Sinal dos tempos: TV por assinatura perde 6 milhões de clientes em 7 anos
A queda no número de assinantes é indício de uma tendência que pode ter vindo para ficar
Sabe aquela tradicional imagem da família em torno da televisão? Já faz algum tempo que ela não representa a realidade do lar, inclusive do brasileiro. Hoje em dia, cada membro da família está com a cara voltada para uma tela diferente: computador, celular ou tablet. Os jovens adultos lideram essa tendência — eles não veem mais TV, seja aberta ou por assinatura, a não ser para assistir a um jogo de futebol ou, eventualmente, um reality show. Na verdade, a maioria é avessa às programações fixas das emissoras e recorrem a plataformas de streaming como Netflix, Amazon, HBO Max, entre tantas outras. A maior evidência dessas mudanças está em dados recentes sobre o mercado de TV paga divulgados pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), mostrando que só neste ano as operadoras registraram perda média de 160 000 assinantes por mês.
É verdade que a tendência de queda começou antes, em 2014, em razão da retração econômica que reduziu o poder de consumo do brasileiro. Por não ser um serviço essencial, a TV por assinatura é um dos primeiros itens do orçamento doméstico a sofrer corte. Os preços dos pacotes, que custam em média 130 reais por mês, contribuem para isso. Com exceção de agosto do ano passado, quando houve um aumento tímido da base de assinantes, a curva vem apontando para baixo. O número total desceu do patamar de quase 20 milhões de lares para menos de 14 milhões, revelando que, em sete anos, 6 milhões de clientes cancelaram seus planos. Todas as grandes empresas do setor tiveram sua base de assinantes reduzida, com exceção da Oi, que adicionou 52 000 lares à sua, provavelmente em razão do investimento na tecnologia de fibra, que melhora a recepção e a qualidade de imagem. Ainda assim, trata-se de um número inexpressivo quando comparado a um mercado potencial de mais de 20 milhões de clientes.
Justificar a perda de assinantes pela conjuntura econômica pode levar à errônea conclusão de que se trata de um problema circunstancial, o que está longe de ser verdade. O streaming, seja pago, seja gratuito, tem reduzido o interesse do público pela TV por assinatura, que ainda consegue segurar a audiência com eventos esportivos e a venda casada de pacotes que englobam telefonia fixa, internet rápida e canais de TV. O problema é que esses canais são estáticos e competem com uma programação sob medida de aplicativos lançados, ironicamente, pelas mesmas redes que defendem seu antigo produto, como Disney, Warner e Paramount. “Além de ser mais baratas, as plataformas digitais têm a vantagem de conseguir direcionar o cardápio de filmes e séries, por meio de algoritmos, para o que os clientes querem ver”, disse a VEJA o professor de economia Arthur Barrionuevo, da Fundação Getulio Vargas.
Outro complicador para as operadoras é a pirataria. Estima-se que cerca de 5 milhões de lares recebam sinal sem pagar por ele, provocando um impacto de mais de 15 bilhões de reais por ano. Apesar disso, o mercado continua atraente para as operadoras, pois as assinaturas existentes ainda movimentam 21 bilhões de reais por ano. No quesito preço final, a Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) mostra que as operadoras enfrentam um concorrência assimétrica dos outros provedores de vídeos, que não estão sujeitos às mesmas obrigações regulatórias e carga tributária. Segundo a associação, “os custos impostos à TV paga são maiores, o que gera uma competição desigual”. Essa queixa, inclusive, foi levada ao Ministério das Comunicações, que pode vir a revisar o modelo. Espera-se apenas que a solução não venha na forma de aumento de impostos sobre serviços de streaming, prejudicando a parte mais interessada: o consumidor.
Publicado em VEJA de 11 de agosto de 2021, edição nº 2750