Bancos temem calote de R$ 2,5 bi na devolução de Viracopos
Em março, o consórcio do aeroporto de Campinas devia R$ 1,68 bilhão ao banco de fomento por meio de empréstimos diretos
Bancos que financiaram a expansão do aeroporto de Viracopos temem um prejuízo de R$ 2,53 bilhões, depois que o consórcio do terminal, em meio à crise, devolveu a concessão. Maior credor com mais de R$ 2 bilhões, o BNDES diz que “avaliará as medidas cabíveis para assegurar seus interesses no momento oportuno”.
Levantamento feito pelo Estadão/Broadcast mostra que, em março, o consórcio do aeroporto de Campinas (UTC, Triunfo, Egis e Infraero) devia R$ 1,68 bilhão ao banco de fomento por meio de empréstimos diretos e R$ 476 milhões em títulos de dívida, as chamadas debêntures. Ao todo, são R$ 2,16 bilhões devidos ao banco. Outras instituições também têm R$ 423 milhões a receber. Desse valor, Itaú BBA responde por R$ 146,3 milhões, Bradesco e Banco do Brasil têm, cada, R$ 131,4 milhões e o antigo Banco Espírito Santo – atualmente Haitong – possui R$ 14,9 milhões. Esses créditos têm origem no BNDES, mas foram repassados por essas instituições que, por isso, carregam o risco da operação.
Para os credores, geram especial preocupação as indefinições sobre quais pagamentos serão priorizados, ou como a concessionária será indenizada pelos investimentos já realizados.
Atualmente, os débitos financeiros estão sendo pagos em dia e o aeroporto informa em nota que “não existe previsão de interrupção”. Mas a concessionária já deixou de cumprir obrigações com o governo e, para receber parcela de R$ 173,8 milhões referente à outorga, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) teve de acionar o seguro-garantia.
A agência reguladora informou ainda que a taxa de outorga de 2017 não foi paga e, por isso, foi aberto um processo de cobrança no último dia 11. Desde maio, está em cobrança também a parcela de outorga variável, calculada sobre as receitas da concessão. Há ainda obras em atraso no terminal de passageiros e no pátio de aeronaves.
A inadimplência da concessionária estava num ponto tal que a agência poderia abrir um processo de caducidade (cassação) da concessão. O anúncio da devolução, feito no dia 28 de julho, interrompeu esse processo. Agora, a concessionária continuará administrando o aeroporto numa espécie de “operação padrão”, sem precisar realizar os investimentos ou pagar taxas de outorgas devidos após a devolução. Mas o estoque anterior continuará a ser cobrado.
As dificuldades da concessionária já estavam evidentes ao final do primeiro trimestre. No relatório de auditoria referente a esse período, a consultoria Ernst & Young já falava na perspectiva de renegociação da dívida com os bancos.
Dúvidas
A grande dúvida dos bancos está na falta de clareza sobre como se dará a devolução do terminal e o novo leilão. Numa lei aprovada em junho passado, foi aberta a possibilidade de devolução da concessão. Mas a lei ainda precisa ser regulamentada. E o detalhamento sobre como se dará o processo ainda está em estudo.
Em nota, Viracopos informou que o “pagamento da dívida será tratado no bojo da indenização (como desconto) à que a concessionária terá direito”. Mas o consórcio não tem certeza sobre o processo. “Como a Lei 13.448 ainda não foi regulamentada, será preciso aguardar pela definição dos critérios de cálculo da mesma”, informou a concessionária, ao citar a indenização e respectivos descontos.
A concessionária informou que investiu R$ 3 bilhões no aeroporto e que, portanto, tem esse valor a receber. Segundo fontes de mercado, porém, não está definido se a indenização será calculada com base no que foi efetivamente gasto ou com base no valor econômico das melhorias realizadas. O cálculo da indenização é a principal dúvida em todo o processo.
Outra questão é quem ressarcirá os antigos concessionários. Em tese, seria o governo. Mas, como não há caixa, é bastante provável que a conta seja repassada ao novo concessionário, que assumiria os pagamentos como parte da outorga. Esse é outro ponto de atenção dos credores. Isso porque eles têm a opção de continuar na operação.
No mercado, a avaliação é que, ao ser relicitado, o aeroporto será um negócio melhor do que é hoje. Ao fazer a relicitação, o governo precisará reestudar as condições da concessão do aeroporto. Portanto, as premissas da concessão serão ajustadas ao atual quadro econômico, bem pior do que o da época da concessão. Outra vantagem é que os investimentos mais pesados já foram realizados.
Procurado, o BNDES informou ainda que não pode dar detalhes sobre a situação de clientes específicos. Itaú BBA, Bradesco e Banco do Brasil afirmaram que não se pronunciarão sobre o caso. Já o banco Haitong não respondeu o pedido de esclarecimento da reportagem.
(com Estadão Conteúdo)