Violinista paulistana usa o instrumento para lutar por inclusão social
O violino levou Sarah Nojosa a uma prestigiosa escola de música da França; seu plano é voltar um dia ao Brasil para ensinar jovens carentes a tocar
ÀS VEZES, uma vocação se revela a partir de uma necessidade. Não é incomum também que o acaso dê as cartas. Na trajetória da violinista paulistana Sarah Nojosa, no entanto, os dois fatores se juntaram para lhe traçar o destino profissional. Nascida na carente Taipas, Zona Norte da cidade, ela estava com 6 anos quando seus pais, ambos funcionários públicos, se viram obrigados a encontrar alguma atividade que lhe ocupasse as manhãs, pois a menina só entrava na escolinha à tarde. Matricularam-na em um centro gratuito de atividades infantis , “onde a instrutora simplesmente resolveu dar aula de música às crianças”, conta Sarah. Aprendeu, então, a tocar flauta doce. Aos 8 anos, já dominando o instrumento, a menina foi encaminhada ao Projeto Guri, iniciativa do governo estadual que promove a inclusão social por meio da prática musical. Mas surgiu um problema: não havia curso de flauta doce. “Precisei escolher outro instrumento e acabei optando pelo violino porque tinha me encantado com um concerto exibido na TV Cultura”, lembra Sarah. A decisão definiu seu futuro: desde novembro de 2017, ela reside na França, depois de ter sido contemplada com uma bolsa na prestigiosa École Normale de Musique de Paris.
Até chegar lá, a jovem violinista seguiu um percurso exitoso: depois do Projeto Guri, passou por três edições do Festival de Inverno de Campos do Jordão e pela academia da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo. Foi, aliás, no mesmo ano em que entrou para a escola da Osesp, 2016, que Sarah impressionou uma professora russa da École de Musique de Paris a ponto de fazer com que ela conseguisse uma oportunidade para a jovem na instituição francesa, garantindo-lhe aulas de graça.Para bancar sua vida na capital da França, contudo, a violinista sempre teve de se virar. Juntar os 650 euros gastos todos os meses com aluguel e alimentação lhe custaram organizar leilões virtuais, dar recitais e até trabalhar como baby-sitter. “Os europeus têm tudo: bom ensino, condição financeira. Só não têm a força de vontade que nós temos”, diz a jovem.
O diploma da École de Musique equivale ao de uma especialização. Antes mesmo de concluir essa etapa, em 2019, Sarah já tinha começado a se submeter a provas para ingressar em uma universidade francesa, a fim de fazer a graduação em música. Seu objetivo, claro, é uma carreira internacional. Entretanto, por volta dos 40 anos, ela planeja retornar ao Brasil e criar uma academia para jovens carentes. “Quero retribuir tudo o que a música me deu”, diz. Sarah não toca de ouvido — ela sabe o que quer.
Publicado em VEJA de 8 de janeiro de 2020, edição nº 2668