Como a ômicron afetou os planos da China para o yuan digital na Olimpíada
Jogos Olímpicos de Inverno eram a oportunidade perfeita para o lançamento da tecnologia, mas ela foi prejudicada pelas medidas para conter a Covid-19
País mais avançado no lançamento de uma moeda digital, a China planejava fazer um grande lançamento do yuan digital durante os Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim, que começam nesta sexta-feira, 4. A disseminação da cepa ômicron da Covid-19 e o endurecimento das políticas de isolamento para impedir mais contaminações, no entanto, impedirão o país de conseguir uma adesão mais massiva.
A ideia da organização do evento é permitir que na Vila Olímpica e nas instalações esportivas sejam realizados pagamentos apenas em dinheiro, cartão de bandeira Visa (patrocinadora dos Jogos) ou yuan digital. No entanto, a comissão organizou uma espécie de “bolha” na qual apenas participantes do evento como atletas, jornalistas, equipes de apoio e torcedores podem circular, de modo que não interajam com o restante da cidade. Dessa forma, a chance de divulgar a moeda para um número maior de pessoas se perdeu.
Além disso, as equipes olímpicas temem a espionagem do governo chinês por meio do uso do yuan digital, o que está levando alguns comitês a alertarem os seus atletas quanto ao uso deste meio de pagamento. O Comitê Olímpico e Paralímpico dos Estados Unidos, por exemplo, teria recomendado o uso de telefones descartáveis para evitar práticas de espionagem.
Lenta adesão
O mais recente e importante passo da China sobre o yuan digital ocorreu no início do ano: o lançamento de um aplicativo nas plataformas da Apple e Android a ser testado em 10 cidades e regiões, incluindo a sede dos Jogos Olímpicos. No ano passado, a tecnologia ingressou na segunda fase de testes e o Banco Central Chinês divulgou que até o final do ano 261 milhões de pessoas baixaram o aplicativo, o equivalente a 19% da população. Além disso, no segundo semestre foram 1,4 bilhão de dólares mensais em transações.
Ainda que crescentes, os números ainda são bastante inferiores aos das plataformas privadas de pagamento utilizadas no país, como é o caso do Alipay, um dos mais populares e pertencente ao Ant Group, que no final do ano retrasado sofreu um cerco das autoridades chinesas. Naquela época, o aplicativo já possuía 1,6 trilhão de dólares por mês circulando em sua plataforma, muito acima da atual adesão à moeda oficial do governo.
Outro empecilho do yuan digital seriam as poucas vantagens que ele teria em relação às tecnologias já oferecidas pelas empresas privadas. Essa é uma dúvida levantada pelos especialistas em relação às moedas digitais de diversos países, incluindo o real digital. “O grande ponto que favorecerá a adoção das moedas digitais são os casos de uso, ou seja, por que elas vão ser úteis para o consumidor. Boa parte dos clientes que nos procuram em relação ao real digital, como bancos tradicionais, digitais e mercado de capitais estão perguntando quais são os casos de uso. Fazer transações internacionais já facilitaria muito, mas para outras funções os clientes já têm boas soluções no mercado, como ter uma wallet”, diz Willer Marcondes, sócio da PwC Brasil.
Na China, porém, país onde mais se realizam transações digitais por meio de empresas privadas pioneiras no uso da tecnologia de pagamentos, essa dúvida é ainda mais latente, principalmente diante do maior controle que o governo terá sobre a população com a adesão do yuan digital.