O animal print é considerado uma tendência atemporal. Trata-se de uma escolha popular no mundo da moda e no design de interiores, aparecendo frequentemente em roupas, acessórios e objetos de decoração. As estampas, que podem ser de diversos animais, como tigres, zebras, crocodilos, cobras e, principalmente, onças, podem adicionar um toque ousado e exótico ao visual ou ao ambiente. Embora existam diversas alternativas ecológicas capazes de unir o estilo ao bem-estar animal, um artigo recente publicado no periódico científico Oryx Journal mostra que peles verdadeiras ainda são capazes de exercer um certo fascínio e a união desses elementos podem ser fatores estimulantes para a produção ilegal de itens de moda em uma prisão na Bolívia.
Os detentos estariam comprando peles e partes de onça e outros animais selvagens para produzir carteiras, chapéus, cintos e outros acessórios que são vendidos em mercados locais. As presas e ossos podem estar sendo exportados ilegalmente para uso medicinal na Ásia. O comércio é mais uma ameaça a população de onças e foi revelado por pesquisadores do World Animal Protection, organização internacional sem fins lucrativos em operação desde 1981, que investigam denúncias de comércio ilegal na prisão de Mocoví, na cidade boliviana de Trinidad.
A Bolívia é considerada uma área estratégica para a preservação de onças-pintadas. No entanto, de 1996 para cá estima-se que a população de onças tenha diminuído de 20% a 25%. As razões para o declínio incluem a perda de habitat e outros fatores, como a demanda doméstica e externa por partes do animal. “Cada onça ilegalmente arrancada do ambiente selvagem para retirada de sua pele e ossos torna mais próximo o desaparecimento total da espécie da paisagem boliviana”, diz Neil D’Cruze, Chefe Global de Pesquisa de Vida Selvagem do World Animal Protection e um dos autores do artigo em entrevista à VEJA.
Apesar de ser protegida contra o comércio internacional desde 1975 e nacional desde 1986, os detentos de Mocoví têm tido acesso a peles de onças e outros animais selvagens, como jibóias, jacarés do gênero Caiman e algumas espécies de porco selvagem. De acordo com D’Cruze, o material teria duas origens: a compra direta de caçadores ou um duplo comércio com vendedores dos mercados locais, que primeiro vendem as peles e depois compram os itens de moda manufaturados para a revenda. Informações coletadas pelo World Animal Protection indicam que o município de San Borja, em Beni, é o local onde as onças estão sendo caçadas para fornecer matéria prima para a produção ilegal.
D’Cruze estima que um detento poderia produzir mais de 20 itens ao longo de 3 ou 4 dias. Além disso, embora nenhuma informação sobre o destino pretendido dos produtos de vida selvagem tenha sido fornecida, vídeos recebidos pela organização revelam que pedidos vieram de compradores não bolivianos. Isso corrobora dados de estudos anteriores que descreveram um mercado externo diversificado para produtos de onça-pintada. Os vendedores do mercado El Campesino também descreveram ao World Animal Protection as vendas de produtos de onça (presas e pele) e jacaré (couro) para compradores chineses.
O pesquisador aponta que dentes e garras seriam usados para joias, e a carne do animal costuma ser consumida entre compradores chineses e filipinos, outras partes podem ser usadas como ingredientes de medicamentos. “Os cadáveres de onça-pintada podem ser fervidos e transformados em pasta e misturados com outros ingredientes da medicina tradicional asiática, que se acredita tratar dores de artrite, desempenho sexual e como um melhorador geral da saúde, embora o uso de grandes felinos não seja um remédio comprovado”, diz.
O grupo enviou uma carta ao Ministério do Meio Ambiente e Água da Bolívia alertando sobre a atividade de comércio de animais silvestres, incluindo o comércio ilegal de partes de onça ocorrendo na prisão de Mocoví, mas não obteve resposta até o fechamento dessa reportagem.