Carlos Ghosn mantinha 2º passaporte francês trancado em mala
Executivo cumpria prisão no Japão e teria apresentado documento em escala na Turquia; autoridades japonesas não registraram saída do empresário do país
Carlos Ghosn, ex-presidente da aliança Renault-Nissan, que fugiu do Japão, onde cumpria prisão domiciliar, tinha dois passaportes franceses, incluindo um que ficava em uma mala trancada. Nascido no Brasil, ele também tem cidadania libanesa e francesa.
Ghosn deixou o Japão na segunda-feira em um jato particular. Após uma escala em Istambul, na Turquia, seguiu para Beirute, no Líbano, onde entrou com um dos seus passaportes franceses. Segundo a rede japonesa NHK, Ghosn teria recebido permissão de um tribunal japonês para que mantivesse um deles em uma mala trancada. O documento servia como visto de curta duração no arquipélago e ele precisava utilizá-lo em seus deslocamentos internos. Os outros três passaportes do empresário (brasileiro, libanês e francês) estão sob controle de seus advogados.
Ghosn responde a quatro acusações de crimes financeiros e foi preso pela primeira vez em novembro de 2018. Ele cumpria detenção provisória sob fiança desde abril de 2019. Ghosn podia sair de casa, mas no acordo feito não deveria deixar o Japão ou conversar com sua esposa, Carole Ghosn. O empresário teria conseguido escapar do Japão em um jatinho privado com a ajuda de uma empresa privada de segurança, segundo a agência Reuters.
Nesta quinta-feira, 2, autoridades turcas lançaram uma investigação sobre a fuga do empresário e sete pessoas foram presas, incluindo quatro pilotos. No Japão, a policia local fez buscas na casa que o empresário vivia em Tóquio. Investigadores buscam imagens de vídeo de residências vizinhas que tenham registrado a saída de Ghosn. No Japão, estrangeiros devem se deslocar com seu passaporte ou um documento de identidade fornecido por um governo. Porém, o banco de dados da Agência do Serviço de Imigração não tem registro da partida de Ghosn do Japão. A promotoria e a polícia estão buscando detalhes de como o executivo escapou do país.
Ghosn aguardava a data para o julgamento no Japão, inicialmente agendada para abril deste ano, mas que foi postergada para 2021. Em entrevista a VEJA, a mulher do empresário, a americana Carole Ghosn, afirmou que a família acreditava que ele não teria direito a um julgamento justo no país.
Acusações
As acusações contra Ghosn são quatro, e vieram em etapas. A primeira delas diz respeito à suposta sonegação de impostos sobre cerca de 44 milhões de dólares, metade do valor que teria recebido como remuneração entre 2010 e 2015, incluindo bônus e salários. A denúncia foi feita por ex-executivos da companhia em sistema de delação premiada. Ghosn também é acusado de usar os recursos corporativos indevidamente. Entre os benefícios recebidos — e não declarados — estariam residências de luxo no Rio de Janeiro, Paris, Amsterdã e Beirute, além da festa que celebrou o casamento e o aniversário de 50 anos da então noiva, a americana Carole Ghosn, no Palácio de Versalhes, na França.
Com a prisão, a Nissan demitiu o então CEO sumariamente, e pouco tempo depois ele foi destituído da liderança da Mitsubishi. A saída da Renault foi um pedido do próprio Ghosn, em janeiro do ano passado. Há ainda denúncias de desvio de dinheiro para empresas de amigos e transferência de um prejuízo de milhões de dólares em um mau investimento pessoal para a Nissan.
Em novembro, o advogado do executivo, Takashi Takano, falou a VEJA. Segundo ele, a prisão de Ghosn seria uma retaliação de executivos da Nissan contra o processo de fusão com a Renault “Ele foi vítima de um complô do governo japonês com altos executivos da Nissan”, acusa ele. A esposa de Ghosn também acusou o governo de conspirar contra o executivo. “É uma lista sem fim de injustiças. Ele passou 130 dias na solitária sem acusação formal. Por que não o tratam como inocente até que se prove o contrário? Meu marido é tido como culpado antes que possa se defender”, disse Carole.
(Com Reuters, AFP e Agência Brasil)