Jackson Lamb (Gary Oldman) costumava ser um figurão do MI5, o afamado serviço da Inteligência britânica. Após anos de trabalho, porém, entrou em baixa e foi deslocado para a missão de manter na linha um grupo de agentes desajustados chamados pejorativamente de “slow horses” — ou cavalos lentos, em bom português. A Slough House, nome oficial da subdivisão dos zero à esquerda, é formada por espiões de ficha queimadíssima, responsáveis por falhas como provocar explosões em treinamento por confundir a cor da roupa de um possível terrorista ou até esquecer documentos confidenciais em um ônibus. No ostracismo em um prédio bolorento, passam os dias em uma rotina monótona, recolhendo papeladas e fazendo tarefas de segunda classe. Inspirada nos livros de Mick Herron, a série Slow Horses é uma adição bem-vinda à tradição de thrillers de espionagem das terras de James Bond e dos best-sellers de John le Carré. Com os dois primeiros episódios disponíveis na Apple TV+, e novos saindo às sextas-feiras, a produção maneja bem a adrenalina das tramas de agentes secretos, o humor ferino tipicamente britânico — e, claro, os dotes do sempre craque em serviço Oldman.
Slow Horses: Slough House Thriller 1
Agente em campo
A iguaria que dá sabor nobre à série, no entanto, é a condição muito peculiar do proscrito, ou o modo como os humanos tentam reagir e superar a queda em desgraça. No caso de Slow Horses, o sequestro de um garoto de origem paquistanesa por supremacistas brancos é a janela de oportunidade para os pupilos que Lamb chama de “meus perdedores” provarem que têm, sim, seu valor. Os neonazistas ameaçam decapitar o refém vivo, como uma forma de defender a “pureza” da sociedade britânica. Com sua experiência, Lamb se julga apto a encontrar os sequestradores e salvar o garoto. A missão, de quebra, se revela uma chance de mostrar ao mundo, e à elite do MI5 personificada pela rival Diana Taverner (Kristin Scott Thomas), que ele não está tão fora do jogo assim.
Apesar dos lances fantasiosos e da veia cômica acentuada, a série oferece uma visão do mundo da espionagem um tanto mais realista que a média do gênero. À infalibilidade notória de personagens como o 007, Slow Horses contrapõe o inescapável fator humano: agentes de carne e osso são sujeitos a erros e, não raro, acertam o alvo por acaso. A trama traz ainda à discussão temas que intoxicam o debate público britânico atual, como a xenofobia e a imigração. Num mundo regido pelo caos, até esses agentes se revelam dignos de uma segunda chance.
Publicado em VEJA de 13 de abril de 2022, edição nº 2784
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