Gilberto Braga
Dramaturgo
E quem é que escrevia os dramas brasileiros que Tarcísio Meira, Paulo José, Eva Vilma e tantos outros levavam para a TV? Gilberto Braga, mais do que qualquer outro dramaturgo, ajudou a mostrar o Brasil visto pela TV e, como consequência, construiu um modo de arte, o folhetim de televisão, que seria marca da cultura do país. Uma forma de entender o alcance de sua obra é passear pelos personagens mais marcantes, quase sempre vilões. “Quem matou Odete Roitman?”, o país inteiro indagou, em 1989, curioso para saber quem atirara na figura interpretada por Beatriz Segall, de Vale Tudo, que não tinha vergonha de dizer a respeito do cotidiano carioca: “É um povo preguiçoso, isso aqui é uma mistura de raças que não deu certo”. Braga morreu em 26 de outubro, aos 75 anos, de infecção generalizada.
Luis Gustavo
Ator
Em abril de 1969, uma reportagem de VEJA chamava a atenção para o sucesso do “herói sem caráter”, um Macunaíma moderno criado por Bráulio Pedroso, com direção de Lima Duarte e Walter Avancini. “Beto, um jovem de classe média baixa, é um tipo disposto a todos os golpes menores para subir até o ambiente da burguesia paulista”, anotava o texto. “Ao lado de alguns momentos de lirismo e bondade, mente, trai, ilude a todos, ilude-se, foge do trabalho.” Eis o Beto Rockfeller interpretado por Luis Gustavo, um dos mais conhecidos personagens da TV brasileira. Ele morreu em 19 de setembro, aos 87 anos, de câncer no intestino.
Orlando Drummond
Ator e Dublador
“Te dou o maiorrrrrr apoio”, dizia o “Seu” Peru da Escolinha do Professor Raimundo, esticando os erres. Namorador, logo avisava: “Use-me e abuse-me”. Sem falsa modéstia, resumia a graça de uma figura espalhafatosa, colorida e de gosto polêmico com um outro bordão adesivo: “Peru é cultura, cheio de ternura”. O ator a dar vida ao caricato personagem era Orlando Drummond, carioca nascido durante a gripe espanhola, em 1919, e que morreu em meio à pandemia do novo coronavírus, em 27 de julho, mas não de Covid-19. Tinha 101 anos e um outro capítulo menos conhecido na longeva carreira: a voz do Scooby-Doo e de tantas outras criaturas que fizeram fama na televisão brasileira era dele.
Paulo Gustavo
Ator e Diretor
Na onda em que surfou a comédia brasileira na última década, Paulo Gustavo foi rei — ou, como ele preferia, rainha. Os números em torno do humorista circulavam na casa do milhão. Minha Mãe É uma Peça, trilogia iniciada em 2013, com a qual o ator arrastou aos cinemas mais de 25 milhões de espectadores, somou mais de 300 milhões de reais em uma bilheteria sem precedente para o filão. Dona Hermínia, a querida e histriônica personagem, inspirada na própria mãe do ator, fez gargalhar brasileiros de todas as classes sociais. A morte de Paulo Gustavo, em 4 de maio, aos 42 anos, de Covid-19, deu nome e rosto à tragédia sanitária que levou quase 620 000 brasileiros.
Jean-Paul Belmondo
Ator
Para os americanos, não havia dúvida: aquele ator francês revelado em Acossado, de 1960, dirigido por Jean-Luc Godard, o filme inaugural da nouvelle vague, lembrava gigantes como Marlon Brando e James Dean, dado o vigor físico, o olhar irônico e o jeitão permanentemente desdenhoso com o cotidiano das relações em sociedade. O tom natural de interpretação de Jean-Paul Belmondo, como quem caminha pelos bulevares parisienses ao lado de Jean Seberg, com o The New York Herald Tribune em mãos, seria tão influente quanto os filmes em preto e branco de Godard e François Truffaut. Ele morreu em 6 de setembro, aos 88 anos, em Paris, de causas não reveladas pela família.
Christopher Plummer
Ator
“Fui treinado vocal e fisicamente para os textos de Shakespeare. Para fazer um papel ruim como o de Von Trapp, foi preciso usar todos os truques para preencher a carcaça vazia do personagem. Esse maldito filme me segue como um albatroz.” Era desse modo, rancoroso, que o ator canadense Christopher Plummer se referia ao capitão Georg von Trapp do inesquecível e querido filme musical A Noviça Rebelde, de 1965. Ele nunca conseguiu escapar do viúvo e pai de sete filhos que educa a prole de modo frio, até ter seu coração derretido pela delicadeza de Maria, a freira interpretada por Julie Andrews. Plummer morreu em 5 de fevereiro, aos 91 anos.
Publicado em VEJA de 29 de dezembro de 2021, edição nº 2770