O mundo permanece em luta contra o novo coronavírus, mas a briga já foi pior. As vacinas estão aí, as atividades presenciais são retomadas gradativamente e um misto de esperança e alívio ocupa os espaços onde até meses atrás havia só medo. Se os dois momentos da pandemia fossem eternizados pela pintura, o primeiro poderia trazer os tons sombrios, o tormento e a solidão das pinturas negras de Goya, o genial artista espanhol que tão bem retratou a angústia existencial humana. O segundo, apropriado aos tempos atuais, talvez tivesse o colorido de O Caracol, de Matisse, ou os padrões abstratos e imprevisíveis do americano Jackson Pollock. A cada tempo, suas expressões.
Por isso, não surpreende que uma das tendências no vestir seja o que está sendo chamado de moda dopamina. A referência diz respeito ao hormônio envolvido no processo que resulta em sensação de prazer e de felicidade. Depois de passar dezoito meses no estilo pijama-moletom-camiseta, muita gente está procurando peças que expressem a ideia de renascimento. Dentro do conceito, o que surge são roupas coloridas e carregadas de mensagens positivas na tentativa de fazer bem a quem usa e a quem olha. “Vivemos um trauma mundial e a moda pode ser libertadora”, diz Yasmine Sterea, diretora criativa e fundadora do movimento Free Free, que trabalha para o empoderamento feminino por meio da moda. “Ela é mais sobre se sentir bem.”
O sucesso da dobradinha moda e bem-estar pode ser visto nas passarelas na forma de um sublime vestido pink Valentino apresentado na coleção primavera-verão 2021 ou no amarelo iluminado do vestido que a atriz Zendaya usou na cerimônia do Oscar 2021. No Brasil, poucas pessoas exemplificam tão bem a tendência quanto a apresentadora Sabrina Sato. “A moda ajuda a trazer a alegria e o humor mesmo nestes momentos de medo e insegurança”, diz. Sabrina também aposta nessa linha ao montar os looks de sua filha, Zoe, de 2 anos.
Nos Estados Unidos, estima-se que a tendência contribuirá para o crescimento de até 13% das vendas no varejo projetado para 2021, segundo dados da National Retail Federation, entidade que representa o setor. A escolha do figurino tem mesmo tudo a ver com a mensagem que se quer passar. Quando se é um monarca, isso é praticamente uma ciência e na qual a rainha Elizabeth II, da Inglaterra, é doutora. Em suas aparições públicas, ela em geral usa looks coloridos para se destacar e transmitir aos súditos a sensação de alegria. Pode-se dizer, portanto, que Elizabeth foi a precursora da moda dopamina mesmo sem saber. God save the queen.
Publicado em VEJA de 18 de agosto de 2021, edição nº 2751