A banda mais longeva, a mais rica, a mais profissional e, agora, a mais empreendedora. Nunca houve na história do rock — e talvez na era do entretenimento pop — um grupo de artistas tão bem-sucedidos quanto os britânicos dos Rolling Stones. Desde 1962 na estrada, os Stones venderam nos últimos 58 anos 250 milhões de álbuns, amealharam um patrimônio estimado em 2 bilhões de dólares, ensinaram aos rivais que cumprir contratos e ter estratégias de crescimento é quase tão relevante quanto o próprio trabalho criativo, transformaram uma imensa língua num dos ícones visuais das últimas décadas e, claro, escreveram canções que embalarão gerações ainda por muitos anos. Como na letra de um de seus clássicos, porém, os Stones nunca estão satisfeitos. Os quatro idosos (Mick Jagger, 77 anos, Keith Richards, 76, Ron Wood, 73, e Charlie Watts, 79) decidiram enveredar para o varejo físico. No dia 9 de setembro, inauguram em Londres a primeira loja dedicada a vender produtos de alguma forma ligados à trajetória da banda, abrindo uma nova e provavelmente lucrativa frente de negócios.
A iniciativa é ambiciosa. Mick Jagger queria desde o início que a loja ficasse na Carnaby Street, no Soho, ponto de encontro de músicos nos anos 60 e que, segundo ele, foi palco de noitadas tão quentes quanto inesquecíveis. Richards desejava que o lugar lembrasse vagamente um museu, enquanto Ron e Charlie preferiam algum lugar de aspecto mais elegante. Depois de dois anos de debates e inúmeros projetos arquitetônicos desprezados, chegou-se enfim a um veredicto. A loja será um pouco de tudo isso — ousada e comportada, despojada e luxuosa ao mesmo tempo, à semelhança dos próprios Stones. “O Soho sempre encapsulou o rock”, disseram os músicos em comunicado. “Por isso Carnaby Street é o local perfeito. Será uma experiência incomparável.”
Para os fãs dos Stones, trata-se de uma grande atração. O lugar vai vender de tudo que possa ser associado ao quarteto. Além de roupas e acessórios masculinos, femininos e infantis adornados com imagens da banda, estarão nas prateleiras vinis raros, instrumentos musicais e até itens de decoração, como cadeiras e mesas que, garantem os idealizadores do projeto, têm a ver com a trajetória do grupo. Segundo a Bravado, o braço de marketing da Universal Music que lidera a empreitada, a memorabilia não poderia ser mais completa.
Poucas bandas têm tantas credenciais para atuar na área de moda. De certa forma, os Stones transformaram o palco na maior passarela do mundo, seja nas jaquetas de couro de Jagger, copiadas por outros ao longo dos anos, seja nos ternos alinhados de Watts. “No palco, você tem de ser atraente e elegante, mas sem deixar de ser louco”, disse Jagger ao The New York Times. A ideia é que a loja passe a ser um novo destino turístico de Londres. Para divulgar o negócio, integrantes da banda deverão eventualmente “trabalhar” no local, atendendo nos caixas ou dando pitacos sobre os produtos. A Bravado também estuda a possibilidade de abrir unidades em outros países, a começar pelos Estados Unidos.
Não é de hoje que grandes bandas de rock se arriscam no mundo dos negócios. Durante muito tempo, elas pouco ousaram, preferindo se manter conectadas a atividades óbvias, como emprestar o nome a marcas de cerveja ou fazer propaganda de carros. Nos últimos anos, isso começou a mudar. Os americanos do Metallica transformaram a banda de heavy metal em uma organização multimilionária, com investimentos até na área de videogames. O Kiss, também dos EUA, exagerou na dose ao lançar no mercado uma linha de caixões com a sua assinatura. Agora os Rolling Stores levaram o empreendedorismo artístico para outro patamar. Eternos insatisfeitos, os setentões que escreveram alguns dos hinos da história do rock são como pedras que rolam, não param nunca, não criam musgo.
Publicado em VEJA de 9 de setembro de 2020, edição nº 2703