Foram longos meses de corredores vazios e lojas fechadas em que comerciantes por todo o país viram a renda cair e as dívidas crescerem. A pandemia deixou marcas profundas no varejo, mas o setor caminha rumo à recuperação. No terceiro trimestre deste ano, grande parte dos shoppings no Brasil reportou uma diminuição da vacância de lojas e da inadimplência dos donos de franquias. Entre setembro e outubro, a quantidade de clientes transitando pelos centros de compras cresceu 10%, de acordo com um índice elaborado pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo. As lojas mais beneficiadas foram as de beleza, moda e utilidades domésticas. Considerando todo o setor, as vendas subiram 12% no mesmo período.
Três fatores explicam a significativa retomada dos shopping centers. O primeiro é a queda nos casos de Covid-19 no país. A reabertura da economia deu coragem para que os consumidores retomassem as atividades suspensas durante os piores dias da crise. A sequência de datas comemorativas do fim do ano — Dia das Crianças, Black Friday e Natal — também aqueceu o setor. Tradicionalmente, é a melhor época para o varejo. Há ainda a percepção de que, para o brasileiro, o shopping vai além de um centro de compras. “Os consumidores associam esses espaços a sentimentos de alegria, confiança e segurança”, afirma Glauco Humai, presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers. “Durante o fechamento, eles sentiram falta de sair de casa para passear, ver vitrines e se divertir nos shoppings.”
No período de lojas fechadas, o jeito foi recorrer ao e-commerce. O Brasil foi o país da América Latina que registrou o maior aumento de compras on-line durante a pandemia. Cerca de 13 milhões de brasileiros fizeram suas primeiras compras pela internet em 2020. Comidas, bebidas, roupas, eletrodomésticos e outros produtos passaram a ser adquiridos pelo celular ou pelo computador. O curioso é que o avanço das vendas virtuais não significa necessariamente o fim das lojas físicas, como defenderam analistas apressados.
As lojas físicas, na verdade, passarão a desempenhar um novo papel. Elas não estão com os dias contados, mas começaram a trabalhar de maneira integrada com o comércio eletrônico. Dono da Riachuelo, Flávio Rocha costuma dizer que os consumidores de itens de moda gostam de sentir o tecido e experimentá-los antes de comprar, e isso explica por que as lojas físicas sempre terão apelo junto ao público. Para Cristina Betts, co-CEO da rede Iguatemi, a loja física será voltada para a experiência: “O menos divertido do momento da compra será feito no digital, como o pagamento, a escolha da entrega, o transporte do produto”.
Os espaços nos shoppings funcionarão como um showroom das marcas, em um modelo que o mercado chama de “figital”, a união do físico e do digital. Um exemplo vem da Troc, brechó do grupo Arezzo&Co que era totalmente digital e agora resolveu testar o funcionamento de lojas físicas pelo Brasil. Segundo a CEO Luanna Domakoski, o papel desses estabelecimentos é agregar ao on-line, e não competir com ele. “Cerca de 90% dos clientes de moda precisam ganhar a confiança na marca antes de comprar no digital”, afirma a executiva.
A retomada dos shopping centers não passou despercebida pelo mercado financeiro. As maiores controladoras de shoppings do país tiveram altas significativas nas receitas líquidas no terceiro trimestre de 2021. A BrMalls, administradora de três dezenas de shoppings espalhados pelo país, viu seu lucro aumentar quase sete vezes na comparação com o mesmo período do ano passado. O Grupo Multiplan, dono, entre outros, do BarraShopping, no Rio de Janeiro, e do Shopping Vila Olímpia, em São Paulo, detectou um aumento de 10% das vendas em outubro diante de mesmo mês de 2019 — portanto, antes da pandemia. Apesar do otimismo, o temor com a variante ômicron disparou um alerta sobre novas restrições de circulação. Espera-se que isso não seja necessário. Shoppings abertos — e cheios — são indicadores de que a vida, aos poucos, começa a voltar ao normal.
Publicado em VEJA de 8 de dezembro de 2021, edição nº 2767