Sua conterrânea Emilia Clarke brilhou como Daenerys Targaryen em Game of Thrones. Como foi assumir o papel da ancestral de uma personagem tão popular, numa trama ambientada 200 anos antes? Sempre soube que haveria uma pressão e assumi essa responsabilidade. Foi instigante ver a trajetória de Daenerys para recuperar o trono e a sua relação com os dragões. Logo, entender a história dos Targaryen no auge do poder, antes do colapso, vem sendo um terreno muito fértil e gratificante de explorar.
A guerra dos sexos é parte intrínseca da saga, mas em A Casa do Dragão esse embate será mais forte, com sua personagem, uma mulher, tentando quebrar a tradição de homens no poder. Como vê essa abordagem do autor George R.R. Martin? O questionamento da série sobre o patriarcado foi o que mais me atraiu na trama. É um contexto no qual as mulheres eram associadas à passividade e à maternidade. Então, como superar esses rótulos? E se você é uma mulher em uma posição de poder, como convencer seu eleitorado, especialmente os homens, de que é capaz? Isso se relaciona com nosso mundo. Estamos em 2022 e ainda votamos em líderes homens.
Como pessoa não binária, você de alguma forma vê sua identidade de gênero refletida em Rhaenyra? Ela não é uma versão medieval de um não binário. Pois a não binariedade está ligada ao uso neutro da linguagem e à quebra de padrões de identidade. Mas Rhaenyra não se sente confortável em seu gênero, pois o poder que recai sobre ela é contestado pelo fato de ser uma mulher. Ela nota a dinâmica dos gêneros nas esferas de poder e a potência da masculinidade. Logo, deseja o mesmo reconhecimento genético dos homens.
Game of Thrones foi criticada pelas muitas cenas de estupro. A Casa do Dragão será parecida? Nossa série vai manter o DNA de Game of Thrones, mas é bem diferente. Uma prova é que a trama fala de duas protagonistas mulheres. O clima no entretenimento mudou de lá para cá. Temos coordenadores de intimidade (profissionais que coreografam cenas de sexo), por exemplo.
Como foi gravar com os dragões? Lembro que eu cheguei ao set de mau humor e era dia de gravar com os dragões — no caso, robôs animatrônicos enormes. Me senti num parque de diversões. Foi a parte mais divertida do trabalho, pois pude soltar a imaginação. Na infância, minha mãe dirigia rápido por uma estrada com lombadas, e eu fingia que estava andando a cavalo. Foi quase a mesma coisa.
Publicado em VEJA de 17 de agosto de 2022, edição nº 2802