O indígena Daniel Munduruku felicitou o colega Ailton Krenak, que disputou com ele a vaga da cadeira número cinco, da Academia Brasileira de Letras, em uma eleição histórica ao eleger o primeiro indígena para a casa de Machado de Assis. “Quero felicitar pela conquista merecida pelo trabalho que ele realizou e desejar que a atuação dele na Academia seja importante e relevante ao representar as demandas das populações indígenas, sobretudo na área da literatura”, disse Munduruku por telefone a VEJA.
Munduruku, que também é ator da novela Terra e Paixão, comentou ainda que a votação espelha as últimas eleições da Academia, seguindo uma lógica de indicação da própria presidência. “É mais do que uma eleição no qual os candidatos podem se apresentar e fazer uma campanha. Me parece que o modo como a Academia tem feito, é como se fosse de cartas marcadas e isso repercute mal na sociedade”, disse.
Nas últimas semanas, os dois escritores trocaram farpas na imprensa. Munduruku acusou Krenak de puxar seu tapete na disputa afirmando que os dois tinham um acordo para apenas ele (Munduruku) concorrer. “Aquilo que afirmei recentemente, continua valendo”, diz Munduruku. “Houve, sim, uma conversa e um diálogo entre nós. Embora ele tenha garantido que não nos encontramos nem para um cafezinho. Eu creio, no entanto, que o tempo superará tudo. Agora ele é um imortal e não alimentarei rusgas. Isso não fortalece a presença dele lá. Foi uma conquista importante para os povos indígenas”.
Munduruku destacou, no entanto, que sustentou sua candidatura, mesmo concorrendo com Krenak, porque queria que as pessoas percebessem que os indígenas também fazem parte da sociedade. “Estamos preparados para exercer cargos e funções e ocupar todas as instituições. Nesse sentindo, a eleição de Ailton é uma demarcação de território. A presença dele lá é significativa para a nossa trajetória de luta”, completou.
O escritor não descarta uma nova candidatura no futuro, porém não acredita que a Academia vá eleger um novo indígena tão cedo. “Eu não vou concorrer para cumprir cota de indígena. Quero ser reconhecido pelo meu trabalho na literatura. A ABL não vai eleger nenhum novo autor indígena nos próximos anos. Mas eu não tenho pressa. Isso não significa que eu não vá concorrer jamais. Estou aberto a tentar novamente se surgir alguma possibilidade de que a escolha seja realmente mais meritória do que uma visão identitária da Academia.”
Ailton Krenak, o novo imortal, é ambientalista, filósofo, poeta e escritor. Ele pertence à etnia Krenak e seus livros abordam a rica herança cultural e histórica dos povos originários e a literatura nacional. Em comunicado oficial divulgado pela ABL, a Academia reafirmou “o compromisso em promover a diversidade e a inclusão na instituição e na literatura brasileira”. Além de Munduruku, também concorreram com Krenak os escritores Mary Lucy Murray Del Priore, Raquel Naveira, Antônio Hélio da Silva, J. M. Monteirás, Chirles Oliveira Santos José Cesar Castro Alves Ferreira, Gabriel Nascentes, Ney Robinson Suassuna, Denilson Marques da Silva, José Ricardo dos Santos Rodrigues, Martinho Ramalho de Melo, Luiz Coronel e Maria Madalena Eleutério de Barros Lima.