Entenda o caso Claudia Raia e a Lei Rouanet para além da polêmica
Lei de incentivo à cultura tem uma série de pré-requisitos e regras a serem cumpridas ao longo do processo de produção
A atriz Claudia Raia, 56 anos, foi a primeira personalidade no novo governo Lula a cair na malha fina das críticas envolvendo a captação de recursos via lei Rouanet — uma bandeira que ajudou a eleger Jair Bolsonaro e a descredibilizar a opinião da classe artística. Para além da polêmica, é importante que o debate seja acompanhado de explicações, tanto em relação à lei quanto sobre o projeto envolvendo a atriz.
Claudia teve 5 milhões de reais aprovados pelo Ministério da Cultura para a captação de verba e produção de duas peças musicais, envolvendo “a pesquisa, montagem e temporada de dois espetáculos produzidos e encenados” por ela. Logo, não significa que a atriz vai receber um “pix” com o valor milionário na conta: a produção da peça, agora, foi autorizada a ir atrás de patrocinadores, costumeiramente da iniciativa privada, para arrecadar até 5 milhões de reais em patrocínio. A verba ainda será escoada entre contratação de mão de obra, materiais, alimentação, aluguel de teatro, viagem, salário da equipe, e outros custos.
Para comparação, no mesmo Diário Oficial que divulgou a aprovação dos projetos de Claudia, um musical do cantor Alceu Valença foi aprovado em moldes parecidos com o valor de 3 milhões de reais. Os patrocinadores que participam dessa captação podem, depois, descontar parte do investimento do Imposto de Renda. Empresas podem direcionar até 4% de seu imposto de renda devido como patrocínio a projetos culturais. Já pessoas físicas podem direcionar até 6%. Assim, os projetos conseguem isenção do IR.
A Rouanet também exige que os produtores culturais apresentem um contraponto, devolvendo o investimento para a sociedade de alguma forma. No caso de Claudia Raia, ela dará um curso de 40 horas sobre a “prática de artes cênicas e o mercado profissional para atores” a 1.000 estudantes de escolas e universidades públicas.
Ao contrário da fama de “mamata”, a Rouanet é um processo burocrático longo, envolvendo várias etapas de aprovação — um processo que levantou comparações quando foram divulgados os cachês altos de músicos que se apresentam em festas municipais com verba pública sem passar pelo mesmo critério. Por exemplo, após ser aprovada a captação via Rouanet, o requerente deve abrir uma conta no Banco do Brasil. Ao captar 10% do total da verba, o projeto é encaminhado para um parecer técnico em uma das unidades do Ministério da Cultura. Com o parecer aprovado, é submetido ainda a apreciação Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, que definirá finalmente se o projeto poderá ser executado ou não. Para movimentar quaisquer recursos captados, o saldo da conta deve ter um mínimo de 20% do valor homologado para execução. O projeto é acompanhado pelo Ministério da Cultura e, ao final, é feita a prestação de contas de todos os gastos envolvidos.
Batizada de Rouanet em homenagem a Sérgio Paulo Rouanet, criador da lei e secretário de cultura de Fernando Collor de Mello, a lei instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura e foi criada em 23 de dezembro de 1991. Ela visa incentivar projetos culturais como forma de fomentar a economia e valorizar a arte. Durante o governo Bolsonaro, a legislação passou por modificações e novos tetos de gastos. Atualmente, cerca de 1 bilhão de reais de captação feita estavam empacados em burocracias da Secretaria de Cultura, que voltou a ganhar o status de Ministério com a nova administração.