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Uso do cinto de castidade na Idade Média: uma mentira histórica

Mito teria surgido durante o Iluminismo, no século XVIII, para ressaltar o obscurantismo medieval

Por Da redação
Atualizado em 4 jun 2024, 18h35 - Publicado em 20 mar 2017, 10h59

A imagem do cavaleiro medieval que parte rumo às Cruzadas e deixa para trás sua amada alegre e bonita, protegida por um cinto de castidade, não passa de uma mentira histórica e de um mito surgido no século XVIII para ressaltar o obscurantismo medieval. Este é o argumento da exposição Histórias Secretas do Cinto de Castidade. Mito e Realidade, que ficará em cartaz até agosto no Museu Katona József de Kecskemét, ao sul de Budapeste, capital da Hungria. Na mostra, aberta apenas para maiores de 16 anos, estão expostos 20 exemplos desses cinturões para explicar como o mito foi cunhado durante o Iluminismo.

No museu, os visitantes se deparam com brutais objetos de cadeados e orifícios protegidos por dentes de metal, e a primeira pergunta que surge é como as suas usuárias poderiam sobreviver a eles. “O mito do cinto de castidade surgiu durante o Iluminismo para que este movimento se afirmasse como superior à Idade Média, que seria a era da obscuridade”, explica Katalin Végh, subdiretora do Museu Katona József. A mitificação foi apoiada pela Grande Enciclopédia Francesa, editada a partir de 1751. O livro assegurava que o uso do cinto era generalizado na Idade Média. E o mito se consolidou como verdade.

Um outro impulso para a lenda do mito de castidade apareceu no final do século XIX, quando a masturbação era vista como um pecado e o cinto, como um remédio para ele. Há informação de que até os primeiros anos do século XX foram apresentadas várias patentes de diferentes cinturões de castidade, cuja missão seria a evitar que jovens se masturbassem. Estes cinturões “modernos”, nos quais o couro substitui o metal, também serviam, ou pretendiam servir, para proteger as mulheres de abusos e violência sexual, em um momento no qual elas passaram a ocupar espaços que, até então, eram exclusivos dos homens, como as fábricas.

Mas seu uso difundido na Idade Média pode não passar de uma grande mentira, na qual se acreditou até a década de 1990. A lenda foi alimentada, em todos esses séculos, não só pelo populacho, mas também por especialistas, em artigos científicos e mesmo em museus. O próprio Museu de Medicina Semmelweis em Budapeste, de onde provêm os objetos expostos na nova mostra, reconhece a responsabilidade dos museus na criação deste mito e afirmou que estas instituições não só conservam o passado, mas às vezes também uma história imaginária. E o passado, como o presente, está sempre em mutação.

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Instituições como o British Museum, de Londres, e o Germanisches Nationalmuseum de Nuremberg, na Alemanha, possuíam e expunham coleções de cintos de castidade até a segunda metade dos anos 90, quando pesquisadores passaram a buscar a data de fabricação dos acessórios e descobriram que eles não passavam de falsificações feitas no século XIX.

Vários pesquisadores, como Benedek Varga, diretor do Museu de Medicina Semmelweis, questionaram o mito, realizando pesquisas históricas, literárias e científicas. A conclusão é que, na literatura medieval, inclusive em autores de textos eróticos, como Boccaccio e Rabelais, o cinto de castidade aparece muito poucas vezes e sempre com um claro sentido simbólico. O mito do cinto de castidade tem também a sua origem nos textos da Roma clássica sobre fitas, cinturões e cordas de castidade, e de Vênus. Mas, segundo os pesquisadores atuais, não são mais do que elementos simbólicos e metafóricos — e não descrições de objetos reais.

De fato, e é o que defende a mostra de Budapeste, basta observar os acessórios para perceber que seria impossível utilizá-los por um longo tempo. Por um lado, o uso dos objetos poderia causar ferimentos, inclusive mortais, e isso quando não impedissem a higiene pessoal a ponto de provocar infecções. Por outro, os cadeados poderia ser abertos facilmente, o que depõe contra a ideia de assegurar a fidelidade da mulher na marra.

(Com agência EFE)

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