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Por que é necessário ter autores negros escrevendo no horário nobre

Paulo Lessa, o Ítalo de ‘Cara e Coragem’, fala a VEJA sobre representatividade na TV

Por Giovanna Fraguito Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Valmir Moratelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 19 nov 2022, 17h00

Paulo Lessa, 40 anos, é um dos protagonistas da novela das 19h, Cara e Coragem, na TV Globo, com o personagem Ítalo. Ele também assumiu recentemente a Casa Afrodai, um coletivo cultural de arte, culinária e estética afro-brasileira, fundado pela sua falecida mãe, Dona Dai, localizado no Centro do Rio de Janeiro. O ator conversou com a coluna sobre racismo, representatividade na TV e por que é tão necessário ter autores negros escrevendo no horário nobre – uma raridade ainda hoje.

Como está sendo a experiência de ser protagonista de uma novela? É uma grande responsabilidade, não é fácil ser protagonista num horário muito popular. Você chegar de cara com um time desse, com nomes como Marcelo Serrado, Taís Araújo, Paolla Oliveira… Tem que segurar o nível. Mas eles me abraçaram, desde o início, principalmente a Taís, com quem tenho mais contato. Confesso que antes da novela fiquei muito tenso, pelo tamanho que ela tem, pelo nome, mas desde o teste, quando fui aprovado, Taís foi a primeira pessoa a me mandar mensagem, se colocando à disposição.

Recebeu muitos “nãos” antes desse espaço? Aconteceu muito de não fazer testes, por exemplo. Era algo que ficava impressionado, não me chamavam para fazer teste nenhum! Só era chamado para fazer homem negro. Isso é uma grande vitória do meu protagonista, quebra estereótipos. Ítalo é chefe de segurança, especializado, tem a grana dele, apartamento lindo, poder aquisitivo. Ele desconstrói o imaginário que foi criado para gente. Tem a estética também, o cabelo dread, que era colocado como uma pessoa suja, descompromissada, e de repente surge nele, tido como um cara bonito na novela, bem sucedido.

E como surgiu o trabalho na Casa Afrodai? Ela surge a partir do trabalho da minha mãe, que já faleceu. Ela tinha um salão afro naquele local, na Lapa, no Rio de Janeiro. E junto com o salão, um curso de cabeleireiro afro que formava profissionais, pessoas de comunidade, que hoje têm seus próprios salões. Hoje busco essa parceria, mas também dar uma nova cara que conversa com o que eu faço. O que era um sonho passa a virar um compromisso, de contar essa história para a Jade, minha filha, com um ano e meio de idade. A partir dessas ações qe vai se construindo o nosso imaginário, vai colaborar para a Jade ser uma mulher consciente, ciente com tudo que está acontecendo ao redor dela.

O Brasil ainda é um país muito racista. Qual é o seu sentimento em relação a isso? É algo que me entristece muito, mas que por outro lado mantém esse objetivo de conscientizar as pessoas. Faz a Casa Afrodai se tornar cada dia mais urgente. Nosso trabalho de conscientização, de dar autoestima às pessoas, se torna mais urgente. Quando a gente vê que o racismo está se legitimando, muita gente se acha no direito de ser racista e a gente sabe que racismo é crime…

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O cenário de preconceito tem piorado? Sem dúvidas, porque as atitudes do Bolsonaro legitimam isso. Um líder nacional falando as coisas que ele fala, está assinando embaixo o preconceito que as pessoas têm. Então se acham no direito de externar isso de maneira confortável. A gente sente isso muito no dia a dia. Não é que não existia racismo, mas em um governo como o de Bolsonaro, você legítima isso.

Ainda falta representatividade nas telas? Sim, é um caminho longo, que está sendo de alguma forma reparado. Em Cara e Coragem temos uma diretora preta, o que é raridade, a Maiara Aguiar; e outros profissionais da equipe técnica também pretos. Mas ainda precisa de muito mais, sinto muita falta de autores negros. Para conseguir ter propriedade em contar as nossas histórias e aproximação dessas vivências, é necessário ter autores negros. Mas ainda está muito devagar.

 

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