Foi-se o tempo em que bastava ligar a televisão na Globo, ou em um de seus canais fechados, para assistir a um jogo de futebol. Nessa semana, o ex-global Tiago Leifert anunciou que fechou contrato para narrar os jogos da Copa do Brasil na Amazon Prime Video. No total, serão quinze jogos exclusivos da plataforma narrados pelo jornalista, começando por Juventude x São Paulo nessa quarta-feira, 20. Também hoje se encerra o processo de licitação que decidirá qual será a casa da Libertadores da América, hoje do SBT, e da Sul-Americana entre 2023 a 2026. Detalhe: todos os grandes canais estão na disputa com a Globo. No caso da Copa do Brasil, a emissora ainda detém a maior parcela dos direitos do campeonato. Mas fica cada vez mais distante do domínio futebolístico que costumava ostentar. E não raro tem apanhado de goleada da concorrência no ibope.
Isso porque, com o avanço do streaming e a pulverização dos direitos de transmissão, os jogos de futebol têm se espalhado cada vez mais entre TV e internet, dando a outras emissoras uma arma poderosa na luta contra o conglomerado da família Marinho. Exemplo fatídico dessa tendência foi a final do Campeonato Paulista, disputada entre Palmeiras e São Paulo no início do mês. Com transmissão na TV aberta exclusiva da Record, o jogo marcou média de 27 pontos de audiência, o triplo dos cerca de 9 pontos anotados pela Globo no mesmo horário, com o reality musical The Masked Singer e o Domingão com Huck. O cenário foi similar na final da Libertadores da América entre Palmeiras e Flamengo, transmitida em novembro pelo SBT, que marcou 27 pontos contra 9 da Globo. Em fevereiro, a Band também deixou a emissora para trás com a final do mundial entre Palmeiras e Chelsea.
Segundo o executivo Bruno Maia, CEO da startup de conteúdo esportivo Feel The Match, e autor do livro Inovação É o Novo Marketing, a dominância esportiva da Globo foi construída a partir da força da TV aberta no país. “A TV aberta sempre teve uma importância muito grande no modelo econômico do futebol. Foi isso que fez a Copa do Mundo crescer tanto e ajudou o futebol a chegar ao tamanho que tem hoje. No Brasil, a dominância da Globo na TV era em todas as frentes, o que acabou se refletindo também no futebol”, explica ele. Maia aponta, porém, que a redistribuição dos direitos tende a reequilibrar esse cenário. “O fato de você ter direitos em outros lugares tende a migrar a audiência. O público vai atrás de onde o futebol está.”
Nem só de TV aberta, porém, vive o futebol hoje em dia. O próprio Paulistão, que deu à Record a liderança na disputa que sagrou o Palmeiras como campeão, também teve jogos transmitidos no Premiere, pay-per-view do grupo Globo, YouTube e HBO Max. A Copa do Brasil, por sua vez, divide as partidas entre o grupo Globo e a Amazon Prime Video. Enquanto isso, a Libertadores na TV aberta continua no SBT, com transmissão também na ESPN, Conmebol TV, Facebook e Star+. Na contramão da tendência, o Brasileirão voltou a ser apenas do Grupo Globo este ano, depois de dividir as duas últimas edições com a WarnerMedia. “Há uma pulverização de canais, há plataformas digitais, distribuições que não dependem de concessão de rádio e TV. Não é uma mudança sobre a Globo, é uma mudança da qual a Globo é mais um player”, opina Maia.
Tamanha quantidade de opções, é fato, causa certa confusão no espectador. A Libertadores no SBT, por exemplo, marcou audiência estrondosa para a emissora de Silvio Santos, mas esses bons índices representam a metade do que costumava marcar na Globo, apontou o Painel Nacional de TV. Nesse ano, o episódio de Pantanal em que Juma nasce bateu de frente com a estreia do Corinthians na competição, e o folhetim levou a melhor, com 27 contra 11 pontos na Grande São Paulo. “O público não sabe onde está passando e existe queixas em relação a qualidade por causa do padrão que a Globo criou nos últimos cinquenta anos. O consumidor quer acesso simples, fácil e da maneira que ele está acostumado. É uma adaptação”, conclui Maia.