Novo olhar: como galeria em São Paulo estabelece o design, a natureza e até palavras como arte?
Luis Maluf realizou a primeira exposição do designer Zanini de Zanine como expressão artística e agora olha para a poesia de Deco Adjiman

No século XIX, o estilista Charles Worth foi o primeiro a afirmar que moda também é arte, ao transformar vestidos em expressão estética, criativa e autoral. No Brasil contemporâneo, o galerista Luis Maluf parece seguir um caminho semelhante — porém sob outros olhares e linguagens.
À frente da Galeria Luis Maluf, em São Paulo, ele vem abrindo espaço para manifestações artísticas que nascem à margem dos suportes tradicionais, como o design, a natureza e a própria palavra. Foi assim com a recente exposição de Zanini de Zanine, que marcou a estreia do renomado designer no campo das artes plásticas contemporâneas e encerrou sua temporada com sucesso, e será assim, a partir de agosto, com Deco Adjiman, artista que transforma folhas, pedras e cordas em paisagens poéticas.
Após acolher “Forma e Matéria”, de Zanini de Zanine, exposição que levou ao público esculturas, instalações e pinturas criadas a partir da escuta da madeira, cerâmica, papel e metal e dos percursos que esses materiais manifestos pronunciam —, a galeria agora apresenta “Chão é outra palavra para voo”, primeira individual do artista Deco Adjiman, com abertura marcada para este sábado, 2 de agosto, na Barra Funda.
Na mostra, com curadoria de Ana Carolina Ralston, Adjiman propõe uma imersão sensível nas relações entre corpo, deslocamento, natureza e literatura. As obras — entre escultura, instalação e escrita — são construídas com materiais naturais como pedras, folhas, galhos, terra e cordas tingidas. Em “Ascensão”, por exemplo, uma escultura desenvolvida durante residência no Parque Nacional do Itatiaia, o artista forma uma espécie de cartografia afetiva da montanha, um abraço entre o corpo e a paisagem. Já em “Dose de Doze”, garrafas contêm fragmentos literários escolhidos por amigos do artista, transformando memória e leitura em gesto plástico e afetivo.
Vale dizer que o que une esses artistas, apesar das linguagens distintas, é a relação visceral com a matéria e o território. Zanini, vindo do design, mostrou que cada recorte de madeira pode ser uma presença, uma memória. Deco, por sua vez, caminha com os pés no chão e a imaginação em voo, vendo poesia onde outros veriam apenas pedra e graveto.
Ambas as exposições — a de Zanini e agora a de Deco — ilustram o olhar refinado e expandido de Maluf, galerista referência na cena nacional ao abraçar a arte em sua totalidade, desde os novos talentos, pelo qual ficou conhecido em descobrir por meio de suas residências artísticas até artistas já consagrados que circulam e expõem em sua galeria. “O Zanine é um dos principais nomes do design contemporâneo que constrói a partir de sua própria vivência e repertório”, diz Maluf. “É a primeira exposição dele pensada sob a perspectiva de pesquisa artística, e que não se resulta em um objeto de utensílio ou design. É muito importante porque justamente ele pensa a arquitetura e o design através dessa produção artística”, completa.
Assim como Charles Worth transformou tecidos em narrativa, Maluf transforma seu espaço em plataforma para gestos artísticos — onde o design, a natureza, a palavra e a matéria ganham voz. A arte, afinal, não está apenas nos suportes tradicional, mas na capacidade de revelar o invisível no cotidiano – e o galerista sabe bem disso.
