Kim Petras, a primeira cantora trans no topo das paradas musicais
Intérprete do hit Unholy, a artista alemã prefere se destacar por seu trabalho, não pela identidade de gênero
A jovem Kim Petras deixou sua Alemanha natal em 2011, aos 19 anos, e embarcou para Los Angeles, nos Estados Unidos, em busca de um sonho: ser reconhecida, acima de qualquer coisa, por sua música. A jornada de mais de uma década atingiu o ápice no fim deste ano — hoje, aos 30, a alemã se converteu em mania com o hit Unholy. Ela é a primeira artista transgênero a alcançar o topo do Spotify global e da Billboard Hot 100, principal parada americana, graças à música em parceria com Sam Smith (que, aliás, se define como não binário). O sucesso rendeu a Petras sua primeira indicação ao Grammy 2023, no qual concorrerá na categoria de melhor performance pop de duo ou grupo, em fevereiro próximo.
O feito, claro, é uma conquista para a comunidade trans. Mas reduzi-la à sua identidade de gênero seria menosprezar a carreira da alemã. No cenário musical mais acolhedor de hoje em dia, Petras pode ser quem é, e escolhe ser reconhecida pela música, assim como qualquer cantora. “Quero estar na mesma categoria que todo mundo e ser julgada da mesma forma. Minha música ser boa é tudo o que importa”, proclamou à Billboard.
Com uma inegável postura de pop star, ela emula o ritmo dançante e sensual do pop feminino que cresceu ouvindo, desenhado por mulheres como Madonna, Cher e Britney Spears — que romperam barreiras entoando canções sobre sexo, amor, curtição e suas próprias inseguranças. “Mamãe não sabe que papai está excitado no bordel / Fazendo algo pecaminoso”, canta no refrão da apimentada Unholy. “Talvez tudo o que eu precise seja algo para acreditar”, confessa em If Jesus Was a Rockstar, que fala da sua relação dúbia com a religião.
Nascida em Colônia, Alemanha, Petras anda de mãos dadas com o pioneirismo. Isso porque sua transição de gênero foi um marco por lá. Aos 2 anos de idade, a então criança já dizia aos pais que era uma garota. Acolhedores, eles procuraram aconselhamento psicológico para a filha na adolescência, e ela iniciou a transição hormonal com apenas 12 anos, atraindo a atenção da mídia. Aos 16, ganhou ainda mais notoriedade ao se tornar uma das jovens mais novas a passar pela cirurgia de redesignação sexual.
Hoje no topo, ela sabe da representatividade que assume, mas vê a música como algo que vai além das barreiras de gênero. “A emoção de cantar me conecta a todos. Eu tenho sentimentos como qualquer um. Não penso na identidade de um artista, só amo sua música”, já resumiu a própria, que lançou em 2022 o álbum Slut Pop e ainda achou tempo para estrear nas telas na série Los Espookys, da HBO. Um sucesso que desafia classificações.
Publicado em VEJA de 4 de janeiro de 2023, edição nº 2822