidência.
Alguns desses ex-moradores se aliam ao protagonista Scott Ward (Dave Bautista) e um grupo de mercenários com o intuito de entrar na cidade dos zumbis, roubar 200 milhões de dólares presos no cofre de um cassino, para que possam fugir dali em segurança e em poucos dias, quando os Estados Unidos vão jogar uma bomba atômica na região. Ao entrar na zona proibida, eles se deparam não só com zumbis trôpegos e mais mortos do que vivos, mas também com um grupo de seres evoluídos e com uma organização social, mas, claro, de aparência assustadora. Mesmo com um pé na política, Snyder não perde sua veia kitsch — e, goste ou não, uma estranha criatividade para olhar a vida humana.