Por que a jovem Agnes Nunes é a nova grande aposta da MPB
Por trás da voz de menina, há uma compositora madura e eloquente contra o racismo
Nascida no interior da Bahia e criada no agreste paraibano, a cantora Agnes Nunes passou boa parte da vida longe do mar — e com pavor dele. Foi só no ano passado, em viagem a seu estado natal, que ela criou coragem para enfrentar o oceano. “Quando eu saí da água, estava renovada. Fui direto compor”, diz. O batismo nas ondas teve duplo significado. Daí veio a inspiração para a música Menina Mulher, também título de seu recém-lançado primeiro álbum. Ao superar o medo, Agnes, de 19 anos, encontrou ainda uma metáfora para explicar seu precoce — e impressionante — amadurecimento.
Ivete Sangalo – Multishow Ao Vivo
Elza
Se há uma coisa que chama atenção em Agnes (além da beleza), é a rara conjunção que ela personifica: eis uma cantora com timbre e vivacidade de menina, mas domínio vocal e veia compositora de gente grande. Ela começou com apenas 12 anos — e logo seu canto suave, com um quê de angelical, foi somando fãs no YouTube. No disco de estreia, seu repertório de samba ganha toques de jazz e R&B nos arranjos do produtor chileno Neo Beats. Agnes mal botou os pés no mar da MPB e já conquistou caciques como Caetano Veloso e Seu Jorge. “Quando a ouvi, pensei: ‘Essa menina tem voz de anjo’”, declarou Ivete Sangalo, que gravou com ela a faixa Tudo Vai Dar Certo para seu novo programa na HBO Max, Onda Boa. “Agnes é uma joia. Seu trabalho autoral acrescenta muito à música”, disse a VEJA o ator Lázaro Ramos, que a convidou para cantar um samba de Cartola na trilha de seu primeiro filme como diretor, Medida Provisória.
Basta prestar atenção nas letras para perceber que Agnes não é só mais uma voz bonita na MPB. Com notável franqueza, ela canta sobre temas pessoais, da origem simples à feminilidade — e empresta sua voz à luta contra o racismo. A música, aliás, foi uma válvula de escape quando, na adolescência, a cantora era atacada por causa do seu visual black power no interior paraibano. “As pessoas me perguntavam o que eu escondia dentro do meu cabelo. Era horrível”, diz. Com 2,7 milhões de seguidores no Instagram e mais de 32 milhões de visualizações no YouTube, Agnes lançou recentemente uma série de conversas com seis artistas negras sobre as dificuldades que enfrentaram — uma delas era Elza Soares, morta no mês passado. “Essas mulheres sofreram mil vezes mais que eu, e abriram alas para outras cantoras pretas.” Que a maré continue assim.
Publicado em VEJA de 23 de fevereiro de 2022, edição nº 2777
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