O físico alemão Albert Einstein disparou, em meados do século passado, uma frase que virou aforismo ao descrever um conceito-chave do mundo das finanças: “As regras de composição dos juros são a oitava maravilha do mundo. Quem as conhece ganha. Quem as ignora paga”. A máxima do criador da teoria da relatividade se encaixa com precisão no cenário brasileiro atual. Detentor da segunda maior taxa de juros para o consumidor do planeta, a cobrada pelas instituições financeiras, o Brasil fica atrás apenas de Madagascar, conforme um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV). Na última quarta-feira, 30, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) cortou sua taxa básica de juros para 5%, o patamar mais baixo da história. O impacto para o consumidor, entretanto, foi pífio. Os juros do cheque especial ficarão irrisório 0,58% mais baixos, passando dos atuais 275,24% ao ano para 273,63%. De acordo com um levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a taxa de juros média do cartão de crédito no país deve passar de 266,85% para 264,49% ao ano. São números que, mesmo com os ajustes, seguem astronômicos sob qualquer padrão — nos Estados Unidos, para efeito de comparação, os juros do cartão de crédito são de, em média, 15% ao ano.
A justificativa dos bancos e das operadoras de cartão para cobrança tão alta se calca principalmente no risco de inadimplência dos tomadores de empréstimos. Procuradas por VEJA para esta reportagem, nenhuma das três maiores instituições privadas do país (confira o quadro abaixo) concedeu entrevista. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) disse em nota que cabe ao governo tomar medidas para baratear o crédito. Mas o raciocínio vigente no setor é que os bons pagadores financiam o calote dos maus. “Cerca de 35% das pessoas que entram no rotativo não vão pagar a dívida”, avalia Ricardo Vieira, diretor executivo da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). A questão é que, embora o número de devedores se mantenha estável nos últimos três anos — são 63 milhões atualmente, em comparação com 60 milhões em 2016, segundo a Serasa Experian, uma variação de 5% de aumento —, a taxa de juros média do cheque especial subiu 10%. “Nada justifica as taxas cobradas, todas têm patamares muito elevados”, critica Miguel de Oliveira, diretor executivo da Anefac.
A lista de argumentos tradicionalmente utilizados pelos bancos é longa, mas boa parte dela se mostra anacrônica. Eles reclamam, por exemplo, do compulsório, recolhimento obrigatório que o BC determina como garantia da liquidez aos correntistas. De fato, o Brasil é mais exigente do que a média dos países, mas, nos últimos três anos, essa alíquota exigida sobre os depósitos caiu de 40% para 25%. Também citam a falta de dados disponíveis sobre o comportamento financeiro dos clientes. Entretanto, a criação do cadastro positivo, em junho de 2011, e seu aprimoramento, em abril último, praticamente pulverizaram tal problema.
Para os teóricos das finanças, a grande causa dos altos juros ao consumidor é a falta de concorrência no sistema financeiro brasileiro. Os cinco maiores bancos do país detêm 84,8% das operações de crédito. “Só a entrada de competidores no mercado vai resolver a questão dos altíssimos juros brasileiros”, vaticina o coordenador do mestrado da FGV, Ricardo Teixeira. O BC tem tomado medidas para mitigar esse problema, abrindo espaço para instituições estrangeiras e as chamadas financeiras digitais, ou fintechs. A situação, porém, ainda está bem longe de fazer com que a máxima de Einstein seja apenas uma anedota.
Publicado em VEJA de 6 de novembro de 2019, edição nº 2659