Wagner Moura e Elisabeth Moss brilham em thriller sobre feminicídio
Na série Iluminadas, da Apple TV+, a sobrevivente das garras de um assassino em série lida com as duras sequelas do trauma enquanto almeja fazer justiça
Arquivista de um jornal nos anos 1990, Kirby (Elisabeth Moss) é uma figura apagada no trabalho. Em casa, morando com a mãe, ela mantém um caderno de anotações debaixo do colchão. Não se trata de um diário comum, mas de um guia para sua desorientação mental. “Um gato chamado Grendel”, escreve ela sobre o animal que aparece na cama com a devida identificação na coleira. Algumas cenas depois, no quarto, ela encontra um cachorro com o mesmo nome no pescoço, abre o caderninho e corrige a informação: “Grendel é um cão”. As anotações eventualmente se revelam úteis também aos espectadores de Iluminadas, minissérie em oito episódios da Apple TV+, que disponibiliza três na sexta-feira 29, seguidos de capítulos semanais. Kirby sobreviveu ao ataque brutal de um homem que lhe deixou cicatrizes físicas e emocionais profundas. Quando o corpo de uma moça é encontrado com padrões de ferimentos similares, ela se alia ao jornalista investigativo Dan Velazquez (o brasileiro Wagner Moura) para encontrar seu algoz. A caçada tem percalços aparentemente intransponíveis. As confusões mentais de Kirby fazem dela uma testemunha pouco confiável. Outro problema, mais sério, é que o assassino, apresentado já na primeira cena, tem uma vantagem aterrorizante: ele é capaz de viajar no tempo, perturbando suas vítimas ao longo de décadas.
Iluminadas
O Conto da Aia
Os Testamentos
O elemento da ficção científica adiciona uma camada extra de significados à trama sobre um tipo de crime tão comum na ficção — e, infelizmente, no mundo real. Feminicida em série, Harper (Jamie Bell, assustadoramente dissimulado) persegue mulheres e as deixa transtornadas com pequenas manipulações até o momento do ataque. Adaptação do livro de mesmo nome da sul-africana Lauren Beukes, lançado no Brasil pela Intrínseca, a trama expõe a dor da impunidade que ronda as vítimas dos crimes contra mulheres. Com um time feminino de roteiristas e diretoras, a série dá ao espectador uma proximidade pungente com o trauma, ao fazê-lo ver os fatos pela visão da protagonista, descolada da realidade e acossada por fantasmas a cada esquina. Kirby quer justiça e, quem sabe, alguma paz de espírito. Mas a burocracia da polícia empaca as investigações e o modo ético do jornalista encarnado por Moura lhe parece insuficiente. Ela só tem urgência de se sentir segura — um desejo difícil para tantas vítimas desses crimes sem castigo.
Publicado em VEJA de 4 de maio de 2022, edição nº 2787
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