A mudança radical em regras de ranqueamento de gigantes como Google e Meta
Nova legislação de antitruste nos EUA, se aprovada, abala o poder de mercado das multinacionais de tecnologia
O simples resultado de uma busca no Google, de uma pesquisa no site da Amazon, ou na loja on-line Apple Store, pode ser profundamente reconfigurado nos Estados Unidos. Uma grande regulamentação relativa às Big Techs no país será votada no Senado nas próximas semanas, unindo de forma peculiar parte dos progressistas e da direita ultraconservadora. Em coletiva de imprensa, na última quarta-feira, um grupo bipartidário de senadores e deputados apresentou em mais detalhes a legislação idealizada com o mote de “pôr as rédeas nas grandes empresas de tecnologia”. A proposta almeja “restabelecer a concorrência online, reduzir os custos para os consumidores, ajudar pequenas empresas e restaurar a concorrência nos mercados digitais”.
Se aprovada e, posteriormente sancionada pelo presidente Joe Biden, a legislação antitruste quebra o poder de mercado das multinacionais de tecnologia. O âmago da proposta é o marketing digital e o ranqueamento nas plataformas de pesquisa como Google e nos marketplaces como Amazon. Em nome do (dito) benefício aos pequenos negócios e competidores, as grandes plataformas poderão ser proibidas de colocar em destaque seus próprios produtos e serviços nos resultados de busca. O ranqueamento deverá ser determinado a partir do preço acessível e da qualidade dos produtos, independente de quem paga mais pela oferta.
Na prática, os serviços de marketing como Facebook Ads, Google Ads e Amazon Ads serão fraturados. Atualmente, as plataformas cobram para destacar anúncios nos primeiros lugares do relutado de busca – sendo também uma das principais fontes de receita das Big Techs. Não à toa, segundo o grupo de congressistas, a Associação do Setor de Comunicações e Computação gastou 22 milhões de dólares em anúncios contra a legislação – na semana passada. O líder da maioria no Senado, Chuck Schumer, deu aval para a votação da proposta de lei.
A senadora democrata Amy Klobuchar, potencial presidenciável em 2024, e o senador republicado Chuck Grassley, veterano conservador, lideram o grupo de legisladores. Uma das bases para o projeto de lei é um relatório de 450 páginas e 18 meses de investigação sobre a atuação das gigantes Amazon, Apple Alphabet (Google), Microsoft, Meta, dentre outras. “Por muito tempo, as grandes empresas de tecnologia disseram ‘confie em nós’ enquanto colocam os lucros à frente dos seus usuários. A era do ‘apenas confie em nós’ terminou. E apesar de todo o dinheiro sendo gasto contra nós, temos impulso porque o projeto é pró-concorrência e é senso comum”, diz Klobuchar, alegando que, desde a massificação da internet, nenhuma legislação sobre regular o monopólio das grandes empresas foi votada no Senado.
LIVE: I'm holding a press conference with @ChuckGrassley, @DavidCicilline, and @RepKenBuck on how our bipartisan technology competition bill will lower costs for consumers, and help businesses compete. Watch: https://t.co/mzB76ap2nq
— Senator Amy Klobuchar (@SenAmyKlobuchar) June 8, 2022
Dano aos negócios
A legislação bipartidária e bicameral (isto é, proposta concomitantemente por representantes do Senado e Congresso) foi introduzida em outubro de 2021 e nomeada de Ato da Escolha Online e Inovação Americana. Representantes das grandes empresas já criticaram publicamente o projeto. Em carta aberta, publicada em janeiro de 2022, Kent Walker, diretor jurídico do Google e sua controladora Alphabet, disse que o projeto de lei impõem inúmeras regras “às principais empresas americanas, ao mesmo tempo que dá passe livre para empresas estrangeiras”.
Segundo o representante do Google, a legislação prejudicaria a capacidade da plataforma em oferecer segurança no ranqueamento dos resultados de busca, “expondo as pessoas a ataques de phishing, malware e conteúdo com spam”. Walker ainda falou da possível dificuldade, com a Lei, de fornecer serviços gratuitos aos consumidores e empresas, como Maps e o Gmail. “A legislação parece punir os serviços gratuitos em favor dos serviços pelos quais os consumidores devem pagar”, disse.
Em abril deste ano, o CEO da Apple, Tim Cook, criticou de forma geral projetos de lei antitruste, tramitando nos legislativos dos EUA e Europa. Cook apontou para os riscos com o processo chamado sideload, que pode se referir tanto à transferência de arquivos entre dispositivos, quanto à possibilidade de instalar apps de fontes externas, isto é, fora das lojas autorizadas como Apple Store e Play Store.
Hoje, nos iPhones, por medidas de segurança, os usuários só podem fazer download de aplicativo das lojas oficiais. Para o CEO, as leis antitruste – ao reconfigurar o ranqueamento da Apple – podem “desbloquear” o iPhone para lojas de terceiros e instalações de apps prejudiciais. “Aqui em Washington e em outros lugares, os formuladores de políticas estão tomando medidas em nome da concorrência que forçariam a Apple a permitir aplicativos no iPhone que burlam a App Store do sideload. Isso significa que empresas famintas por dados seriam capazes de evitar nossas regras de privacidade e, mais uma vez, rastrear nossos usuários contra a vontade deles”, disse Cook, não citando nenhuma legislação em específico. No entanto, o Senador ultradireitista Ted Cruz, em outro momento, disse que o CEO teve uma longa conversa por telefone com ele, em janeiro, expressando “preocupações significativas sobre a proposta”.