O MasterChef Brasil está atualmente em sua quarta temporada na Band, já teve uma edição infantil e outra só para profissionais, recebendo os mais diversos tipos de cozinheiros em sua bancada. Mas quem marcou história no programa foi Elisa Fernandes, que em dezembro de 2014 foi consagrada a primeira campeã brasileira do reality culinário. A jovem mora na França desde que foi a Paris fazer um curso na escola Cordon Bleu, parte do prêmio da competição, mas planeja voltar para o Brasil no fim deste ano e abrir um negócio próprio. “Aqui eu aprendo demais, mas quero abrir um negócio no Brasil. A minha ideia é aproveitar o fato de ainda ser meio que uma subcelebridade para fazer eventos. E, em seguida, abrir o meu restaurante”, contou em entrevista a VEJA.
Elisa também contou como sua vida mudou após a sua participação no reality, a fama que ganhou e o quanto aprendeu com um dos maiores chefs franceses, Alain Ducasse, seu atual patrão. “Minha vida é outra desde que eu comecei a trabalhar em uma cozinha profissional. O MasterChef me ajudou a encontrar minha paixão”, explica.
Ninguém vai falar que eles estão olhando torto porque você é mulher. É um mundo muito de homem, tudo gira em torno do mundo masculino, o tipo de piada, o ambiente
Elisa, sobre o machismo na cozinha
A cozinheira conta que não assistiu às temporadas mais recentes do programa, mas que ainda mantém contato com alguns dos seus ex-oponentes, como o amigo Mohamad e Helena, a vice-campeã. “O resto, não, porque é meio outra vibe. Eu não estou criticando, porque também me aproveito disso e acho super legal ter estado na televisão. Acho digno aproveitar o fato de ser subcelebridade. Mas sou mais alguém da comida do que da TV.”
Elisa também comenta o ambiente machista que é o universo da gastronomia, um assunto que ganhou destaque durante a temporada profissional do reality da Band, exibida em 2016. “Ninguém me dava credibilidade pelo fato de eu não ter experiência, e por ser mulher também, e ninguém diz isso. Esse é o maior problema do machismo, é uma parada velada. Ninguém vai falar que eles estão olhando torto porque você é mulher. É um mundo muito de homem, tudo gira em torno do mundo masculino, o tipo de piada, o ambiente.”
O MasterChef fez diferença na sua vida? Arrisco dizer que minha vida mudou mais desde que eu comecei a trabalhar numa cozinha profissional, do que quando eu virei a Elisa um pouco conhecida porque apareceu na televisão. Mas é claro que entrar no MasterChef interfere na sua vida, porque, obviamente, se tornar uma pessoa conhecida nas ruas mexe com o seu individual. Hoje em dia, eu trabalho mesmo na cozinha. Virei cozinheira de verdade. São 16 horas por dia, em pé, trabalhando aos fins de semana. Tem semana que nem folgo. Minha vida mudou demais. O que posso dizer é que o MasterChef me ajudou a encontrar minha paixão, minha vocação, e só tenho a agradecer.
Como está o seu trabalho aí na França? Eu vim fazer o curso na França, que era parte do prêmio. Aí, conheci o Alan Ducasse, o Pelé da gastronomia, por meio do agente dele, que me apresentou. Ele é um cara super generoso, gostou da minha história e me ofereceu uma vaga no restaurante Plaza Athenée, que fica em Paris, e alcançou o 13º lugar no ranking dos melhores do mundo, além de três estrelas no guia Michelin. Trabalhei lá por um ano e três meses, aí fui convidada para fazer a reabertura do restaurante em Provence, no sul da França, numa cidadezinha que se chama Moustiers Saint Marie. Eu saí de Paris, de um palácio, para trabalhar num restaurante de uma estrela, que é o La Bastide de Moustiers. É onde trabalho agora, na temporada de verão francesa, feliz ao lado dos campos de lavanda.
Depois do verão francês, quais seus planos? A ideia é voltar para o Brasil, a não ser que uma proposta maravilhosa apareça. Quando eu estava no Plaza Athenée, já queria voltar. Aqui, eu aprendo demais, mas quero abrir um negócio no Brasil. O plano era completar um ano, tipo ‘Vim, vi e venci’. Mas o chef apareceu com essa oferta irrecusável, em que estou num posto hierarquicamente superior, ganhando melhor, com mais responsabilidade, convidada pelo cara, não tinha como pedir mais.
Já tem algum plano concreto para o seu restaurante no Brasil? Não posso definir uma data, porque preciso de investimento. Mas a ideia é voltar no Natal para o Brasil e me preparar para a empreitada. Meu plano é fazer bastante evento, como o Clandestino da Bel (Coelho), coisas que eu fazia quando saí do MasterChef, aproveitando o fato ainda ser meio que uma subcelebridade (risos). Em seguida, abrir o restaurante.
Você mantém contato com os ex-participantes do reality show? Só com o Mohamad e com a Helena. O Estefano um pouquinho, a Bianca e a Isabela também. Mas o resto, não, porque é meio outra vibe. Eu não estou criticando, porque eu também aproveito disso e acho super legal ter estado na televisão. Acho super digno aproveitar do fato de ser subcelebridade, não é nenhuma crítica. Mas eu, Elisa Fernandes, sou mais alguém da comida do que da TV. Para mim, interessa ir a um evento de gastronomia se tiver um bom produto, ou um chef massa. Agora, bater cartão nessas festas só por bater, não é a minha. O que não quer dizer que seja contra, porque eu devo muito ao MasterChef, foi isso que me alavancou. Querendo ou não, hoje aqui, escondida no meio da Provence, numa cidade pequena, ainda liga um cliente querendo comer e tirar uma foto. Acabamos de reservar um piquenique com 18 brasileiras que estão vindo porque querem comer comigo. Acho lindo, mas a minha vibe é ser chef de verdade.
Você acompanhou as temporadas seguintes? Eu acompanhei a da Isabel, e depois parei, por causa do fuso, e tenho dificuldade de acessar o site da Band. Não vi mais. Eu conheci a Isabel (vencedora da segunda temporada), encontrei com ela na França, uma querida. Depois no Brasil, quando fui no Natal, eu encontrei o Leo (vencedor da terceira temporada). Eu até o convidei para vir aqui, e espero que ele venha. Mas assistir, eu não assisto mais, até porque me dá um nervoso. Na época da Isabel, ainda sentia um pouco de nostalgia.
Não sei se você acompanhou a polêmica sobre o MasterChef Profissional, que aconteceu em 2016, sobre machismo. Você vê isso na profissão? É um mundo muito de homem, tudo gira em torno do mundo masculino, o tipo de piada, o ambiente. No restaurante onde estou, sou a única mulher. Em Paris, quando entrei também era a única, mas o chef percebeu que estava na hora de mudar isso e começou a contratar só mulheres. Quando saí, a cozinha era meio a meio, e o clima era completamente diferente. Não se falava mais só de bunda, peito e pênis. De um modo geral, acaba ficando um ambiente muito sexualizado, naquela vibe meio moleque da quinta série. A presença de uma mulher transforma muito, para os caras entenderem que não é por ter menos força que se é menos capaz. É verdade que, se estou fazendo um caldo de frango em uma panela que pesa 50 quilos, não vou ter força física para fazer aquilo, mas não é por isso que eu mereço menos respeito, pois tem outras mil tarefas que eu vou poder fazer na cozinha. Você tem que respeitar determinados limites. Não necessariamente é o cara que consegue virar a panela que vai dar um bom cozinheiro. Nesse restaurante, como eu vim convidada pelo chef, a coisa é diferente, o pessoal me respeita mais, e estou em um posto hierarquicamente mais alto. Tem o chef, o sous-chef e depois eu. Quando eu estava no Plaza Athenée era algo como “o que essa mina que despencou da televisão tá fazendo aqui?”. Ninguém me dava credibilidade pelo fato de eu não ter experiência, e por ser mulher também, e ninguém diz isso. Esse é o maior problema do machismo, é uma parada velada. Ninguém vai falar que eles estão olhando torto porque você é mulher.
Qual era a pior e a melhor parte do MasterChef? A melhor parte era o frenesi de estar fazendo algo que se gosta de fazer. Eu me formei em filosofia, fiz mestrado em jornalismo, trabalhei com produção cultural e fotografia, mas nunca me senti realizada. O que me dava gás no MasterChef era poder falar que finalmente estava fazendo algo que amava. O que eu menos gostava era saber que estava sendo julgada. Não só pelos chefs, porque eles estão lá para isso. Me paravam na rua e falavam “Você tem que ser mais assim ou assado”. A vontade era de responder, “Tenho nada, você que tem que calar a boca, porque só me viu uma hora na televisão e não sabe de nada”. Na época, também falavam que eu tinha um caso com o Mohamad. Olha o estresse. Eu tinha um namorado nada ciumento, mas foi só começar esse boato que o estresse surgiu entre a gente. Você fica vulnerável a qualquer tipo de comentário e não tem direito à resposta.
Você tinha um jurado preferido? A Paola. Mas eu curtia bastante o Jacquin. Hoje, morando na França, eu entendo muito mais o Jacquin. A Paola é muito didática. Ela fala o que você tem que fazer para mudar, evoluir. O Jacquin falava algumas coisas meio cifradas, que hoje eu super entendo.
Prato para mim é farofa, farofa é tudo
Para terminar, qual o seu prato favorito? Eita, essa é uma pergunta difícil. Posso falar ingredientes ou pratos? Vou falar logo os dois. Ingredientes que eu amo são cogumelos, sou surtada com eles, e abóbora cabotiá. Se tem isso no menu, já me conquistou. Agora, prato para mim é farofa, farofa é tudo. Tenho quilos de farinha de mandioca aqui porque eu não consigo viver sem isso. E também berinjela à parmegiana.