Museus sofrem com a crise e têm o desafio de preservar seu patrimônio
Antes repletos de visitantes, espaços como o Metropolitan de Nova York cogitam vender obras para equilibrar as contas
Eles foram especialmente impactados pela pandemia e, quase sem receita, têm lutado para não desaparecer. Pequenos, médios e grandes, temáticos ou generalistas, os museus – templos indispensáveis da história e do conhecimento — lutam para superar os terríveis danos financeiros trazidos pela crise sanitária. Entre aqueles em situação mais desconfortável está o Metropolitan Museum of Art, um dos maiores e mais conhecidos do mundo, símbolo de Nova York e orgulho de seus cidadãos. Carinhosamente apelidado de The Met, ocupa uma área imensa em um dos endereços mais nobres do planeta, a icônica Quinta Avenida, ao lado do Central Park — além de ter uma segunda instalação ao norte de Manhattan, chamada The Met Cloisters, que reúne artefatos medievais. Acostumado a receber 7 milhões de visitantes ao ano, o Metropolitan, com 2 milhões de obras de arte, feitas ao longo de cinco milênios e avaliadas em mais de 2,5 bilhões de dólares, encontra-se hoje perto da falência operacional, apesar de estar aberto ao público com visitas pré-agendadas.
Quando o novo coronavírus se espalhou pelos Estados Unidos, no início do ano passado, praticamente todos os museus de grande porte foram obrigados a cancelar suas exibições, gerando rombos enormes na arrecadação. Com o Metropolitan não foi diferente. Estima-se que ele tenha encerrado 2020 com 150 milhões de dólares de prejuízo, mesmo após demitir 400 de seus 2 000 funcionários e reduzir o salário dos executivos. Segundo analistas do setor, um em cada três museus nos Estados Unidos corre o risco de desaparecer. A organização sem fins lucrativos Americans for the Arts afirma que a indústria americana de arte e cultura, que arrecadava quase 900 bilhões de dólares anuais e representava 4,5% do PIB, teve um prejuízo no valor de 4,5 bilhões de dólares com o sumiço repentino de visitantes locais e estrangeiros.
Em uma tentativa de escapar da lista da quebradeira, o Metropolitan, uma instituição sesquicentenária fundada em 1870, começou a considerar a venda de algumas de suas obras de arte como forma de equilibrar as finanças. No ano passado, o Brooklyn Museum, também em Nova York, foi o pioneiro em pôr essa ideia em prática, arrecadando 31 milhões de dólares em leilões para pagar pela conservação das obras remanescentes — despesas com segurança, energia, seguros e funcionários especializados costumam ser expressivas.
Os Estados Unidos, no entanto, não são o único país com museus em desequilíbrio orçamentário. O Louvre, o mais visitado do mundo, registrou queda de 72% nas visitações em 2020, o que causou um prejuízo de 40 milhões de euros. Depois de ter ficado fechado por vários meses seguidos no ano passado, a joia parisiense voltou a funcionar por um breve período, até ser forçada a trancar as portas novamente, em fevereiro de 2021, devido ao aumento do número de casos de Covid-19 na cidade. O fechamento só foi bom para as equipes de conservação, que tiveram tempo de sobra para inspecionar o acervo, aberto à visitação contínua em circunstâncias normais.
A situação de penúria não é muito diferente no Brasil, onde a maioria dos museus depende exclusivamente do financiamento do Estado, que viu sua arrecadação de impostos despencar na pandemia, causando um efeito dominó que chegou a todo o segmento cultural. Os museus, no entanto, têm se esforçado para continuar a receber visitantes. Algumas instituições incluíram em seu acervo itens ligados à pandemia, na tentativa de preservar as sensações experimentadas neste momento. No Rio de Janeiro, por exemplo, o Museu do Amanhã organizou a exposição temporária Coronaceno — Reflexões em Tempos de Pandemia, cujo objetivo é traçar o percurso do coronavírus pelo mundo e pelas nossas vidas. Museus em Viena, na Áustria, e Colônia, na Alemanha, tiveram ideias parecidas e já começaram a colecionar artefatos contemporâneos para exibi-los quando as atividades forem amplamente retomadas por lá.
Muitos se perguntam o que aconteceria se um museu importante como o Metropolitan fosse irreversivelmente à falência. Provavelmente, as obras de arte nele guardadas seriam leiloadas para pagar dívidas. Ademais, a instituição mantenedora seria obrigada a dar uma destinação ao eventual lucro, uma vez que se trata de uma organização sem fins lucrativos, administrada por um conselho de curadores. As obras seriam apropriadas por colecionadores particulares, para os olhos de poucos privilegiados, o que contraria a função primordial da atividade de um museu: proporcionar entretenimento e cultura, gratuitamente ou a preços acessíveis, ao maior número possível de pessoas. Tomara que isso não aconteça.
Publicado em VEJA de 17 de março de 2021, edição nº 2729