Se a opinião pública e a base mais fiel de eleitores do presidente Jair Bolsonaro têm torcido o nariz para a aproximação do governo aos partidos do Centrão, o ministro da Economia, Paulo Guedes, está fazendo dos novos limões uma limonada. Aprendendo como funcionam os meandros da política, Guedes vê com bons olhos a ampliação do diálogo com a classe parlamentar. O ministro entendeu que o bloco informal do fisiologismo, que Bolsonaro usa para garantir sua sobrevivência na presidência, pode ser fundamental para a aprovação de sua agenda de reformas e reestruturação da política econômica do país. Nas últimas semanas, Guedes vem se reunindo diversos parlamentares. No último dia 9, por exemplo, esteve com o deputado Arthur Lira (PP-AL) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI), tidos como líderes do grupo político. A costura envolve apresentar para os parlamentares a necessidade de se aplicar a agenda reformista da equipe econômica. A articulação ganhou força nas últimas semanas. Paulatinamente, a prioridade deixa de ser a criação de medidas emergenciais e passa a ser a recuperação da atividade no país após a Covid-19.
No diálogo, é claro, são apresentadas também as contrapartidas da classe política. Enquanto Guedes consegue blindar cargos técnicos e centrais do Ministério da Economia e de bancos públicos, como as atraentes vice-presidências de Caixa e Banco do Brasil, o ministro entendeu que o apetite do Centrão pode ser saciado em órgãos regionais. É o caso do Banco do Nordeste. A autarquia teve o novo presidente, Alexandre Borges Cabral, indicado pelo ex-deputado Valdemar da Costa Neto, condenado no processo do Mensalão petista, e novo aliado do presidente Bolsonaro. Cabral é investigado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) devido a suspeitas de irregularidades em contratações feitas pela Casa da Moeda em 2018, quando ele estava à frente da instituição, que teriam acarretado em prejuízos avaliados em 2,2 bilhões de reais. A Casa da Moeda, por sua vez, está na lista de privatizações do secretário de Desestatização, Salim Mattar, e é um dos projetos mais encalacrados exatamente pela influência de partidos como o PTB, de Roberto Jefferson.
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Clique e AssinePor mais que seja benquista por Guedes, a aproximação do Centrão enfrenta resistência mesmo dentro do próprio ministério. Secretários oriundos da iniciativa privada não enxergam como tão benéfico o diálogo com a classe política. Entre eles está o próprio Salim Mattar, exatamente pela determinação do secretário de privatizar empresas valiosas para os políticos, como a Casa da Moeda e a Eletrobras.
Enquanto as privatizações são o principal entrave nos diálogos entre o Ministério da Economia e membros do Centrão, o fisiologismo político tornou-se uma ferramenta essencial do ministro para dar andamento a pautas de difícil aprovação no Congresso Nacional, principalmente as que necessitam de mudanças constitucionais. Como revelou VEJA, um dos principais nortes do ministro para a retomada do crescimento da economia brasileira envolve a desoneração da folha de pagamentos por meio de uma reforma do sistema tributário, adotando uma reedição da malfadada CPMF, com alíquota de 0,3%, para fomentar a criação de empregos e, por tabela, não sofrer uma queda expressiva de arrecadação. Tido como um tabu por parte do Palácio do Planalto, que já censurou o debate por diversas vezes, e pelo Congresso Nacional, graças à carga negativa perante a opinião pública de se instituir um imposto tão impopular, o ministro tem nos partidos do Centrão um novo artífice para encampar o novo tributo, rebatizado de Imposto sobre Transações Financeiras (ITF).
Outro cerne das iniciativas de Guedes para atrair investimentos, o marco regulatório do saneamento básico, na agenda de votação do Senado para o início da semana que vem e tido como projeto central nos rumos da retomada econômica pós pandemia, também é um termômetro para o ministro avaliar a fidelidade do Centrão e a efetividade da aproximação.
No escopo de alterações pretendidas pelo ministro, além das mudanças tributárias e os projetos de atração de investimento privado, está a reforma administrativa, que visa enxugar o tamanho do Estado por meio de alterações nas carreiras do funcionalismo público. O projeto é difícil, por atacar um setor altamente articulado e com poderio midiático — além de ser um calcanhar de Aquiles de Bolsonaro de folhetim, que se diz liberal até as mudanças atingirem seus pares. Apesar da boa vontade dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, a avaliação de congressistas ligados ao Palácio do Planalto é de que a aproximação com os partidos do Centrão apenas formaliza uma base de apoio que já votava com o governo, principalmente em matérias econômicas — e não de aspecto moral ou ideológico. Qualquer ajuda é benquista, avalia o ministro — resta a ele lidar com a contrapartida.